Muitas vezes, cantarolar “Somos todos iguais nessa noite” nos dá um certo alívio em nosso encontro com uma humanidade corriqueira. Em outros momentos, garantir a nossa individualidade, as nossas diferenças, o nosso eu sou eu, mais eu e muito eu. Quando se alcança exatamente isso, é um enorme ganho: mostra-se o individual para nos apresentar a condição humana, a matriz da arte. “A Visita” consegue esse efeito com acerto.
“A visita” é um monólogo rápido e certeiro com Carol Duarte, com um figurino que acompanha o estado da alma da personagem. Carol, em um desempenho extraordinário, é uma “executiva” em “burn-out”: quando a pessoa enlouquece das pressões da sociedade do desempenho, do capitalismo Instagram, quando tudo o que se faz tem que receber likes.
Outros méritos são realizados pelos outros dois pés que realizam um espetáculo de excelência (texto e direção). O texto de Aline Klein vai na contramão do da maioria dos espetáculos atuais. O teatro de libelo ou de teatro de nicho com seus recortes focam o drama do humano em um ponto — o enlouquecimento por pressão acontece com todo e qualquer e é um dos mais graves males de nossa sociedade. Desde o Jardim de infância até o doutorado, do faxineiro ao presidente da empresa, a loucura se apresenta na vida e é evidência nessa joia que é o texto de Aline Klein.
A direção de Murilo Basso localiza a ação em um ambiente difuso, com a iluminação que aguça o que acontece com Carol: o personagem não é nomeado, assim como a visita, parada na vertical, no meio de algo que a prende sem ferros.. E aí se dá o fenômeno, com uma expressão corporal, com movimentos amplos e contidos, raivosos ressentidos. Carol não sai do lugar, assim como a sua vida.
Em um tempo curto, não há nada além; é conciso, enxuto, impactante. Ah! e “A Visita”? É alguém do trabalho da personagem, mas funciona como um interlocutor que é o gatilho da epifania: gritar, revoltar-se, expor-se, denunciar. Quando acaba, sentimos inveja da coragem e da ousadia da mulher. Eu e a torcida do Flamengo adoraríamos gritar contra a sociedade atual: “Salve, Carol! Salve, Aline! Salve, Murilo!”
Serviço:
Teatro Firjan SESI Centro
Segundas e terças, às 19h