A partir do declínio do sol desta terça (08/10, entre 18 e 21h), Nelson Motta estará no Blue Note, na Avenida Atlântica, autografando seu novo livro, “Corações de papel” (Record). O paulista, carioca convertido por dentro e por fora, no espírito, no jeito e até no figurino, está sempre passando a ideia de a-vida-vai-muito-bem-obrigado, com alegria, leveza e algum assunto de cultura sempre pronto para ser contado – é jornalista, compositor, cronista, produtor musical e escritor.
O lançamento é aberto ao público, com o show “Multidimensional”, com Eduardo Santana, e um DJ na área externa.
Nelson é autor de mais de 300 músicas com diversos parceiros, de sucesso e de best-sellers, como “Noites Tropicais” e “Vale Tudo – O Som e a Fúria de Tim Maia”, que, juntos, venderam mais de 300 mil cópias. O novo livro faz uma viagem ao Rio dos anos 1960, partindo das cartas que ele escreveu a um amor da juventude entre 1964 e 1965. Antes de entrar no mercado musical, Nelson estudou Design; no 1º ano da faculdade, apaixonou-se por Ana Luiza, que foi morar com a família em Paris. De coração partido, passou um ano escrevendo cartas para ela, que depois virou amiga.
Em 2014, Nelson recebeu de Ana uma pasta com as cartas, todas organizadas em ordem cronológica. Foi assim que nasceu o livro, complementado pelas circunstâncias históricas, culturais e amorosas em que foram escritas. E, claro, estão lá personagens que sempre fizeram parte da sua vida: João Gilberto, Nara Leão, Dori Caymmi, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Zuenir Ventura, Ruy Guerra, Glauber Rocha, Ingmar Bergman e Luchino Visconti.
UMA LOUCURA: Pegar um avião em Roma para ir a Veneza para ver Marisa Monte (quando a cantora tinha 20 anos e morava na cidade italiana) fazer um showzinho com um violonista italiano amador. Começou num barzinho, com 50 pessoas e terminou com umas 300 lotando a calçada até o canal. E vi Marisa ganhar seu primeiro cachê: US$ 50. Depois, quando a reencontrei no Brasil, minha ”loucura” deu no que deu (rsrsrs): Nelson dirigiu o primeiro show de Marisa na volta ao Rio, em 1987, e viveram um romance.
UMA ROUBADA: Uma viagem boca livre de limusine com Ricardo Amaral, de Nova York a Atlantic City, a convite de um dos “arregimentadores” de um grande cassino. O hotel-cassino Trump era uma monstruosidade de ostentação e cafonice, em uma cidade horrorosa e decadente. Não gastei um dólar no cassino, comi e bebi de graça todo o fim de semana, enquanto alguns brasileiros perderam cinco dígitos.
UMA IDEIA FIXA: A beleza: de pessoas, lugares, obras de arte, cidades, casas, matos, praias… Também a beleza das palavras, de sua sonoridade, de seu ritmo em uma frase, um parágrafo, uma letra de música … Claro, a beleza está nos olhos de quem vê, de quem lê e de quem ouve (rsrs).
UM PORRE: Inesquecível, de champanhe, num réveillon dos meus 13 anos. Vomitei a alma. Tomei pavor de champanhe. Mas o pior porre, e foi mesmo o pior, devo ter esquecido (rsrs).
UMA FRUSTRAÇÃO: Não ter sido músico, mas depois, como compositor, produtor, diretor de shows, escritor de musicais e de livros sobre música, ela me deu o melhor da vida! Se fosse músico, eu estaria tocando num lobby de hotel, com todo o respeito.
UM APAGÃO: Fazendo uma palestra em Harvard, em 2001, sobre música brasileira, estava tão nervoso que troquei páginas num inglês macarrônico e vergonhoso. Foram uns 15 eternos minutos; só aos poucos, fui me recuperando e consegui terminar inteiro. E botei pra tocar uma playlist brazuca dançante.
UMA SÍNDROME: De abstinência, quando parei de cheirar cocaína, em 1983, depois de sete anos de “cafunguelê” crônico. A síndrome é dura, mas passa. Tomei horror para sempre. É a droga do diabo, como diz Paulo Coelho. Faz mal pro corpo, pra mente e para a sociedade.
UM MEDO: De sofrer, digo fisicamente, de doenças crônicas, terminais. Não tenho medo de morrer porque até aqui foi maravilhoso. Tenho medo de sofrer dores, limitações, de internações em hospitais, tenho medo de decadência física e mental.
UM DEFEITO: Muitos. Mas um dos piores é ser repetitivo com coisas, assuntos, frases, ideias que gosto — rsrsrs. Sou chato pra cacete. Outro é buscar sempre a profundeza das coisas como bom escorpiano, quando exagero… Sou duro para perdoar, mas sempre consigo — para meu próprio bem, mas não chega a ser um defeito. O pior era a possessividade; agora, em modo desapego total, por pessoas, coisas, tempos, já curado e operante.
UM DESPRAZER: Vários, todos de perdas pessoais: meus pais, meu tio, meu amigo Dom Pepe (precursor como DJ no Rio e atuou no Frenetic Dancing Days, em 1976, e anos depois no Noites Cariocas e no African’s Bar), dos meus gatos, Tim e Max. Rombos no coração. Sempre presentes.
UM INSUCESSO: O musical “Feiticeira”, em 1976, estrelado por Marília Pêra no topo da popularidade, escrito por mim com várias parcerias com Guto Graça Mello, músicas de Alceu Valença, Walter Franco, Macalé, textos de Cortázar, Borges… Fracasso total no Rio e, pior ainda, em São Paulo. Praticamente falimos como produtores. O pior é que era um espetáculo lindo.
UM IMPULSO: Lua em Áries. Sou movido a impulsos, entusiasmos, ideias, sentimentos que tento controlar um mínimo. Tem a ver com a ansiedade. Fome de viver. Amadurecer ajuda. Não faço mais ligar o telefone ou mandar um zap na hora (rsrsrsr). Sempre dou uma refletida antes.
UMA PARANOIA: De ser preso durante a ditadura, de ser corneado durante um bom tempo, de fazer papel de otário muitas vezes. As paranoias vão mudando — a atual é ficar incapacitado, dependendo dos outros.
Foto: Leo Aversa