Além de desejar que o colágeno borbulhasse em sua vida, como o champagne, estava entre os maiores sonhos de Glória Maria algum aparelho novo que a fizesse se sentir quase uma recém-nascida. Sonhava com a juventude eterna como
Dorian Grey. Sempre exuberante, alegre, segura, presente e eterna, principalmente eterna — não é essa a sensação que ela passava? Passava e dizia. Não era incomum perguntar: “Pra que falar no tempo?”
Glória tinha um olhar muito estético pro mundo, tanto quanto para a saúde, o que não a impedia de fazer nada que talvez a afetasse; não pensava nisso — queria tudo, sem pensar na conta. Isso ficava pra depois. Quase tão forte quanto o orgulho de saber ter sido responsável pelo seu próprio sucesso, tinha apreço pela sua trajetória, jamais contada pelos anos. Detestava falar em datas e cronologias — desagradava-lhe terrivelmente. Por exemplo, para aqueles que ligavam no seu aniversário (15/08), ela sempre dizia: “A vida não se conta. Não comemoro aniversário, comemoro a vida”. Sempre manteve a idade secreta até a sua morte nesta quinta (02/02), às 2h da manhã, no Copa Star, em Copacabana. Contudo, depois disso, fazem da gente o que querem e tratam, muitas vezes, coisas importantes sob outro olhar. E o que isso importa agora?
Apesar de preferir desconversar ou não admitir, Glória teve uma vida financeira tranquila, podendo fazer tudo que quis: gostava de contar que, ainda pobre, vivia num predinho perto de onde morava atualmente, na Gávea. Sempre que passava na porta, pensava: um dia vou ter essa casa linda. É exatamente a sua, onde vivia com as filhas, Maria e Laura, de 15 e 14 anos, as grandes paixões da sua vida, as irmãs que adotou ainda crianças. A primeira é afilhada de Roberto Marinho Neto, um dos herdeiros da Globo; a segunda, do jornalista Bruno Astuto. Sempre achou que as veria adultas.
Como sofreu a Glória! Semana passada mesmo, foi operada mais uma vez pelo cirurgião Paulo Niemeyer. Há algum tempo, ela só se deixava ver por duas pessoas: a corretora de imóveis Verônica Chaloub (sua amicíssima e comadre, à frente de tudo, desde o começo da doença) e Karin Marinho (sua amiga, que a visitava uma vez por semana). A última grande festa em que Glória esteve foi na casa da nutricionista Thaís Araújo e da empresária Maria Geyer, em julho de 2022. Estava visivelmente frágil. Mas festa, de si pra si, era a sensação de que, de alguma maneira, ajudou contra o racismo — seu maior orgulho na vida. Sempre dizia: “A escravidão continua existindo; só mudou de cara”.
E, por fim, sorria muito quando uma amiga dizia: “Pensou na TV Globo, pensou na Glória Maria; pensou na Glória Maria, pensou na TV Globo”. E não era?
O corpo vai se cremado nesta sexta (03/02), restrito à família e amigos íntimos.
Foto: Divulgação TV Globo