Teatro, por Claudia Chaves: “Vinte”, da Focus Cia. de Dança 

Uma vez, Clarice Lispector falou sobre o que achava ser o papel da dança: “O mundo já caiu, só me resta dançar sobre os destroços.” “Vinte”, o mais novo espetáculo da Focus Cia. de Dança, dirigido e coreografado por Alex Neoral, marca a maioridade da companhia: 21 anos. Esse novo espetáculo vai trazer, com a presença de oito bailarinos, os tons que Clarice imprimiu à sua literatura.

A tarefa é difícil, pois traduz palavras, histórias, angústias, pensamentos em gestos, em passos e movimentos, nos enlaces e embates dos corpos. E, além do mais, de extrema coragem. Alex foge da facilidade de se apoiar em contar uma história ou de usar figurinos que caracterizem os personagens. 

Os figurinos são roupas cotidianas, mas que funcionam para evidenciar uma atemporalidade, um tempo passado, que não é hoje, mas também não é um ontem. É um tempo de lembrança, de trazer às cenas pessoas que foram os personagens de Clarice — pessoas que se encontram nas ruas, nas festas de famílias, nas repartições; pessoas que vivem no que pensam e no que sentem. E aí o ballet é perfeito para expressar essa força porque mostra o ir e vir, o devir, e as coreografias escolhidas por Alex privilegiam os corpos movimentando-se no chão. São os seres que não conseguem reerguer-se, mas se expressam com força. O cerne da obra da autora. 

Todos os temas de Clarice estão lá: vida, morte, maternidade, mulher, amor, alma, coração… — temas recorrentes que viram cenas de um espetáculo envolto em vigor e paixão, num cenário, criado por Natália Lana, que conta com uma bolha gigante e transparente de 2,50m de altura, onde os bailarinos dançam e interagem. E ainda 400 ovos, que remetem ao início da vida, a fase embrionária, e um fio metálico representando o cordão umbilical e a finitude. 

A trilha sonora original, de Felipe Habib e Plínio Profeta, com muita percussão, traz vários instrumentos musicais: acordeom, violão, piano, que acompanham a coreografia privilegiada  — os pas de deux de ótimo desempenho, poético mesmo. “Vinte” é um espetáculo que supera a tradicional possibilidade do ballet: contar uma história ou apenas utilizar o corpo como significante para aquilo que se pretende dizer. É coragem de inovar, é ir além do mesmo. E, por isso, vale conferir. 

Fotos: Manu Tasca

Serviço: 

De 4 a 7 de novembro, de quinta a sábado, às 20h, e domingos, às 19h

Teatro Riachuelo (Rua do Passeio, 40)

https://www.sympla.com.br

Obs.: os ingressos são para apresentação presencial e serão vendidos on-line pelo site, pelo totem no teatro e pela bilheteria que funciona de segunda à sábado, das 12h às 20h, e domingo, das 12h às 19h.