Marialice Celidônio traz sempre a leveza e o frescor ao lado do drinque, num clima daquelas pessoas que parecem ter a eternidade pela frente. Formou com o marido, José Hugo Celidônio, um casal muito querido da noite carioca, sempre recebendo com simplicidade e sofisticação – mais ou menos aquele perfil antes-de-tudo-a-bossa. Recentemente, Marialice foi convidada a ser modelo aos recém-completados 80 anos. Na moda, pretende mostrar o que é adequado para a sua idade: “Estou adorando a ideia”, diz ela, rindo ao comentar: “Na minha época, não pegava bem fazer 80 anos”. Seu amigo Luiz Carlos Barretto sempre a chama de Dona Flor, mas não é por causa de dois maridos (ela faz questão de ter um só), e sim por achá-la mais fotogênica que a Sônia Braga. Esse é apenas um dos inúmeros amigos da vida toda, desse casal de paulistas que vive no Rio desde 1964. Marialice, que usa o mesmo manequim 38 de sempre, diz o que espera da profissão e, ainda, como mantém o corpo, o espírito, o entusiasmo e o estilo descomplicado de viver. Leia sua entrevista
Como você se sente aos 80 anos?
“Me sinto plena: tenho uma família que amo, e até um bisneto. Só me falta um trabalho pra ganhar dinheiro; essa é a única coisa que está me faltando. Começando agora, como modelo aos 80, quero uma graninha.”
Falemos das mudanças em sua vida, agora, comemorando oito décadas
“Sou muito mais tranquila. Quando jovem, sonhava, mas agora vivo em paz – já aconteceu tudo. Meus amigos são todos mais jovens, me sinto da idade deles; tudo que as de 20 fazem eu faço. Na verdade, Carolina, minha neta, que tem 20 e poucos, não consegue fazer a metade do que faço. Fisicamente, não tenho uma dor de cabeça, e isso é invejável. E olha que fumo, bebo, sou normal.”
Como manter a cabeça e o corpão em dia?
“Faço caminhadas, faço localizada, faço aeróbica, subo montanha e Hata ioga há mais de 50 anos. Quando comecei, só existiam dois professores no Rio. Tenho necessidade da ioga – me relaxa.”
E da alimentação?
“Como tudo que eu tiver vontade, sem exagero. Pouca fritura e, em casa, evito doces, já que como muito na rua. Sempre comida leve, e, à noite, só sopa. Adoro comida caseira. E adoro chocolate, que trago de viagem e tranco em casa com chave mesmo. E mantenho tudo no controle: consigo comer um bombom, apenas um. A gente pode fazer de tudo, sem passar dos limites.”
E drogas? Conviveu bem com elas?
“Convivi sim, e não me arrependo, mesmo porque fiz de tudo, mas equilibradamente. Sempre vivi muito a noite, até pelo trabalho do meu marido. Ele começou com o Flag, nos anos 70, no auge da Bossa Nova, portanto é muito tempo.”
O que você quer fazer daqui pra frente?
“Se eu puder ficar como estou agora, vou me sentir bem feliz. Fiz tudo que quis. E agora estou pensando em trabalho com entusiasmo. Adoro moda.”
O que você ensina à sua neta?
“Agora não ensino nada; já ensinei tudo quando ela era garota. Nem sei responder a isso. Era tudo tão diferente… Agora, a educação já não existe mais, acabou.”
Que aprendizado você quer deixar?
“Quero deixar a verdade. Quando se vive assim, a gente se sente em paz; de outra forma, estamos sempre com angústia, sem ser o que realmente é, o que é um preço alto.”
Como é ser carioca por opção?
“O Rio era um lugar alegre e divertido. A cidade não é o que era. Há 50 anos, foi um paraíso, mas deixou de ser; agora é o oposto. Se eu tivesse 20 anos menos, ou até 10, iria para outro país. Era o que eu faria.”
Para você, o que significa envelhecer?
“Envelhecer, pra mim, não significa nada, até porque não envelheci.”