A atual cena do teatro no Brasil tem me lembrado o movimento das escolas de samba: um grupo especial, com poucos lutando pelo título; o grupo de acesso, o acesso do acesso, blocos de enredo, que, um dia, serão escolas, ainda que pequenas. Independentemente dos investimentos, existem aqueles que são capazes de ser midas — o que tocam transformam em ouro e pulam direto para o desfile das campeãs. Nesse grupo, está “Leci Brandão — Na Palma da Mão”.
Comecemos pelo enredo: o texto e a pesquisa do especialista em samba Leonardo Bruno viram teatro pela ótima adaptação dramatúrgica de Lorena Lima, Luiz Antônio Pilar e Luiza Loroza. Em vez de usarem o lugar-comum de biografias, com ordem cronológica, o que vemos são momentos importantes, emblemáticos na formação e construção do personagem, com contornos que despertam total interesse.
Como uma escola, cujos componentes sabem cantar, sambar no pé, evoluir de forma harmoniosa, o trio de atores — Tay O’Hanna (Leci), Verônica Bonfim (Lecy mãe) e Matheus Dias — alcança a excelência do musical: dançar, interpretar e cantar, naquele tom, sem necessidade de alterar a voz, qualidades que mesmo as consideradas campeoníssimas não conseguem.
A atuação de Verônica, por ser o mais difícil papel — mostrar a diferença de idade entre mãe e filha, a maternidade protetora, presente, acolhedora — se dá por expressão corporal: os ombros meio caídos, levemente curvados, passos lentos. Sem contar que Verônica, baiana que é, exibe um fascinante miudinho (estilo de samba de ritmo rápido e invariável, dançado com um movimento quase imperceptível dos pés e acompanhado de pandeiro, violão, chocalho e, às vezes, castanholas e berimbaus).
A harmonia entre texto (sob a competente encenação de Vilar) e o comando da evolução (sob a incrível direção de movimento de Luiza Loroza) explode ao final, com a plateia cantando, dançando, batendo palmas, confraternizando no maior sucesso de Leci, “Isso é Fundo de Quintal”. Nem a melhor arquibancada da Sapucaí causa nos assistentes emoção e tanto prazer no que veem.
Serviço:
Teatro Ipanema Rubens Correa
Sexta e sábado, às 20h
Domingo, às 19h