Quem quer um bom momento falando de arte, literatura, fotografia? É com Carlos Leal. Seja o lado mundano, o sagrado, seja o lado que for, esse carioca, editor de livros de arte, colecionador de fotografias, curador e recém-eleito vice-presidente do Pen Clube do Brasil, tem a vida dedicada à Cultura. Ele lembra que seu pai, o armador e empresário José Carlos Leal, em 1974, comprou a Livraria Francisco Alves, quando a editora completava 120 anos. Desde então, começou sua intimidade com os livros, aos 17 anos.
Fundada em 1854, como Livraria Clássica, foi a primeira grande editora do País, dominando o mercado na primeira metade do século XX. Depois, Carlos estudou em Nova York e, nesse vaivém entre museus, livrarias e galerias, começou sua coleção de fotografias. Em 2002, fundou a Editora Barléu, especializada em livros de arte, como os de Beatriz Milhazes, José Bechara e Cristina Canale.
Atualmente está às voltas com um livro sobre a vida diplomática nacional. Considerando o desencanto com a imagem do Brasil no exterior, achou o momento mais do que adequado: está selecionando artigos de 25 grandes embaixadores, tais como: Roberto Abdenur, José Botafogo, Celso Amorim, Leda Camargo e João Almino. São crônicas, episódios e exemplos da verdadeira diplomacia, os grandes momentos do Itamaraty. Foi ele também quem editou os três livros abrangendo toda a coleção do MAM-RJ. É uma vida impulsionada pelo amor à Cultura.
A vida de editor vai bem nesta altura da pandemia?
A vida não vai bem pra ninguém neste momento, no Brasil; porém, assim como o povo brasileiro, eu sou um homem de muita fé. Quanto a esse mercado, está tudo parado, embora as vendas online venham crescendo. E o governo Federal ainda quer taxar o livro em 12%. Como a pandemia nos obriga a ficar em casa, os profissionais dessas áreas agora têm tido mais tempo para planejar e projetar o futuro. Estamos voltados para a sobrevivência do dia a dia, mas, depois de vencermos o vírus, haverá uma retomada rápida e um crescimento maior do que esperamos. Quem tem vida interior sofre menos na pandemia porque as artes, de forma geral, reinventam a vida.
A pandemia mudou a vida dos artistas?
O que pode ter atrapalhado é a falta do convívio. Assim como o pessoal do teatro, os artistas plásticos se veem muito, estão sempre prestigiando os colegas nas exposições, nas vernissages, nos lançamentos de livros. Portanto, com a quarentena, acabou esse intercâmbio, que é muito importante; no entanto, a produção, acho que não caiu. O artista continua solitário no seu espaço, produzindo normalmente.
As galerias e os museus estão se adaptando à crise?
Sim, acho que isso é muito bom e está acontecendo muita coisa. Todo dia, tem lives com artistas, palestras, leilões e aberturas de exposições virtuais. Nada, porém, substitui a emoção de ver uma obra de arte ao vivo, nem filme, nem peça, nem livro — o encantamento de se estar diante dela. Depois que a pandemia passar, ela trará muitas mudanças no nosso comportamento. Só que, neste momento, ninguém é capaz de afirmar o quê. Hoje, tudo é especulação.
Como você vê a arte contemporânea hoje, no Brasil ?
A arte brasileira é de excepcional qualidade. Se, por um lado, a língua portuguesa é falada por apenas cerca de 300 milhões de pessoas no mundo, o que dificulta que a nossa literatura seja mais difundida e conhecida — em especial, a nossa poesia contemporânea —, por outro lado, as artes plásticas, assim como a música, são uma linguagem universal. As artes brasileiras começam a ocupar um papel tão importante quanto a nossa música ocupou e ocupa no cenário internacional.
Você gosta de arte de rua?
A arte contemporânea é um balaio de gatos; tudo pode ser arte desde que seja bom e criativo. Eu vi, no museu Reina Sofia, em Madri, uma instalação do José Damasceno, com peças de xadrez, que me deixou perplexo: ocupava todo o museu. Fui seguindo e, ao final, quando descobri que se tratava de um brasileiro, fiquei muito emocionado. Arte de rua também pode ser arte, mas a maioria é muito ruim. As cidades têm que criar comissões que aprovem o que vai ser feito nas ruas, e restaure as boas artes que temos pelas cidades.
Qual o papel do livro de arte?
Os livros de e sobre arte são fundamentais para uma educação humanística. A Lei Rouanet presta um serviço extraordinário ao País, possibilitando a edição de livros que não são viáveis economicamente. Um livro de arte é uma exposição que abre e fecha, mas também precisa ter bons textos, boas fotos e, sobretudo, design sofisticado e simples, além de divulgação, difusão e comercialização, que fazem parte do que o meu saudoso amigo Waly Salomão chamava de “guerrilha cultural”. Eu fico muito triste quando vejo um livro de arte mal feito.
Como você acha que os mercados editorial e de artes vão reagir ao pós-covid?
Vejo com bastante otimismo. Acredito que o que vai acontecer é que não vai mais ter espaço para amadores, tanto nas editoras quanto nas galerias, obrigando as empresas a se profissionalizarem em um patamar acima do que tínhamos. Acho que, no pós-pandemia, as pessoas vão querer conviver mais com a arte, pois, nesse período em que ficaram isoladas em casa, passaram a valorizar o seu espaço privado. Conviver com arte é um grande privilégio.
Foto: Frederico Mendes.