A medir pelas maravilhas do Rio, quem lida com turismo deve viver bem-humorado e se dar muito bem. Foi o que sempre ouviu Antônio Mariano, o atual secretário municipal de Turismo há quatro meses, desde que o cientista político Bruno Kazuhiro deixou o posto para a pré-candidatura a deputado estadual. Antônio tem intimidade com a “máquina” — cientista político, jornalista, mestre em Administração Pública (EBAPE/FGV), doutorando em História e Política (CPDOC/FGV) e diretor-executivo do Instituto Rio21, foi assessor no gabinete do vereador Cesar Maia (2014 a 2019), depois subsecretário de Infraestrutura e Obras e, antes do secretariado, foi assessor de Bruno.
O Rio tem vocação natural pro turismo e é destino dos sonhos de milhões de pessoas no Planeta, seja para visitar a famosa Copacabana e seu réveillon, as praias, o Pão de Açúcar, o Cristo Redentor ou assistir a uma partida de futebol no Maraca. A cidade arrecadou R$ 52,5 milhões em ISS do setor no último verão, segundo pesquisa da Secretaria de Turismo (SETUR). O setor, um dos mais afetados pela pandemia, começou a se recuperar a toda em meados de 2021, com a chegada da vacina e a gradual abertura da economia. Recentemente, a secretaria lançou o projeto “Dias de Glória”, que vai revitalizar o bairro homônimo; criou o “Prêmio Carioca de Políticas de Turismo”, que premiou ideias para o setor; e o “Dia do Turismo”, que leva moradores de áreas pobres para conhecer pontos turísticos.
Na conversa com a coluna, Mariano listou os maiores problemas da pasta, seus próximos passos e até indicou programões:
Você acabou de assumir a pasta de Turismo, mas era assessor de gabinete do Bruno; então já está por dentro de todos os projetos em andamento. Quais suas prioridades e qual projeto que mais acredita?
De fato, a continuidade do trabalho do Bruno ajuda a tocar as políticas públicas do turismo. Temos dois projetos importantíssimos, que serão um legado para a cidade: oO Painel do Turismo Carioca e o Plano Estratégico do Turismo. O Painel é a reunião de todos os dados sobre o tema no Rio. É a primeira vez que a Prefeitura sistematiza os dados de turismo. Se você não tem dados, como vai fazer políticas públicas? Já o Plano Estratégico é um norte, uma direção para onde devemos ir, que será construído a várias mãos, entre o poder público, a academia e a iniciativa privada. A roda já foi inventada; o que precisamos agora é adaptá-la aos novos tempos, inclusive são dois projetos que se complementam.
Você já participa da política carioca há muito tempo. O que trouxe de experiência nesses últimos anos? O que é mais desafiador?
Fácil nunca é, pelo contrário, a busca pelo desafio é que nos traz as experiências necessárias para novos voos. Por isso, aprendi muito a ouvir e a criar o diálogo, ponderar todas as opiniões e buscar um caminho que seja bom para todos. Além disso, também aprendi a me cercar de pessoas melhores, mais inteligentes e diferentes do que eu. É mais do que comprovado que apenas a pluralidade, a diversidade de ideias é que nos fazem crescer. E tudo isso vem da escola não só Cesar Maia, mas também de Rodrigo Maia, que foi meu primeiro chefe. Depois, trabalhando no Poder Executivo, foi colocar tudo isso em prática e aprender o processo administrativo, a lidar com as expectativas da população, do governo e de outros atores. De novo, sempre ouvindo e dialogando.
Podemos dizer que o Turismo é até uma secretaria fácil, pela vocação natural da cidade?
Não diria fácil, justamente por ser uma das cidades mais turísticas do mundo e a porta de entrada do País, os desafios são imensos e diários. Hoje o turismo precisa de uma maior profissionalização e que a sociedade, de uma maneira geral, entenda a importância do setor como um motor para geração de emprego e renda. Infelizmente, ainda tem muita gente que acha que o turismo é apenas viajar, conhecer novos lugares e comer em bons restaurantes — não consegue enxergar todos os mecanismos que existem por trás disso e a sua constante necessidade de melhoria.
