Qualquer pessoa que pretende ocupar um cargo público sabe o que vem pela frente, principalmente as cobranças da população, ainda mais quando a cidade é o Rio, maior vitrine do País, com os seus quase sete milhões de moradores de olho em tudo que é problema — e temos de sobra — muitas vezes, fazendo parte dele.
Secretário de Ordem Pública, o delegado Brenno Carnevale comanda uma das pastas mais importantes, e suas ações têm repercussão, por ser de interesse direto do morador.
Embora tenha 31 anos, Brenno tem experiência: formado em Direito pela PUC-RJ, aos 22 já era delegado (na Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense e na da capital), o mais jovem do País. Como sempre gostou de polícia e política, foi conhecendo pessoas do meio, como o então secretário de Governo Marcelo Calero (hoje deputado federal), que o convidou para assumir a subsecretaria de Integridade, em 2020. Na transição de governo, conheceu Eduardo Paes.
Desde então, tem sido elogiado por quem o acompanha no dia a dia — mas também incomoda milicianos e criminosos; até por isso, virou alvo. Seu nome está na lista do Disque Denúncia com ameaça de morte do crime organizado. “Este ano, até agora, já provocamos um rombo de quase R$ 100 milhões nas contas dos criminosos. Do ano passado pra cá, foram 766 construções irregulares indo pro chão (444 em 2021 e 322 em 2022). E, só em 2022, foram 3 toneladas de cobre apreendidas nas operações em ferros-velhos clandestinos”, diz Brenno.
Qual o balanço desse tempo à frente da Secretaria?
A Seop é uma secretaria complexa e diversa nos temas que tratamos, porque falamos desde o comércio ambulante, fiscalização de construções irregulares, ferros-velhos, feiras, alvarás de comércio, transporte de Van, segurança no BRT, Guarda Municipal, são muitas frentes. A pasta é importante pela variedade de assuntos e o balanço até agora é positivo, porque a gente vem conseguindo desenvolver certas ações que a cidade precisa para se recuperar. Destaco, principalmente, o combate às construções irregulares e o programa de segurança pública de prevenção. Então estamos conseguindo, ainda que com dificuldade, retomar a ordem pública e, de certa forma, tenho feito esse esforço para traçar um planejamento estratégico, fugir um pouco de ficar só operação, que é fundamental, mas precisa ser inteligente, ter estratégia, e isso estou conseguindo implementar.
Como ordenar uma cidade do tamanho do Rio?
Não trabalhamos sozinhos, mas com alguns órgãos, como a Guarda Municipal, a coordenação de controle urbano, de feiras, de transporte complementar, de licenciamento e fiscalização, a equipe do BRT Seguro, a minha subsecretaria de operações, então nós temos aqui funcionários de carreira que formam uma grande equipe. Têm também os subprefeitos, que facilitam o nosso trabalho para atuarmos de forma cirúrgica nas demandas mais urgentes.
As insatisfações nas regiões da cidade são parecidas?
Tem características diferentes. Na Zona Sul, temos reclamações muito relacionadas à perturbação do sossego e temos feito muita fiscalização nesse sentido, além do ordenamento com equipes nas praias e pontos turísticos. Na Zona Oeste, temos muita denúncia de construção irregular e, na Zona Norte, alguns centros comerciais que precisam ser ordenados, como comércio ambulante. Então, cada região tem uma demanda diferente, mas com muitas características em comum, como os problemas de segurança.
Temos recebido muitas reclamações de leitores sobre o descaso com Ipanema e Copacabana, por exemplo. Neste domingo (29/05), moradores de Copa vão fazer um protesto…
Temos feito operações nos calçadões, em todos os fins de semana. Temos equipes fazendo apreensão de garrafas de vidros, fiscalizando o uso indevido de som, mas é um desafio, e não temos como manter as equipes o tempo inteiro no mesmo lugar. Fazemos as ações diárias entre Ipanema e Copacabana, na Ataulfo de Paiva, Visconde de Pirajá, Nossa Senhora de Copacabana… Claro que as manifestações são importantes, mas a Prefeitura tem um programa específico para Copa que é o “Rio Mais Seguro” e foi lançado no bairro, semana passada, o CEP (Conjunto de Estratégia e Prevenção), ali na divisa entre os dois bairros. Então abraçamos aquela região – que fica ali na Francisco Otaviano e Rainha Elizabeth -, com a presença da Guarda. Mas, claro, os problemas são muitos, e vamos continuar trabalhando; a Prefeitura está muito atenta a essas regiões.
Onde o Rio é mais frágil e mais forte?
Acho que a força do Rio é a população — o carioca tem esse espírito de luta. A fragilidade é geral, até pelo momento que estamos atravessando nos últimos anos, somando a crise econômica com a pandemia, dois ingredientes que trouxeram muitos problemas, não só para o Rio como também para o País. A cidade está numa fase de recuperação e acho que o prefeito, com a capacidade de gestão de comando, conseguiu ajustar financeiramente a Prefeitura, e agora o grande desafio é retomar as atividades da cidade e isso tem sido feito em eventos, atividades culturais. O turismo está voltando e à Seop; cabe garantir que a cidade seja atrativa e acolhedora para esse povo que é o ponto forte da cidade.
De todos os trabalhos da secretaria, qual o mais desafiador e o mais tranquilo?
