“De médico e louco, todos nós temos um pouco”, mas, quanto à maldade, sempre evitamos esse tema. Mesmo as piores pessoas, as que cometeram atrocidades morais, físicas, quando morrem, passa-se uma borracha, como se, no mundo, só houvesse anjos. A maldade, a ruindade, a perversidade dificilmente são aparentes em personagens. A coragem de João Ubaldo Ribeiro é encarar o tema, sem piedade, em “Diário do farol — uma peça sobre a maldade”.
Com idealização e inspiração de Domingos Oliveira, direção de Fernando Philbert, o solo com Thelmo Fernandes nos permite pensar e repensar sobre diversos temas: o filho abandonado, o marido infiel, o religioso tarado, o negro período da Ditadura no Brasil. E sobretudo é uma reflexão sobre a retidão de caminho que o sujeito escolhe, mesmo que seja encontrar a absoluta solidão.
A interpretação do premiadíssimo Thelmo é de uma consistência perfeita com o texto. Não há caricaturas, não há exagero, não há ódio e muito menos qualquer tipo de sentimento. Dialogando com a plateia, Thelmo constrói uma história brutal de um homem que olha a vida em flash-back, sem qualquer futuro, mas que, ao relatar os fatos e suas razões, pode-se entender a gênese que só pertence às escolhas de cada um.
“Eu sou o pior dos seres humanos. Encarnei em mim tudo o que me convinha. Matar, mentir, enganar, envenenar, esganar, estuprar, seviciar, ferir, seduzir são os verbos que norteiam a trajetória. Apesar de o farol ser nomeado como Lúcifer, um nome pouco usado na Bíblia, o que o texto e a voz contam é que a maldade mora não numa ilha distante, mas em cada um de nós.
Serviço:
Mezanino do Sesc Copacabana
Quintas a domingos, às 20h.
Fotos: Rafael Blasi