Eu era oficial (capitão) do Regimento de Guarda Presidencial em 1964. No 1º de abril, dia do Golpe, não aderi. A seguir, fui preso, isolado, cassado e perseguido por 20 anos. Na minha nova carreira, professor, também fui cassado: eu e minha mulher, a professora Isis Maria Balter Proença, cassados e proibidos de prestar concurso público. Minhas novas tentativas, no jornalismo, junto à ABI inclusive, foram vigiadas e constam das fichas dos órgãos de repressão: atividades no âmbito da ABI, anos 70 e 80.
Cassado como militar e cassado como professor, foi assim que resolvi criar a Oficina de Ficção e Poesia, daria minhas aulas aqui e ali, inclusive, até em igreja, seria difícil “descobrirem” e intervir. Um salário insignificante, 6 a 7 escritores, mas ajudaria.
Os primeiros anos de Oficina foram dificílimos, como foi difícil atravessar o período obscurantista da Ditadura, trazendo à luz fatos enterrados por interesses escusos. Mas veio a Anistia: embora restrita, ajudou sob certos aspectos. Exemplo: embora sob intervalada vigilância, já não precisava apresentar-me no DOPS de três em três meses, para declarar sobre minhas atividades.
Reconstituí minha vida através do Mestrado e Doutorado, após fundar a Oficina. E repito aos escritores: oficina não faz escritor, apenas encurta os caminhos para a boa literatura. Hoje, minha oficina é tida como a mais antiga em funcionamento ininterrupto por 50 anos no País. Discreta, sem espírito mercadológico ou marqueteiro, a Oficina não possui vagas em seu sempre limitadíssimo número de ficcionistas e poetas.
Sou autor de 14 livros de Literatura e Cultura Brasileira, Prêmio Especial Esso de Literatura, cinco dos livros agora sendo reeditados, a exemplo do Ideologia do Cordel (sou especialista, membro da Academia de Cordel, maior coleção do Sudeste), e, a exemplo dos livros do Golpe e do Futebol e Palavra.
Neste 2022, comemoram-se (evento dia 6 de abril) os 50 anos da OLIP, Oficina Literária Ivan Proença, a mais antiga do País, que abrigou, e abriga, alguns de nossos mais importantes escritores, pela boa e relevante escrita.
No Governo Brizola, fui Diretor de Cultura do Estado, do MIS e de Projetos Especiais. Hoje, sou militante e ativíssimo, lecionando e acompanhando o GTNM (Grupo Tortura Nunca Mais), atuando no Conselho da ABI, repudiei o rótulo com que o novato na ABI, vice-presidente, contemplou-me e a outros veteranos companheiros (velhos acomodados), na ânsia de promover outras intrusas “renovadoras”.
Pouco antes da 1ª Anistia, afinal, convite para lecionar em uma faculdade, a FACHA, onde trabalharia tranquilo, sabendo que não seria demitido após visita dos repressores. O diretor, professor Hélio Alonso, tinha bom trânsito com militares (cursara a Escola Superior de Guerra) e se interessava por ter bons professores, mesmo sabendo-os contrários à Ditadura: eu e mais três, tornando-nos, até, com o tempo, amigos do diretor.
Hoje, durante e depois da pandemia, estamos ministrando as aulas por skype. Recebo por e-mail os textos, “trabalhos de casa” dos escritores, corrijo, comento em aula e devolvo, fotografando cada um por WhatsApp ou e-mail. Novos tempos.
Ivan Cavalcanti Proença é coronel do Exército. Um Exército que lutou (com a ABI) por “o Petróleo é nosso”, por um Brasil mais igual, por um nacionalismo fraterno e por um patriotismo nunca ufanista. É Mestre e Doutor em Literatura (UERJ e UFRJ) e palestrante em quase todos os estados do Brasil, além de 40 anos lecionando também na FACHA. É membro e diretor da Academia Carioca de Letras.