Tem chance de ficar na memória e no paladar cariocas o dia 28 de novembro: pela primeira vez, o Brasil recebe o “Latin America’s 50 Best Restaurants”, a mais importante premiação de gastronomia da América Latina, no Copacabana Palace. Na sequência, o Hotel Fairmont, em Copa, recebe 650 convidados para a festa.
Diferentemente de outros guias (como Michelin), com avaliações feitas pelos temidos críticos, a ideia do “50 Best” é uma seleção sob o ponto de vista do público, do consumidor, de quem frequenta os restaurantes — são 1.800 jurados em 27 regiões do mundo, especialistas na arte de comer e beber, entre chefs e donos de restaurantes (34%), jornalistas e críticos (33%) e aqueles que fazem o roteiro das viagens baseado nos “menus” dos países (33%). Esse é o perfil comum entre os que reconhecem a mesa como o segundo maior prazer desta vida, às vezes, o primeiro.
No ano passado, o peruano Central, do chef Virgilio Martínez e Pía León (que vem ao Rio), ficou no topo da lista. O único brasileiro entre os 10 foi o paulistano Casa do Porco, na 4ª posição; no Rio, a chef Janaína Torres Rueda será anunciada como a “Best Female Chef”. Contudo, a experiência vai muito além da noite do prêmio: o evento movimenta a cena gastronômica e, com isso, a economia do Rio, com vários jantares da série “50 Best Signature Sessions” (clique aqui para mais detalhes na coluna de Bruno Calixto).
Por trás de tudo, está Martina Barth d’Avila, executiva de marketing e dona da Sonimage, agência oficial da produção do “50 Best”, com mais de 25 anos de experiência com grandes eventos e, também, criadora do “Rio Coffee Nation”, com última edição em outubro, dedicado aos cafés especiais e orgânicos. Martina nasceu na Alemanha, veio para o Brasil aos 7 anos, morou 22 anos em Paris e se define como “uma alemã-francesa-carioca-por-escolha”.
O que significa para uma cidade, um país, receber um evento como o 50 Best?
Uma chance maravilhosa de transformar o Rio na capital gastronômica latino-americana. Nos próximos dias, os olhares atentos de jornalistas, amantes da gastronomia e chefs do mundo todo se concentrarão em nossa cidade. Estou segura de que ficarão fascinados com as descobertas que farão aqu
Você conhece os desafios do setor de eventos mundo afora. Qual o principal deles ao fazer um no Brasil e, principalmente, no Rio?
Eu diria que todo evento enfrenta o grande desafio de ser executado de maneira impecável, antecipando qualquer imprevisto e atendendo às expectativas do público. Para eventos internacionais no Brasil, enfrentamos o desafio de lidar com as diferenças culturais, já que os hábitos de trabalho e execução variam consideravelmente de um país para outro. Essa é uma das principais especialidades da minha agência: saber lidar com essas diferenças culturais. Além disso, enfrentamos a escassez de profissionais bilíngues no mercado, que não apenas falem uma língua estrangeira, mas também compreendam as diferenças culturais e diferentes formas de trabalhar. Em contrapartida, posso afirmar que nossos produtores locais têm muita versatilidade e não poupam esforços para entregar um excelente evento.
Sabemos que a cidade tem passado por diversos problemas, não que eles sejam novos. Qual sua principal preocupação?
Os eventos são apenas para convidados, com controle de acesso e medidas de segurança. Até o momento, nossa maior preocupação tem sido lidar com imprevistos climáticos, como tempestades e chuvas intensas, que podem afetar o acesso dos convidados.
Se você fosse dar uma dica ao poder público, qual seria para a cidade receber eventos como este e, com isso, tratar bem o turista?
Investir na educação! Através dela é que se tem uma base sólida para o desenvolvimento de profissionais competentes. Já temos a alegria tipicamente brasileira, que encanta os visitantes. No entanto, por vezes, carecemos de profissionalismo, uma lacuna que pode ser preenchida por meio do acesso à educação para todos.
Você nasceu na Alemanha, veio para o Brasil aos 7 e morou 22 anos em Paris. Por que escolher o Rio? Os prós e contras da cidade e, se puder, comparar com outras.
O Rio é uma das cidades mais belas do mundo — sempre me encantou com suas paisagens, desde a floresta da Tijuca até as praias, passando pelo charmoso Centro do Rio antigo. Outro ponto é o clima, especialmente durante o inverno com suas temperaturas amenas, céu azul e a oportunidade de dar um mergulho no mar. É simplesmente irresistível! O carioca, por natureza, é cosmopolita e acolhedor. Não gosto de comparar cidades entre si, pois cada uma possui seus encantos e defeitos, sua própria personalidade e charme. É melhor sempre focar no que uma cidade tem de melhor e desfrutar ao máximo dessas características. A diversidade e as diferenças são exatamente o que cria o encanto e a vontade de explorar novos locais, novos destinos. Se tudo fosse igual, seria muito tedioso e sem graça.
