José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, nome grandioso da televisão brasileira, lança “Lado B de Boni” (Editora BestSeller), sua autobiografia, dia 6 de agosto, na Travessa do Shopping Leblon. Filas e filas, seguramente, mas nada daquelas sessões de autógrafos com eventuais tacinhas de vinho morno, de jeito nenhum! Noite de farturas: muita alegria, muita gente conhecida, muito champagne para brindar as histórias da TV por ele contadas, já que sua vida e da televisão, em muitas fases, se confundem e viram uma coisa só, desde que Boni começou a trabalhar na televisão, em 1953, como redator na TV Tupi, depois TV Rio e TV Excelsior, até chegar à Globo, em 1967, ali fazendo história, sem deixar nada pra trás. E, claro, o que ficou no seu coração. É uma trajetória!
Enquanto isso, leia sua entrevista:
UMA LOUCURA: A maior loucura foi não ter feito loucuras. Meu pai morreu com 33 anos, quando eu tinha 7. Meu tio Reynaldo, pai do Roberto Buzzoni, era metódico e um planejador por excelência, Desde cedo, aprendi a não tomar decisões sem pensar nas consequências — como é sabido, a aventura pode ser louca, mas o aventureiro, não; sempre fui aventureiro, às vezes, louco, mas sem chegar a fazer loucuras.
UMA ROUBADA: As roubadas sempre serviram de experiência; entrei em várias. Ter endossado a novela “Espelho Mágico” (1977, a primeira novela de Vera Fischer e Tony Ramos na Globo), ter deixado fazer a série “Contos de Terror”, ter pensado em usar a TV Manchete para comprar os direitos do carnaval de 1983, confiando na palavra deles de que nos repassariam o controle (Boni combinou com Moisés Weltman, diretor de programação da TV Manchete, que ele compraria os direitos da transmissão do carnaval sozinho e depois repassaria parte para a Globo, o que nunca aconteceu, dando à emissora de Adolpho Bloch o primeiro lugar no Ibope); ter concordado com a mudança dos transmissores da Globo em São Paulo para o pico do Jaraguá (bairro da região noroeste), e ter que voltar correndo para a Avenida Paulista.
UMA IDEIA FIXA: A busca do novo: querer consertar o mundo, trazer cultura de fora para a televisão, aproveitar a literatura brasileira e internacional. E a ideia fixa de dar uma televisão moderna, de qualidade, onde pontificasse o conteúdo, seja no entretenimento, seja no jornalismo, seja na cultura.
UM PORRE: Estar sóbrio e aguentar gente de porre. Eu não bebo uísque, vodka e destilados em geral; tomo vinho moderadamente, às refeições. Se passo da conta, vou rapidinho dormir para não encher o saco dos outros. Sabendo apreciar um bom vinho e beber com cuidado é divino, mas tem gente que não sabe beber, bebe muito ou fica de porre facilmente. Essa gente deveria, como dizia o Bento de Almeida Prado, beber no quinto dos infernos.
UMA FRUSTRAÇÃO: Dezenas. As frustrações estimulam o desejo de vencer. Ter coragem de apostar em coisas que rompem a tradição e vencer a resistência dos conservadores é sempre um risco de cair em frustração. Mas, se dá certo, é um prazer inigualável. Na publicidade, na televisão e na vida, a gente não pode temer a frustração.
UM APAGÃO: Trocar nomes dos amigos que não vejo frequentemente. Já passei vários dias chamando meu personal trainer de Benedito, e o nome dele era Sebastião. Pior é que trabalhamos juntos há muito tempo, eu sabia o nome correto. Mas ainda bem que isso ocorre raramente. De qualquer forma, todos nós temos lapsos de memória mesmo quando muito jovens.
UMA SÍNDROME: Síndrome de pânico. Tive um acidente aos 15 anos e fiquei engessado praticamente de corpo inteiro, uma técnica da ortopedia do passado. Se me seguram forte ou imobilizam, ou mesmo que eu me sinta preso, entro em pânico; não com crise descontrolada, mas como uma reação absolutamente não racional.
UM MEDO: Medo de incêndio. Acompanhei aquele incêndio terrível no circo, em Niterói (Gran Circus Norte-americano, em 1961, deixando 503 pessoas mortas e mais de 800 feridos), quando Ivo Pitanguy saiu correndo para atender crianças e velhos queimados. Nos incêndios do edifício Andraus, na Praça Júlio Mesquita (SP, em 1972, com 16 mortes e 345 feridos), e do edifício Joelma, no Vale do Anhangabaú, no Centro (em 1974, com 187 mortos e mais de 300 feridos). O Armando Nogueira (1927-2010, um dos pioneiros do telejornalismo, com quem Boni trabalhou) me avisou e me chamou para acompanhar tudo da sala de controle. Foi um pesadelo. Estava numa discoteca em Ibiza quando o fogo começou. Ainda bem que foi rapidamente controlado. Já presenciei quatro ou cinco alarmes de incêndio em hotéis. Acompanhei chocado e com apreensão e sofrimento os incêndios da Globo em São Paulo (1969) e Rio (1976, no Jardim Botânico). Não tenho medo de incêndio, tenho pavor.
UM DEFEITO: Buscar obsessivamente a perfeição. Tudo pode ser melhor. Sou assim no trabalho, em casa e até na diversão. Como gosto de cozinhar e comer, pesquiso meticulosamente todos os restaurantes do mundo. Já fiz, com o Ricardo Amaral (ex-empresário da noite), o”Guia dos Guias Ricardo Amaral e Boni” e o “Guia Boni e Amaral o Rio é uma Festa!”. Apesar de fazer 90 anos no ano que vem, continuo lendo e estudando comunicação, tecnologia, e sou curioso e atento ao que acontece também na Medicina.
UM DESPRAZER: Gente pretensiosa, gente mentirosa, gente que não sabe ouvir. Tenho implicância com atrasos em reuniões. Tenho horror de ficar em salas de espera. Não gosto que amigos e convidados atrasem em restaurantes. Não tenho paciência com quem despreza o tempo e não cumpre compromissos.
UM INSUCESSO: Sem fracassos não há sucesso. O importante é ter mais acertos do que erros. Eu prefiro comemorar os êxitos, mas é importante discutir em detalhes todos os fracassos. Gosto da invenção e da criação, mas com os pés no chão, respeitando as regras básicas. Assim, a gente transforma insucessos em aprendizado.
UM IMPULSO: Comprar coisas duplicadas: roupas, remédios, comida. Compro tudo de dois; acho que quem tem um, não tem nenhum. Não sou comprador compulsivo, mas uma camisa que seja, compro duas iguais, da mesma cor e mesmo modelo — vai que cai uma gordura, que mancha, que desbota ou que some na tinturaria. Ter sempre duas coisas iguais é impulso. Criar, planejar e construir é racional.
UMA PARANOIA: Ter que acertar sempre. Sofrer antes de cada estreia de novela, show ou jornalismo; até de uma nova peça de promoção, ou mesmo de uma simples comida que eu mesmo vou preparar. Acertar é mais que ansiedade, é uma paranoia.