Fiquei febril em um domingo. Era o 20º dia de quarentena com a família, e me isolei no quarto. Não tive tosse, dor no corpo, não perdi olfato, paladar ou apetite (isso seria gravíssimo). Tomava dipirona à noite, quando a febre chegava a 37,8 graus, e pronto, ela caía. O que ligou o alerta vermelho foi quando um enjoo permanente, chato, foi me deixando prostrado ao ponto de olhar atravessado para as refeições e os livros. Fiz o exame PCR no 5º dia, e o resultado, 4 dias depois, deu positivo, exatamente quando a inspiração mais longa começou a dar uma travada na garganta, provocando uma tosse curta, aparentemente inofensiva.
Na primeira tomografia, a pneumonia estava lá. A segunda bateria de exames, após três dias de antibióticos combinados, indicou estabilidade na imagem, mas agravamento dos indicadores no sangue. A saturação de oxigênio caiu de 97 para 93. Foi muito esquisito entrar em uma ambulância para passar uma temporada na UTI. Durou uma semana, e voltei ontem à noite para casa, vitorioso.
Foram dias de quietude, saudades e dedicação. Devo tudo aos profissionais da Rede D’Or — especialmente ao dr. Arthur Vianna, pneumologista que me acompanhou com assertividade e atenção — e aos amigos que mandaram energia boa e me envolveram em oraçōes. A primeira noite em casa, de volta, foi inesquecível. Acordei várias vezes só pra sentir o corpo livre de agulhas, eletrodos, medidores de pressão e saturação. O melhor de tudo, um dos segundos mais felizes da vida, foi acordar hoje com a voz de princesa da Júlia, minha filha de 2 anos, batendo na porta: “Papai, acorda, o café tá pronto.” Nunca darei conta de descrever a intensidade de um momento tão prosaico.
Na luta silenciosa contra o vírus, senti o medo de quem vê a peste crescer e sabe que não haverá vagas para tratamento. Se eu puder deixar uma mensagem, é para que todos cuidem-se com exagero, pelo menos até a vacina chegar. Como relatei, quando fiquei febril, já vivíamos em quarentena radical há 20 dias. Ninguém ia à rua, tomávamos sol pela janela. O vírus só pode ter entrado em sacolas e produtos de mercado e farmácia. Lavem tudo, usem máscaras, não economizem em cuidados.
Outra coisa. Se você precisa sair de casa por qualquer motivo, vá sozinho, preserve o outro, e vice-versa. O vírus nos obriga a rever alguns conceitos. Amar não é querer adoecer junto, mas proteger-se ao máximo para ter condições de cuidar do outro, se preciso for.
Também refleti sobre o erro dos que olham para a política como se todos fossem iguais, votam de qualquer jeito. O vírus tem ensinado ao mundo que não é bem assim. Muitas vidas têm sido salvas por governantes humanos, inteligentes e capazes de conduzir políticas públicas. E outras são jogadas fora, em proporções impensáveis. Isso sempre fará a diferença, especialmente nos momentos dramáticos para os povos, como este. Que Deus nos proteja, nos ajude a suportar os dias duros pela frente e nos dê sabedoria para aprender.
Aziz Filho é jornalista, especialista em Políticas Públicas e diretor da Avenida Comunicação. Foi diretor de Redação dos jornais O Dia e Meia Hora, chefe da IstoÉ no Rio, gerente da TV Brasil, repórter do Globo, da Folha de S. Paulo e do JB e presidente do Sindicato dos Jornalistas do Rio.
Prezado Aziz Filho, seu depoimento é esclarecedor e sensível, nos serve como um alerta, nesse momento de muitas perguntas e poucas respostas, principalmente do governo, aliás um governo pra jamais esquecer. Saúde e Paz pra vc e sua família. Obrigado Lu Lacerda pela matéria.
Que Deus abençoe todos nós.
Me vez mudar minha opinião ouvir tudo de uma pessoa confiavel filho de um grande amigo. Meu conterrano. No meio de tanta informaçao erronea que andao passando DEUS ABENÇOE E MUITO OBRIGSDO