O que você mais aprecia e o que mais a apavora na cidade?
Amo o clima, a paisagem do Rio e os cariocas. Eu me defino como uma alemã-francesa e carioca por escolha. O que me causa apreensão? A desigualdade, o racismo, a fome e a falta de acesso à saúde e educação para uma parcela significativa da população.
Se for citar um restaurante, qual seria? E chef?
No Rio, estou encantada com o Lasai, do chef Rafa Costa e Silva. Tudo é delicioso, elaborado com muita delicadeza e profissionalismo, combinando sabores e texturas incríveis, e valorizando os produtos locais. Indiscutivelmente, ele se destaca como um dos grandes chefs brasileiros da atualidade, não deixando nada a desejar quando comparado a outros chefs estrelados ao redor do mundo. Em Paris, minha segunda cidade, tenho buscado, cada vez mais, a autêntica cozinha de bistrô, que está passando por uma revitalização pelas mãos de uma nova geração de chefs, como o Moulin à Vent, Josephine Chez Dummonet ou Les Marches. Este último, um autêntico bistrô de “quartier”, onde se pode saborear um delicioso “poulet frites”, um clássico “steak au poivre”, ou ainda um perfeito “foie de veau rosé”, todos representantes dos pratos clássicos franceses. Se posso dar uma dica, o melhor guia de bistrôts de Paris é o “Petit Pudlo”, do famoso crítico gastronômico Gilles Pudlowski.
Em 2012, você disse que o Rio vivia o seu melhor momento. De lá pra cá, o que mudou e qual o seu ponto de vista sobre o assunto?
Já se passaram 11 anos, durante os quais vivenciamos momentos de ascensão e desafios em nossa cidade. A pandemia desestabilizou o mundo inteiro, e ainda estamos em processo de recuperação. No entanto, os brasileiros e cariocas demonstram uma incrível capacidade de superar obstáculos e seguir adiante. A cidade está retomando seu crescimento, investindo em infraestrutura. O empenho e a dedicação do prefeito Eduardo Paes e da secretária Daniela Maia foram fundamentais para que o Rio se tornasse a cidade anfitriã do Latin America’s 50 Best Restaurants. Eles compreendem a importância dos eventos internacionais como impulsionadores do turismo e da economia carioca.
Em O Globo (caderno “Emprego”), você foi eleita uma das 10 executivas mais elegantes do país. Como foi para você, ser mulher e estar num ambiente de negócios? Como era e como está?
Claro que me sinto lisonjeada, mas a verdadeira importância está em ser reconhecida pela competência e profissionalismo. Ser mulher em um ambiente de negócios é desafiador. Às vezes, ao redigir textos ou me comunicar de maneira objetiva com pessoas, especialmente homens, percebo que minha abordagem é interpretada como agressiva. Por que uma mulher não pode ser clara, objetiva e direta como profissional? E também considero inapropriado receber elogios sobre nossa aparência em encontros profissionais, já que estamos lá para mostrar nossa capacidade, discutir ou apresentar temas importantes, e desejamos ser reconhecidas por nossas habilidades e contribuições, não pela aparência física.
O que é a gastronomia pra você? Para muitos, é um dos maiores prazeres da vida…
Desde a minha infância, a culinária sempre foi uma constante em minha vida. Em casa, sempre valorizamos e apreciamos bons pratos e vinhos e, desde pequena, acompanhei meus pais em restaurantes. Minha mãe adorava cozinhar e nos transmitiu essa paixão. Já na fase adulta, vivendo inicialmente em São Paulo e depois em Paris, aprendi a cozinhar, não por obrigação, mas por prazer. Modéstia à parte, minhas tortas e biscoitos alemães fazem sucesso com os amigos. Tenho também a imensa sorte de ter ao meu lado o Antonio, meu marido, que é um ótimo cozinheiro, grande conhecedor de vinhos; quando viajamos, compartilhamos essa paixão por explorar vinhedos e restaurantes.
Pra finalizar, quais os programas que você indicaria a um leigo no 50 Best?
Durante a semana do 50 Best, haverá uma série de jantares especiais: os Signature Sessions, realizados a duas, quatro ou seis mãos. Essa é uma oportunidade única para apreciar pratos elaborados por chefs renomados de todo o mundo. Contudo, sempre recomendo aos visitantes que também explorem os botecos cariocas, vivenciando a autêntica e descontraída culinária local, acompanhada de um chope gelado, um mate ou uma caipirinha. E como passeio imperdível, sempre indico o Jardim Botânico e o Centro.
Por Dani Barbi