Diante da passagem de Nelson Teich pelo Ministério da Saúde – o nono ministro a deixar o primeiro escalão do governo Bolsonaro em 1 ano e quatro meses, — convidamos alguns médicos cariocas para comentar a atual situação que culminou com a demissão do oncologista, depois de 28 dias no cargo. Em sua meteórica passagem, Teich passou por, pelo menos, um grande constrangimento público.
Durante entrevista coletiva, ficou sabendo que o presidente havia colocado, entre serviços essenciais, academias, salões de beleza e barbearias. Foi avisado pelos repórteres; depois, houve a mudança de protocolo da prescrição da cloroquina. Amigo do médico comenta: “Teich tem nome firmado, é um homem conhecido, rico e respeitado na área. Não precisa passar por isso.”
Daniel Soranz (sanitarista, ex-secretário Municipal de Saúde): “Era esperada a saída do ministro Teich. Ele não teve autonomia alguma para montar a equipe, e todos os cargos estratégicos, como secretárias e departamentos estavam sendo escolhidos pelo presidente e seus filhos. Neste momento, todos os principais processos do Ministério da Saúde encontram-se parados. Hospitais federais do Rio estão com leitos fechados por falta de recursos humanos e insumos; insegurança nos processos de compra e definição dos insumos estratégicos para o combate à COVID-19. Por exemplo, no combate à H1N1, em 2009, o Ministério da Saúde definiu que a Oseltamivir Tamiflu seria comprada, nacionalmente, pelo Ministério da Saúde, garantindo o poder de compra do Estado e uma distribuição equânime do medicamento. No caso atual, estados e municípios, sem ordenamento, compram testes, equipamentos de proteção individual e até respiradores a preços absurdos, competindo entre si e de modo totalmente desordenado. Vai mais um ministro, e, cada vez, politizam-se mais as decisões em um ministério que deveria ser essencialmente técnico e formado por pessoas com experiência na área.”
Daniel Tabak (oncologista): “Pedir demissão foi a única coisa digna que o Teich fez até agora, nesse ministério.”
Gilberto Ururahy (médico preventivo): “Conheço o Nelson Teich há muitos anos. Ele tem excelente padrão técnico e é também um excelente profissional em Saúde Pública. Estamos numa pandemia; ela vem, faz seu papel e vai embora. Enquanto isso, vivemos uma situação sanitária inédita – o mundo está pagando, está sentindo, está adoecendo. Ocorrem, inclusive, aumento de doenças mentais, síndrome do pânico, estresse, depressão, todas crescendo. Tudo isso gera medo. Essa instabilidade que está acontecendo no País traz muitas incertezas, e nos ressentimos muito, mais ainda, com a saída de dois ministros da Saúde.”
Pedro Basílio (cirurgião gastrointestinal): “Nelson é um cara extremamente competente, de carreira sólida tanto como médico quanto como administrador e empreendedor; já poderia prever que não conseguiria fazer o que planejava, por receber uma influência do Bolsonaro. Ele procurou ter uma visão nacional — esteve em Manaus, tentando apagar incêndio, voltando para Brasília para estruturar uma estratégia de abrangência para o Brasil inteiro. Foi surpreendido por um decreto para abrir academias, cabeleireiros e barbearias. Não tem condições de executar um plano com uma interferência dessa intensidade.”