O jornalista e pesquisador Valmir Moratelli levou a paixão por novelas um pouco além. Resultado da pesquisa de mestrado na PUC-Rio, ele vai lançar “O que as telenovelas exibem enquanto o mundo se transforma” (ed. Autografia), no dia 13 de julho, seguido de debate, na programação Off Flip, na Casa Autografia, durante a Festa Literária de Paraty (Flip), e também durante a Bienal do Livro, em setembro, no Rio.
A publicação é um estudo sobre os últimos 20 anos de telenovelas brasileiras, de “Corpo dourado” (1998) a “Laços de família” (2001), de “Cheias de charme” a “Avenida Brasil”, ambas de 2012. Para complementar os capítulos, o autor fez entrevistas e pegou depoimentos de diretores e autores, tais como Euclydes Marinho, Gilberto Braga, Maria Adelaide Amaral, Thereza Falcão, Walcyr Carrasco, Aguinaldo Silva, Glória Perez e por aí vai. Valmir também faz um paralelo entre política e telenovelas.
[top5] numero:1 [f] titulo:Como política e novela se cruzam? [f]
desc:Novela é o produto cultural que exportamos que mais diz sobre nós no mundo. E a nossa novela é diferente da dos demais países latinos porque reflete nosso cotidiano. Uma das autoras que deram depoimento para o livro (Thereza Falcão) diz que sua inspiração para escrever é abrir a janela e ver o que acontece nas ruas. Essa frase é uma síntese da minha pesquisa. É a agitação das ruas que pauta os autores da TV Globo, um dos motivos para elas durarem tanto tempo. Entender nossas novelas é entender nossos tempos. [/top5]
[top5] numero:2 [f] titulo:Por que você escolheu os últimos 20 anos? [f]
desc:Porque tivemos muitos acontecimentos. De 1999 a 2018, tivemos quatro presidentes, duas reeleições, uma Copa e uma Olimpíada, um impeachment. É um período muito rico de acontecimentos. É incrível perceber como tudo isso é refletido na ficção que vai para a TV. [/top5]
[top5] numero:3 [f] titulo:Quais novelas melhor representam as mudanças desse período? [f]
desc:Muito se fala de “Avenida Brasil”, sucesso estrondoso de João Emanuel Carneiro em 2012, que trouxe a classe C para o núcleo principal. Era o momento em que vivíamos a ascensão dos pobres no País, depois da primeira década de um partido de esquerda no poder. Mas destaco “Cheias de charme”, no mesmo ano, que colocou pela primeira vez três empregadas domésticas como protagonistas. Ou “Pega Pega”, de 2017, que discutia a ética de um roubo entre funcionários de um hotel. Isso, num momento em que os ânimos do País se acirravam com a Lava Jato. [/top5]
[top5] numero:4 [f] titulo:No livro, você detalha como as novelas retrataram as mulheres, os gays e os negros nas últimas décadas. Qual desses grupos teve mais avanços? [f]
desc:A diversidade sexual. Rompemos a barreira de que gay é reservado ao núcleo cômico e secundário. Félix (Mateus Solano), de “Amor à vida”, de 2013, foi o primeiro protagonista gay, vilão, com beijo na boca em horário nobre. Vários tabus derrubados de uma só vez! Em 2016, tivemos Ivan/Ivana (Carol Duarte), e a questão da transexualidade explicada abertamente em “A força do querer”. Minha pesquisa defende que esses temas só invadiram a teledramaturgia depois das políticas de inclusão. Pereirão (Lilia Cabral) é uma mulher forte, empoderada e decidida em “Fina estampa”, de 2011, porque se discute, naquele momento, na sociedade, maior participação da mulher em tarefas antes dominadas por homens, inclusive na política. Agora, ainda não tivemos tramas com negros protagonistas suficientemente representados, que traduzam a nossa diversidade étnica. É a questão que mais precisa avançar. [/top5]
[top5] numero:5 [f] titulo:Por que essa dificuldade? [f]
desc:Porque temos uma sociedade historicamente racista. A TV é um dos reflexos do que se pensa nas ruas. Mas as coisas começam a mudar. Antes de “Segundo sol” estrear, em 2018, muita gente já criticava a novela por não ter negros protagonistas numa trama que se passa na Bahia, estado com maioria da população negra. Quantas novelas antes se passaram em Salvador e ninguém levantava a questão? A mudança de postura mostra que algo se alterou. A política de cotas não mexe só com número de diplomas em faculdade: traz a questão da representatividade para a pauta nacional. [/top5]
[top5] numero:6 [f] titulo:O formato TV está ultrapassado? [f]
desc:O que nossos pais chamavam de televisão, ou o que nós mesmos chamávamos de TV até a década passada, não existe mais. “Televisão” não é mais uma imensa caixa preta que ficava no centro da sala, em frente ao sofá maior, cujo controle remoto permitia autoridade suprema a quem o manuseava. TV, hoje, é também o smartphone que está no seu bolso e que você usa para trocar mensagem, o laptop, o ipad, a tela de plasma que parece um quadro enfeitando a sala. Novas tecnologias estão promovendo a flexibilização do que se entende por televisão. Consequentemente, todo o conteúdo exibido ali também passa por uma revisão sistêmica. [/top5]
[top5] numero:7 [f] titulo:O caso de amor do brasileiro com as novelas está em risco? [f]
desc:O caso é duradouro, difícil de romper. Pode ser que as séries venham a promover, no máximo, um triângulo amoroso (risos). Mas, falando sério, a gente percebe um aumento de audiência do streaming no Brasil, nada ainda que ameace a novela. O que deve acontecer são transformações para atrair o público mais jovem, já acostumado às séries. Histórias mais curtas, narrativas complexas, disponíveis em plataformas digitais para serem acessíveis em qualquer horário… [/top5]