O mais desafiador é a questão das construções irregulares porque esse trabalho não foi feito nos últimos anos; então houve um crescimento desordenado, e a gente está lidando commilícia e criminosos organizados. Hoje temos territórios em que o crime exerce muita influência. É difícil dizer o mais tranquilo… A gente tem um braço importante que é a Defesa Civil, um tema que as pessoas costumam ajudar, porque a gente está lidando com prevenção à vida, então fazemos simulados nas comunidades que têm sirenes e é um trabalho de muita parceria com a população.
Mas esse cerco a criminosos já lhe deu dor de cabeça? Tem medo?
Na polícia aprendi que quem faz o certo não tem o que temer e isso não é uma força de expressão, porque estamos fazendo o nosso trabalho. Na polícia, eu investigava, prendia; aqui é um trabalho que tem como objetivo asfixiar financeiramente essas quadrilhas. Não tem o que temer. E, sim, o Disque Denúncia detectou possíveis ameaças, claro que a gente fica atento, porque estamos enfrentando esses criminosos e estamos em campo o tempo todo.
Nunca tentaram te subornar?
A corrupção é um mal do ser humano, mas acho que, quando você tem uma postura e uma história, um propósito e estão dentro do mesmo padrão ético que você, sequer ficam à vontade para me abordar, então comigo sempre foi assim — na polícia e na política, nunca tive nenhum tipo de problema com isso e, se acontecer, vou tomar as medidas legais e cumprir o que tem que ser feito.
Você foi delegado da divisão de homicídios da Baixada e da capital. Como isso te preparou para seu cargo atual?
Fiquei quatro anos na Delegacia de Homicídios, tanto na capital quanto na Baixada, e eu acho que ser policial, que sempre foi meu objetivo profissional, a minha vocação, traz uma capacidade de gestão e de gerenciamento de crise, então na polícia, por exemplo, a gente tem grandes equipes e uma necessidade de resolver os problemas de forma rápida, e também é um serviço público, você lida diretamente com a população. A polícia me ensinou a ter empatia com as pessoas, já que muitas perderam seus parentes, e a resolver problemas com poucos recursos, o que é importante para o gestor público, e a liderar equipe. Não adianta dar ordem, mas trabalhar em equipe. E também do ponto de vista de visão estratégica de cidade. Hoje eu trago para a Seop temas em que a prefeitura possa colaborar com a segurança pública (como os ferros-velhos, construção irregular da milícia e prevenção a crimes de oportunidade) e minha bagagem como delegado me ajuda nessa visão estratégica de forma técnica.
Por que você entrou nessa?
Fui convidado pelo Marcelo Calero para ser subsecretário de Integridade na Prefeitura, em dezembro de 2020. Durante a transição de governo, o prefeito me convidou para ser secretário de Ordem Pública. Acredito muito na gestão pública como transformação, então isso continua sendo uma profissão por vocação, me preparei a vida inteira para ser policial, delegado. Agora, como secretário de uma cidade como o Rio, a minha capacidade de ação é muito grande, então encaro isso como uma oportunidade de transformar a vida das pessoas. Acredito na missão pública e sempre fui um cara que pensa no coletivo, na vida em sociedade. Ocupar essa função me permite realizar essa melhoria na vida das pessoas. E, claro, a Ordem Pública tem muita relação com segurança pública e acho que consigo contribuir com a minha experiência.
A fiscalização contínua nos ferros-velhos pode melhorar o vandalismo aos monumentos ?
Esse é um dos objetivos. A gente começou a intensificar essas ações no ano passado, porque o caminho do material furtado e depredado, em regra, são os ferros-velhos clandestinos. Então isso movimenta um mercado, assim como nas construções irregulares, e quando a gente consegue reduzir a atratividade financeira a gente acaba golpeando o caminho do furto. Então a gente apreende muito fio de cobre, tampa de bueiro, cobre queimado, papeleira da Comlurb e à medida que vamos fiscalizando, vai tirando quem trabalha na irregularidade da zona de conforto. Só este ano foram 3 toneladas de cobre apreendidos pela Seop. A depredação afeta diretamente a população — é a internet que cai, o sinal que para, o sinal de trânsito que queima, e a gente não pode tolerar isso.
Ser um eterno vigilante não cansa? Existe uma hora em que você “desliga”?
Quem trabalha com ordem pública não pode descansar e, pra ser sincero, gosto de estar atento, primeiro porque o chefe (Eduardo Paes) não desliga, então não posso desligar. Se tem evento a gente precisa estar lá, se está chovendo, precisamos estar lá, se tem sol, temos a Operação Verão, fora que a pasta está ligada diretamente ao funcionamento da cidade. Não tem dia, hora ou fim de semana, mas estou feliz assim e quero continuar.
numero:13 O Centro é uma das paixões deste governo. Que ações a pasta de Ordem Pública tem tomado no auxílio do programa de revitalização?
A gente tem operações diárias no Centro, nos mesmos moldes nas orlas e Zona Sul. Temos o Reviver Centro, programa do Planejamento Urbano e que a Seop está diretamente envolvida, no sentido de ordenar o comércio ambulante. Já desativamos várias bancas, assim como ferros-velhos. O Centro é fundamental para a recuperação do Rio.
Vocês pegaram algum exemplo de gestão em outro lugar?
Temos alguns modelos, como o da cidade colombiana de Medelim, dominada pela violência do cartel de drogas na década de 90, adorou medidas de segurança pública nas últimas décadas. Estamos programando uma viagem até lá para conhecer de perto alguns programas; no Brasil temos o da cidade de Sobral, no Ceará, que puxa pela prevenção e educação; então fomos juntando essas peças através de estudos, experiências anteriores e até a minha própria como delegado para entregar ao Rio políticas públicas eficientes.
Por Dani Barbi