O século XXI tem trazido mudanças radicais, sobretudo na área dos costumes: o impacto na constituição de famílias, formas de amar, o papel das mulheres, dos homens… Mas a grande virada de chave é o comportamento dos pais. Como já dizia um famoso comercial, “ser pai é participar”. Estão em cartaz duas comédias que, de forma diferente, abordam o assunto e, ao nos fazerem rir, também nos levam a refletir sobre o que é o mundo hoje.
“Intimidade Indecente”, que estreou em 2001, conta a história de um casal que se separa aos 60 anos, mas segue se reencontrando vida afora, e ainda reconhecendo um no outro o seu maior cúmplice. O texto de Leilah Assumpção, dirigido por Guilherme Leme Garcia, com Marcos Caruso (Mariano) e Eliane Giardini (Marina), apresenta um tempo em que a mulher começa a se rebelar contra o patriarcado.
As situações são as metáforas de o marido ter uma amiga jovem, a transformação em “late blooming lesbian”. As situações são muito, mas muito divertidas e, com a interpretação estupenda de Marcos Caruso, apoiada na força de Eliane Giardini, o que se vê ao mesmo tempo é que o que já foi bom virou inadmissível, inaceitável. A participação da plateia (lotada) mostra isso e evidencia que há uma torcida explícita contra o marido.
Com texto inédito de Ulisses Mattos e direção de Henrique Tavares, “Pai Ilegal” foi idealizado pelo protagonista Pedro Monteiro, que apresenta a segunda parte de uma trilogia teatral sobre a paternidade. Na peça, todo homem precisa passar por um difícil processo até obter seu “certificado” de pai. O processo não é simples: a vontade de ter um filho vai esbarrar na falta de preparo, na insegurança e até no machismo estrutural, ainda presente na sociedade, que insiste em delegar para a mãe a maioria dos cuidados com o bebê.
É desse embate — entre querer ser pai e a exigência de como tem que ser o pai em uma nova era – que se constrói a trama com Gabriel (o pai), detido em uma prisão onde a agente Gabriela Estêvão e a chefe ísis (Juliana Guimarães) o submetem a todas as provas para ser pai. A direção de Henrique Tavares aguça os absurdos da situação em que tudo é exagerado: a atuação, os barulhos, a movimentação. Contudo, ao contrário de Mariano em “Intimidade Indecente”, Gabriel entende que não pode escapar do que se impõe.
Vimos as duas peças no mesmo dia, porque “Pai Ilegal” está na Cinelândia e “Intimidade Indecente”, no Shopping da Gávea, com o suficiente intervalo para ir de metrô. A boa opção fez com que tivéssemos um panorama perfeito, passado, presente e futuro. E concluímos: salve a mulher!
Serviço:
“Intimidade Indecente”, Teatro dos Quatro, no Shopping da Gávea:
Quinta a sábado, às 21h
Domingo, às 19h
“Pai ilegal”, no Teatro Dulcina, no Centro:
Quinta e sexta, às 19hSábado e domingo, às 18h