Muitos de nós passamos Natais e encontros com amigos, colegas de trabalho, parentes, vizinhos ouvindo as mesmas piadas chatérrimas ou um monte de absurdos (esses baseados no “eu vi na Internet”), os ataques aos profissionais de imprensa, médicos, à justiça etc. (sem contar os que se vangloriam). É dessa matéria-prima que João Ximenes Braga escreveu “Necrochorume e outros contos e Cia.” que a Comparsaria Teatral transformou, de forma brilhante, em “Gente de bem”.
A direção de Adriana Maia, criativa e certeira, não exagera nem caricaturiza as situações. No palco nu, pequenos objetos servem como ambientação para os diálogos rápidos, aparentemente inocentes, simples, que se transformam em puro discurso prepotente, impiedoso, descolado de qualquer realidade que não seja aquela do próprio umbigo, deformado e apodrecido.
Os recursos usados tornam a relação com as atuações algo que se vê, aos sobressaltos, pelo que será ainda escalado. Os nomes de cada pequeno ato são os de líquidos, uísque funcionando do mesmo jeito que esgoto, a nos lembrar que tudo que é sólido desmancha no ar.
O elenco que se reveza nos mais diversos papéis, com pequenas e pontuais mudanças de figurinos, trabalham consistentemente na interação com os outros. Alexandre Damascena, Ana Achcar, Anna Wiltgen, Camí Boer, Dadá Maia, Gilberto Goés, José Ângelo Bessa, Mariana Consoli, Miguel Ferrari, Pamela Alves, Stefania Corteletti e Xando Graça se movem com agilidade, dando a cada personagem a dose correta do tipo de pessoa que representa.
Adriana opta por uma técnica interessante e que funciona muito bem: os atores são narradores e reproduzem aquilo que as pessoas falariam.
É praticamente um documentário mundo cão, ao não esconder nada daquilo que nomeamos como a “elite branca” que é capaz de odiar, de se fingir simpática, mas sempre se achar do bem. O narcisismo dessas pessoas com a Cia. Comparsaria Teatral vira poeira, pó: como os trabalhos de arte são capazes de fazer.
Serviço:
CCBB, no Centro
Sextas, sábados e segundas, às 19h
Domingos, às 18h