“Love is a many splendored thing”, além de nome de um filme da década de 50, é uma forma de viver, de ver o mundo e a vida, de se relacionar. “Um Jardim para Tchekhov”, mais um certeiro texto de Pedro Brício, trata de vários amores: mãe/filha, aluna/professora, artista/autor, marido/mulher. Pontuado por uma ótima trilha musical, a peça apresenta como escolhas a arte e os afetos que ultrapassam todas as fronteiras.
Maria Padilha faz a personagem Alma Duran, uma atriz que precisa, e quer, refazer a carreira. Mora com sua filha, a médica Isadora (Olivia Torres), e seu genro, Otto, um delegado de polícia (Erom Cordeiro), e dá aulas a Lalá (Iohanna Carvalho), até que encontra um Tchekhov (Leonardo Medeiros) no playground do prédio. A partir daí, o conjunto de atores executa um ballet sob a direção orquestrada por Georgette Fadel, no qual as atuações crescem em dimensão e qualidade.
A angústia de Alma parece loucura pela sua obsessão pelo “Jardim de Cerejeiras”, uma peça que o próprio autor considera comédia porque diz que os dramas podem ser divertidos. Essa é a grande lição, pois os percalços dos personagens funcionam como romance de formação, no qual todos traçam um novo itinerário de vida.
A iluminação de Maneco Quinderé, a presença de bonecos João Bobo com a foto dos atores e um atrevido boneco samovar, uma mesa que vira elemento recorrente para movimentação dos atores no inovador cenário de Pedro Levorin e Georgette Fadel, os corretíssimos figurinos de Carol Lobato são o suporte para, fato raro, uma peça que não é nem teatro de nicho e muito menos teatro de libelo. É emocionante ver os sentimentos das pessoas no palco.
Há dois pontos altíssimos a ressaltar. Todos os atores fazem um trabalho de prima, mas o solilóquio de Erom Cordeiro do personagem Lopahin de “O Jardim” é de nos fazer chorar. A trilha musical que culmina com a música tema de um hollywoodiano Spellbound (fascínio)/Quando fala o coração no beijo de Alma e Tchecov e com a presença sutil, ao fundo, do principal dueto de Roda-Viva que fala “Vem sem mentir pra você” nos mostra que o teatro é a mentira que não engana.
Serviço:
CCBB, no Centro, até 27 de outubro