Como carioca, o que você faz de “turismo” local e indicaria para os visitantes?
Alguns locais que indico demais são a mureta da Urca pra ver o pôr do sol, o Boulevard Olímpico de ponta a ponta, subir a trilha do Pão de Açúcar, o Jardim Botânico, mas não somente a Zona Sul. O carioca da ZS deveria ir mais ao Parque Madureira, a Paquetá, ao conjunto histórico imperial de Santa Cruz… E para comer: Café Lamas, Bar Madrid na Tijuca, Bar Urca, Casa Urich e o Luigi’s em Laranjeiras. Percebe-se que tenho um gosto bem tradicional, mas o Rio tem roteiros para todos os gostos: turismo histórico, de aventura, cultural, de festa, de natureza e gastronômico. Oferece tudo o que você quiser.
E existe aquela máxima, de que tudo é lindo, mas a mão de obra, os serviços são péssimos… Como mudar isso?
No último dia 1º de julho, lançamos a Escola Carioca de Turismo. Ela foi idealizada pelo Bruno e nasce para qualificar a mão de obra da cadeia de produção do turismo e, de quebra, auxiliará quase 4 mil pessoas na busca por emprego. Não podemos fechar os olhos para o atendimento ruim que temos na cidade e que afasta o turista. E não apenas no restaurante, mas em todas as áreas correlatas à recepção de um turista. Por isso, serão quase 4 mil vagas pelos próximos 12 meses, com o apoio do SENAC, e já estamos em avançadas conversas com o privado para que absorvam a mão de obra a partir desta oferta. No total, são 10 cursos, sendo cinco em cada eixo – Inglês, Espanhol, Turismo Cultural, Alimentos e Bebidas, Protocolos e Boas Práticas de Prevenção à Covid-19 e Libras Básico. A ação inclui ainda turmas de capacitação e aperfeiçoamento em Técnicas de Serviços de Garçom com Ênfase em Vendas, Recepção de Hotéis: Operação e Procedimentos, Etiqueta, Cerimonial e Protocolos, Técnicas de Organização de Eventos e Informações Turísticas Locais. As inscrições para a primeira turma terminam no dia 20 de junho (nesse site).
O Rio é forte em eventos como Rock in Rio, réveillon, carnaval, festivais… Como ter atrativos o ano inteiro para movimentar a economia e gerar empregos?
O Rio é capaz de receber grandes eventos de maneira constante. Nos anos 1980, tivemos o primeiro RIR, depois recebemos quase 200 chefes de Estado na Rio92; em 2007, os jogos Pan Americanos e, daí pra frente, é o que já sabemos: Copa, Olimpíadas, Jornada Mundial da Juventude, etc… Mas o que de fato movimenta o setor são eventos pequenos e médios. Os grandes, sem dúvida, são importantes para deixar clara a marca Rio no imaginário popular, mas são os congressos de classe, pequenos festivais, feiras e exposições que mantêm os hotéis cheios, os restaurantes lotados e o transporte andando. E o Rio tem como vocação alguns temas, como esporte, medicina, tecnologia, entre outros. Devemos investir em trazer eventos dessas temáticas pra cá, e já estamos fazendo. O Rio Convention & Visitors Bureau é um grande parceiro nesse sentido, mapeando os eventos no mundo inteiro, utilizando inteligência de dados e trazendo os organizadores para conversar conosco, da Prefeitura, onde podemos oferecer condições mais competitivas que as cidades concorrentes.
Existe um problema constante com a violência — nossa imagem não é nada boa no exterior. Como mudar isso?
