A expressão ”aquecendo os tamborins” nunca teve tanto sentido como neste carnaval pós-pandemia. Pode não ser o carnaval de todos os tempos, mas as expectativas são nucleares, a medir pelos ensaios técnicos na Sapucaí, com as arquibancadas sempre lotadas, além das quadras abarrotadas, mil feijoadas, animação estampada e alguns nomes que se destacaram e viralizaram nas redes sociais.
Uma delas foi Mayara Lima, princesa de bateria do Paraíso do Tuiuti; a outra, Belinha Delfim, musa da Viradouro. “Isso sempre existiu. Cansei de participar de concursos de escolha de rainhas, isso quando acontecia muito nas comunidades”, diz Carlinhos de Jesus sobre esse “boom” de passistas, sejam elas musas, rainhas ou princesas.
Este ano, o bailarino, jurado do quadro “Dança dos Famosos”, no “Domingão”, da TV Globo, estreia como coreógrafo da comissão de frente da escola de samba Barroca Zona Sul, em São Paulo, no dia 26 de abril, no sambódromo do Anhembi. O enredo é uma homenagem a Zé Pelintra, uma das mais importantes entidades de cultos afro-brasileiros e uma espécie de “malandro”, principalmente associado ao carioca (o prefeito Eduardo Paes adora). Carlinhos é um veterano do carnaval e já foi coreógrafo da Mangueira, Beija-Flor, Império Serrano e Unidos de Vila Isabel.
No fim de março, Mayara Lima, 24 anos, viralizou nas redes, com sua “sincronia de milhões” com a bateria da sua escola. Desde os 14 anos, ela samba na comunidade (antes, passou pelo Salgueiro). No carnaval das redes, até o início do ano, Mayara tinha 60 mil seguidores e agora tem quase 600 mil. Deu entrevistas, tirou fotos e é reconhecida nas ruas.
Belinha, também de 24 anos, parou tudo no mundo virtual no último domingo (10/04), com um vídeo em que o carisma, beleza e samba no pé condizem muito bem com trecho do samba-enredo da sua escola: “Não há tristeza que possa suportar tanta alegria!” Belinha fez balé por 15 anos, é professora de samba e fundadora do Delfim Atelier, onde cria e confecciona roupas e fantasias. Ela começou no samba em 2014 e, cinco anos depois, foi premiada pelo Estandarte de Ouro como a melhor passista.
Conversamos com Carlinhos sobre essa explosão pré-carnavalesca nas redes.
Essa visibilidade para as passistas, musas, rainhas é novidade?
Sempre existiu. Cansei de participar de concursos de escolha de rainha de escolas como jurado, quando era um acontecimento nas comunidades, e realmente sempre valorizei muito a coisa da menina da comunidade, porque o sonho delas não é dançar a valsa dos 15 anos, mas tornarem-se as rainhas das suas comunidades.
O que acha dessa comercialização de postos nas escolas de samba?
Não sou nada contra as famosas, as artistas que participam do carnaval e são rainhas. Isso é uma grande ação que já acontece para chamar atenção para as escolas, que depois virou comercialização. A escola precisa desse investimento, mas, com isso, poucas escolas mantêm suas rainhas.
As redes sociais ajudaram nessa exposição das passistas?
Hoje, as redes sociais evidenciam muito o cotidiano, tornando mais fácil captar essas imagens e ficando mais visível alcançando mais pessoas. Isso não surgiu agora, porque temos vários talentos ao longo do tempo. Dei aula para a Luma de Oliveira e Quitéria Chagas; elas já tinham essa energia e esses movimentos de corpo evidenciados, só que não existia um celular em cada canto. Preciso citar ainda Viviane Araújo (rainha do Salgueiro, que vai desfilar grávida este ano), com o movimento, o entrosamento com os ritmistas; a Evelyn Bastos (rainha da Mangueira) reinando na bateria…. Elas brincam com as convenções que a bateria faz.
E sobre essa evidência da Mayara e Belinha?
Vê-las sambando me dá uma alegria muito grande. É impressionante como a Mayara estuda as convenções e faz de uma forma tão natural, tão soberba, no sentido de ter certeza do que está fazendo, que é impressionante. A Belinha dá show, e a gente percebe que é natural, que alguém veio, filmou e bombou pelo mundo inteiro, mas é com a maior naturalidade, maestria, elegância, com postura correta, que é o verdadeiro papel de uma passista, de uma grande rainha.
Quais suas expectativas para o carnaval?
Será um dos maiores carnavais que já tivemos, da resiliência, da resistência, da retomada, da alegria de voltar a pular, a gritar, a sambar e defender as escolas. Tenho certeza que os desfiles vão surpreender. É chato porque o carnaval fora de época é o mesmo que chupar bala com papel: a gente não sente o sabor, mas a energia do povo brasileiro é muito forte, e essa espera para desfilar vai compensar. Acredito que vai ser um carnaval de novidades, de muito mais alegria que em outros anos, de grito de liberdade.
E a estreia em SP?
Estou muito feliz porque fui muito bem recebido pela verde e rosa paulistana, afiliada da Mangueira. A expectativa deles é muito grande, mas já coloquei os pés deles no chão. Procurei tirar a expectativa porque fico com um peso muito grande, mas tenho estado sempre na escola, com um assistente dando continuidade aos ensaios. Estou bem tranquilo e confiante.
Por Dani Barbi