Muito se fala em Nelson Rodrigues. Como torcedor, cronista, autor, suas tiradas são repetidas, popularizadas. Há o imaginário sobre o dramaturgo mais imaginativo do teatro brasileiro. Seu foco sempre foi a gente comum, de vidas simplórias, encerradas no espaço da casa — uma limitação. Seus textos, no entanto, fazem desses personagens, fechados no mundo familiar, sua única opção, executar um bailado em que a troca de parceiro possível se realiza dentro daquilo que se acreditam capazes de evitar: manter-se na mesmice.
Em “Tremores Ligeiros”, adaptação de quatro contos de “A Vida como ela é”, espetáculo idealizado por José Pedro Peter,com direção de Michel Blois, o que encontramos na pequena área do Espaço Abu são quatro contudências, quatro feridas lancetadas, quatro pedras perfeitamente esculpidas. O excelente cenário — formado por uma montagem/quebra-cabeça com retângulos de madeira que são retirados pouco a pouco até a sua transformação — é caos que vira palco.
O elenco tem a ótima peculiaridade de os papéis não corresponderem a gênero, sem transformação de voz, corpo ou figurino. As roupas têm aquela lembrança de um artesanal mineiro, com bordados, rendas, fitas. A direção do Michel Blois é a certeza de ver Nelson abundante, de corpo e alma, sem gritos, sem exagero. Para quem viu Nelson falando sobre qualquer assunto, reconhece a voz lenta, baixa e certeira.
O idealizador dessa bela adaptação, José Pedro Peter, fala com exclusividade ao Correio sobre a sua paixão por Nelson.
Como surgiu essa forte relação com Nelson Rodrigues? “A paixão por Nelson vem da necessidade de compreensão sobre a vida. Nelson, com sua palavra, de alguma forma, aquieta um tipo de angústia que acredito ser comum a todos nós. Sua escrita me faz sentir parte da humanidade, legítima angústia universal”.
Serviço:
Espaço Abu, Copacabana (Av. Nossa Sra. de Copacabana, 249)
Até 29 de setembro, de quinta a domingo, às 20h