Carnaval. Festival. Alegria. Ribombos. Rico vira pobre. Pobre vira rico. Serpentinas, confete, alegria, música, dança, beijo, abraço. Casais que se formam, amores efêmeros, perder-se na multidão. Quatro dias de folia. É a marca maior do Rio de Janeiro. Expressão de nosso povo, de nossa gente, do espírito que ameniza o calor, transcende fronteiras, nosso evento maior — o desfile das Escolas de Samba — é considerado o maior espetáculo da Terra. A comédia “Rio 2065” conta história de carnaval.
O texto afiado de Pedro Brício — densa dramaturgia, a partir de fatos históricos e aspectos culturais — concentra-se em possível homenagem aos 500 anos de Fundação do Rio. Mistura de “science fiction”, chanchada pastelão, comédia, quiproquós. Assim, o carnaval, a festa da inversão, império da paródia, paraíso do sonho e do desejo, é a alegoria de nossas mazelas atuais, ao mesmo tempo em que nos apresenta um duplo sentido de como o poder é capaz de matar as aspirações populares.
A direção de Ivan Sugahara coloca o bloco na rua, com todas as suas alas — as subtramas — e com os participantes — uma diversidade de personagens, com estrangeiros, replicantes, cariocas de vários quadrantes — dizendo na voz e no corpo, com falsetes, sotaques exagerados, barrigas proeminentes que dançam péssimo, cantar desafinado, fantasias descoordenadas, um clima de total farsa, como é farsesca a história, tudo improvável na própria trama, mas que, com o ritmo e as marcações, Ivan consegue um belo espetáculo no qual a risada não abafa o sentido.
O elenco da Cia. Os Dezequilibrados interpreta os variados papéis que formam um verdadeiro desfile, dos mais acabados e folclóricos cariocas, até personificação de fantasias populares. Quatro integrantes do grupo — Ângela, Cristina, José Karini e Letícia, juntam-se a convidados: Alcemar Vieira, Guilherme Piva, Jorge Mayae Lucas Gouvêa. E evoluem todos com muita competência, conseguindo um samba sem nenhuma atravessada, como é raro se ver, inclusive no Grupo Especial.
É a visão dos quadros que se sucedem, que se misturam, que o fio condutor é uma teia da qual saem os filamentos que vão compor os preparativos de um desfile importante. Radicaliza que o Rio deixa de ser um centro cosmopolita e se torna um local subalterno de puro entretenimento, no qual os clássicos desmandos mudaram de eixo. É brilhante o texto, pois a comédia vem de todos os lados: das situações, das piadas, dos personagens atrapalhados e inadequados. É um conjunto de ondas, no qual se equilibra o público vendo o desenvolvimento da metáfora e se divertindo, entendendo que a vida do futuro é plantada hoje, mas que a gargalhada vem da acidez do bom espetáculo.
Serviço:
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