Chefe da seção de Ciências Planetárias do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, na Califórnia, EUA, a astrônoma Rosaly Lopes está no Rio. A carioca veio a convite do Observatório Nacional para fazer, nesta quinta-feira (08/10), uma palestra no Planetário da Gávea sobre a Missão Cassini, que estuda Saturno e seu sistema planetário. Especialista em vulcões ativos do sistema solar, reconhecida pelo Guiness Book – só em Io, lua de Júpiter, ela descobriu 71 vulcões – Rosaly tem espírito inquieto também no que se refere à Terra. Ela já visitou cerca de 50 vulcões em atividade no mundo, que serviram de base para o seu livro “The Volcano Adventure Guide”, publicado em português, como “Turismo de Aventura em Vulcões”, pela Oficina Textos.
De onde vem esse espírito aventureiro que levou uma carioca a desejar ser astronauta e, depois, a se formar como astrônoma?
“A pessoa nasce ou cresce com o espírito de aventura. Cresci acompanhando a corrida à Lua, os astronautas. Queria ser astronauta, mas era mulher e brasileira – e ainda por cima, míope, e a visão ruim é um dos critérios que desqualificam para essa função. Decidi, então, que ia trabalhar na Nasa, ajudando as missões de exploração do espaço. Hoje eu me sinto explorando o espaço, através da observação feita pelas sondas”.
Como é sua rotina de trabalho na Nasa? Qual é a contribuição do estudo de vulcões para o programa espacial e para a ciência?
“Varia de acordo com a missão de que estou participando. Já me dediquei ao estudo de Io, a lua de Júpiter, e agora pesquiso Titã, a lua de Saturno, por meio de dados das missões em computadores – são poucos os cientistas que usam telescópios. Sou PHD em geologia dos planetas e me especializei na área de vulcanologia, mas nosso trabalho é de comparação, não podemos mandar naves até lá, nem recolher provas. Os fluxos de lava em Marte são comparados com os da Terra, levando em conta a atmosfera e a gravidade diferentes. Descobrimos que a composição da lava de Io se parece com a da Terra há milhões de anos”.
Existe preconceito nos EUA em relação à mulher cientista?
“Hoje em dia muito pouco, são casos individuais, de homens machistas. Nos EUA isso é levado muito a sério, todos tomam muito cuidado, porque você pode ser despedido. Na Califórnia, as leis são muito rígidas. Existem cursos de algumas horas para quem assume cargos de chefia saber reconhecer e evitar preconceitos de qualquer tipo. No meu laboratório, por exemplo, ficamos de olho para ver se há diferença entre os salários de homens e mulheres, posso dizer que fazemos estatísticas para medir o preconceito. Se ele existe, não é expresso”.
Se você pudesse,também mandaria uma música brasileira para o espaço, como fez a engenheira da Nasa Jaqueline Lira em 1997, transmitindo o samba “Coisinha do Pai” para a superfície de Marte?
“Esse foi um mal-entendido que dura até hoje. A Jaqueline estava trabalhando nessa missão a Marte, a Pathfinder, e havia o hábito de se colocar uma música para ‘acordar’ os robôs. Ela colocou o samba no momento de transmitir os primeiros comandos e acionar o robô Sojourner, mas a música não ecoou em Marte, foi ouvida só na sala de trabalho, na Terra.
Como chefe do comitê da União Internacional de Astronomia, que tem a função de dar nomes aos acidentes geográficos nos planetas e luas, eu homenageei o Brasil dando o nome de Jobim e Villa-Lobos para duas crateras em Mercúrio. Dois dos vulcões em Io, que foram batizados com nomes que têm a ver com deuses do fogo, se referem à mitologia dos índios brasileiros. Eles se chamam Monã, o Deus dos tupi-guaranis, e Tupã”.
A existência de água em Marte, recentemente descoberta, dá esperanças de que haja vida microscópica além da Terra. Você, particularmente, acredita que a humanidade está preparada caso existam ETs?
“As condições necessárias para o desenvolvimento da vida é uma das questões mais importantes da Ciência Planetária e, até o momento, não podemos dizer se é fácil ou difícil porque só temos a Terra como referência. Hoje, por causa da tecnologia das redes sociais, as pessoas estão bem informadas sobre o que estamos pesquisando. Acho que, se for provada a vida microscópica em Marte, as pessoas ficariam contentes. Quanto à existência de uma civilização semelhante à nossa, acredito que se houver uma aproximação, ela vai ser gradual, algo como a descoberta de ondas de rádio, primeiro. Outros sistemas solares vêm sendo descobertos, as pessoas estão se acostumando com esse tipo de ideia”.