Existem fatos que despertam enorme interesse, sobretudo aqueles que misturam comédia da vida privada, Instagran, Tik Tok ali à nossa frente, ao vivo, vivíssimo, em cores, com todas as cores. A peça “Piano Bar” é daquelas pequenas joias que o teatro nos premia de vez em quando. Um sabadão, um casal batendo DR em um bar, com a trilha sonora provocando todas as situações: ódio, amor, separação, volta, ressentimentos do passado, grandes e doces lembranças.
O primeiro acerto é usar a técnica site specific, aquela em que as obras são criadas de acordo com o ambiente e um espaço determinado; assim, a plateia fica totalmente livre para bisbilhotar o que se passa sem nenhum pudor. Daí a tessitura do texto utilizar, de forma muito natural, as limitações das três regras do teatro clássico — um só cenário, tempo real e verossimilhança — para apresentar o jantar de Regina (Stela Celano) e Marcelo (Leandro d’Melo).
O texto de João Batista, dramaturgo, professor e fundador da Companhia Dramática de Comédia, é uma cornucópia de diálogos rápidos, curtos, sem alongamento com forte significado, pois tem o eco daquelas situações pelas quais passamos, em algum momento de nossa vida. A gargalhada vem fácil porque é o eco do famoso bordão “um dia vamos rir disso tudo” e também de nos rever, de forma especular, em todo o ridículo da vida, como já dizia o poeta.
A direção da premiada diretora, coreógrafa e professora Sueli Guerra, apesar do espaço diminuto, consegue uma movimentação muito natural, pois, inteligente e hábil, se afasta de qualquer hipótese de falseamento. O grande prazer, a cereja do bolo, é a presença e interpretação de ator e cantor Greg Young, músico exímio com ótima atuação.
As delícias mineiras (por exemplo, o café coado) nos levam de volta a uma situação que nos impele a satisfazer nossa curiosidade. “Piano Bar” é uma daquelas peças que confirmam a máxima freudiana: quando José fala de João, José está falando de José. Regina e Marcelo não falam de Regina e Marcelo. Com risadas e sorrisos, falam de nossos impasses.
Serviço:
Café Arte Manuedu, em Botafogo (Rua Dezenove de Fevereiro, 17)
Quartas e quintas, às 20h30