Sim, a preocupação com a segurança nas áreas turísticas é redobrada. Em parceria com o Centro de Operações, indicamos onde novas câmeras devem estar, muitas delas com reconhecimento facial, por exemplo. Com a Secretaria de Ordem Pública e a Guarda Municipal, colocamos um ônibus permanente em frente ao Trem do Corcovado e outro em frente ao Pão de Açúcar. O BPTUR (Batalhão de Policiamento em Áreas Turísticas), com o Comandante Robson e a DEAT (Delegacia Especial de Apoio ao Turismo), com a delegada Patrícia também fazem um trabalho de excelência no policiamento de áreas turísticas e investigações de crimes contra os nossos visitantes, comprovado pelos números que nos apresentam constantemente. O que pouca gente vê é que o Rio está mais seguro do que há alguns anos; óbvio que estamos longe do ideal, mas a imagem de tiroteio no meio da rua, não existe mais. A revista ‘The Economist’, no ano passado, disse que o Rio é mais seguro que São Paulo, por exemplo. O trabalho de reposicionamento da marca em relação a esse tema é de formiga e de longo prazo, mas acho que estamos no caminho certo.
O jeitinho carioca, aquele “ixperto” que tenta explorar turista… Isso chega a ser um problema ou faz parte nos grandes polos turísticos?
Acho que faz parte dos problemas de toda grande cidade turística, em maior ou menor grau, mas existe. Mas isso não quer dizer que seja algo aceitável, muito pelo contrário. A DEAT faz um grande trabalho de investigação aos golpistas cariocas e vários já foram identificados e presos. Outra coisa é o trabalho de conscientização que falei antes. A sociedade precisa entender que, se a imagem do Rio é ruim, vem menos turista, circula menos dinheiro, consequentemente negócios vão à falência e perdemos emprego e renda.
Quais as regiões, no seu ponto de vista, precisam de mais cuidados?
Copacabana, apesar de ser um dos bairros mais vigiados do País, com centenas de câmeras, duas delegacias, dois batalhões, três programas de segurança, continua sofrendo com altos índices de furto aos pedestres. Além disso, bairros com grande potencial turístico e que com um carinho especial, podem deslanchar, como a Glória — onde já entramos com o Dias de Glória, nosso Distrito Turístico da Glória —, outros bairros onde pretendemos investir no futuro são Paquetá, Madureira, Gamboa, Santo Cristo… São áreas que, como disse, se o Poder Público articular entre os atores da região e investir na recuperação, cria-se uma fagulha que pode facilmente crescer.
Geralmente a gente busca exemplos em outras cidades, estados, países. O que viu em outros lugares do BR e do exterior que poderia ser implementado aqui?
Existem duas pautas que estão muito avançadas lá fora e aqui ainda engatinham: sustentabilidade e acessibilidade. Com relação à primeira, já iniciamos conversas com o Programa de Plásticos Circulares da União Europeia, inclusive abrindo portas com bares, restaurantes e hotéis. O objetivo é, cada vez mais, restringir e deixar de usar o plástico de uso único. Pra que, por exemplo, aqueles frasquinhos nos hotéis com shampoo e condicionador? Alguns hotéis já estão colocando dispensers nos banheiros, eliminando o uso do plástico. Com relação à acessibilidade, também já tive uma conversa muito boa com a secretária de Pessoa com Deficiência, a Helena Werneck, e estamos conversando com os principais pontos turísticos para iniciar esse trabalho da acessibilidade, que vai muito além da rampa e do elevador. Essa é apenas uma dimensão da pauta, que é importante, mas não é única. O Parque Bondinho já está nessa, e o nosso próximo objetivo é que o Cristo Redentor possa receber uma chancela de acessível de ponta a ponta – do momento que sai do hotel até chegar aos pés do monumento. Se somos referência em turismo, não podemos ficar para trás em assuntos tão importantes.
E quais os próximos passos? Existe algum projeto que gostaria de deixar de “herança” pra cidade?
Continuar articulando para trazer mais eventos de renome internacional para o Rio, auxiliando na internacionalização permanente da nossa marca. Trabalhar de braços dados com o setor do turismo na busca constante por novas ideias e resolução de problemas. Saber que em breve teremos um plano estratégico, por exemplo, e que deverá ser seguido por todos os próximos gestores, é algo que me enche de orgulho. Sem contar os demais projetos, como os distritos turísticos, o estacionamento para veículos fretados de turismo, o Painel do Turismo Carioca, dentre outros.
Por Dani Barbi