Antonio Neves da Rocha diz que a covid acabou com a sua memória. Há quem discorde: o raciocínio do maior decorador de festas do Rio continua apimentado, fazendo par com seu talento e língua afiada. Antonio, de família tradicional carioca, entrou nesse mercado por acaso: aos 22 anos (hoje tem 62), decorou a casa da amiga Maria Helena Chermont de Britto e recebeu elogios sobre elogios. Até ali, trabalhava na sua fazenda, em Cordeiro: “Fui largando tudo e me dedicando”, diz ele, que demonstra muito prazer com esse trabalho, o que talvez tenha influenciado no seu sucesso por conta própria, digamos assim. O autor dos livros “As cores da festa” e “À mesa, com elegância” começou só no Rio, seu principal mercado, mas chegou a outros estados e a alguns lugares da Europa.
De acordo com a Associação Brasileira de Promotores de Eventos (Abrape), 97% do setor – que inclui shows, congressos, festas, eventos sociais, corporativos, culturais, esportivos, dentre outros – interromperam suas atividades em 2020, demitindo mais ou menos 450 mil pessoas no Brasil, ano em que 79% dos eventos foram adiados, e muitos só voltaram ano passado. Agora, porém, a tendência é de cada vez mais crescimento. O Brasil chegou a ter mais de 585 mil celebrações em 2022, alta de 30% sobre 2019, segundo dados da plataforma Casar.com.
É preciso considerar que a maioria dos clientes de Antonio não faz parte de estatísticas, se é que você me entende. Neves da Rocha costuma fazer festas beneficentes, sem ganhar um tostão. Não sendo o caso, comenta-se que sabe cobrar muito bem: para uma festa daquelas, daquelas e daquelas mesmo, seu cachê chega a…. ele não fala nem morto, a não ser com os envolvidos. Evita, de toda maneira, falar publicamente sobre valores.
E agora, a quantas anda tudo?
Como se deu a volta do mercado de festas da pandemia pra cá? Tivemos fases de adaptações…
Pra mim, voltou com força, com algumas diferenças do passado. Centrando o pensamento mais no belo do que nas obrigações, estão respeitando mais.
Como anda a sua agenda?
No tamanho que eu sempre quis, cheia, sem atropelos – tentando ter uma vida mais normal. Excesso de trabalho muitas vezes pode levar ao erro; outras fases, como ter quatro festas no mesmo dia, não quero mais. Gosto de estar na festa que faço, ver o desenrolar da história, mas, se são muitas numa mesma noite, não tenho essa possibilidade.
Qual a diferença imediata que você notou da volta gradual à total? Lembro que nos falamos, e você disse que as pessoas estavam mais contidas, mais conscientes. Parece que, em todos os setores de eventos hoje, isso ficou pra trás. Estamos notando uma volta de grandes festas, grandes gastos… É isso?
As pessoas já estão se distanciando aos poucos dessa fase mais contida, no entanto, nem por isso entrando numa fase inconsequente.
Você defende o “apoteótico, sim, sem tirar o pé no chão”?
Não defendo o apoteótico: defendo a beleza, o equilíbrio e a criatividade.
Fala de ostentação e sofisticação sob seu olhar?
Quem vai defender ostentação? Gastar não é uma qualidade, sofisticação é obrigação. O belo e o sofisticado não têm custo; é mais fácil errar com sobra de dinheiro do que com pouco. Desde quando ser rico é qualidade?
Além das lembranças maravilhosas e da ressaca, o que fica dessas festas incríveis, como aconteceu recentemente no casamento de Cissa Geyer e Bruno Maia?
Além das contas, fica a certeza de que momentos de felicidade são para sempre. E, ainda, que o dinheiro foi gasto ajudando a muitas pessoas, de alguma maneira. Uma festa grandiosa pode empregar em média 400 pessoas: garçons, cozinheiros, barmans, seguranças, manobristas, técnicos de som, estofadores, DJs, instaladores de lustres, maquiadores, cabeleireiros, costureiros, arrumadeiras de banheiro, fotógrafos,
O gasto médio para uma festa de casamento subiu junto com a inflação. Como faz pra ajustar valores, para quem se preocupa com isso, claro? Existe o famoso “jeitinho” para manter os planos?
Claro que existe, sempre há um jeitinho. Caro é relativo. Não são as coisas que são caras, são as escolhas. Por exemplo, se você pedir uma massinha, é um valor, mas uma massinha com trufas brancas do Piemonte, já muda. Mas já falei pra você: quando pedem quero-que-as-pessoas-caiam-
Atualmente, muitos casamentos estão mais modernos, usando drones para fotografar a cerimônia e até ferramentas digitais para ajudar nas tarefas de planejamento. Algumas pessoas já estão até usando software de inteligência artificial (IA) para escrever seus votos ou discursos de casamento com base no ChatGPT. O que acha disso?
Não tenho nada contra. Se você gosta, usa com parcimônia, mas nada pode chamar mais atenção do que a noiva; não pode passar disso. Evolução sempre. Pra mim, casamento moderno mesmo é fazer as malas e ir viajar.
Qual foi o pedido mais extravagante que você teve que atender de toda sua carreira? Já recusou algum casamento? Por quê?
Lido bem com pedidos exóticos – desde entrar com o cachorro (já comum) até altar na beira d’água e a maré levar. Ter de refazer, a maré levar de novo, e tudo refeito. Os mais exóticos mesmo não posso falar (rsrsrsrs)!
Você já recusou algum pedido?
Nunca recusei. Já tive vontade, não tive coragem, sou supersticioso (acho que não traria boa sorte). Como diz o Jorge Paulo Lemann, sou muito otimista e, se existem bem-sucedidos pessimistas, desconheço.