O pediatra Daniel Becker é autor do texto que viralizou com a mesma força da Ômicron, mal comparando. Procurado, o médico fala da surpresa e do seu sentimento com a repercussão.
“Escrevi um texto para as famílias que atendo no consultório, com o objetivo de facilitar o entendimento da nova fase da pandemia e passar orientações simples de como cuidar das crianças nos primeiros momentos do adoecimento e também de como se conduzir quanto a testes de isolamento. O texto foi motivo para outras pessoas fazerem com que ele circulasse, de forma impressionante, em grupos de WhatsApp. Fiquei muito surpreso e feliz com a repercussão, especialmente com a possibilidade de ter escrito uma série de orientações que têm sido útil a muita gente. E, também, impressionado porque o teor é bastante fácil, sem maiores novidades. Acho que, pela confusão instaurada com a pandemia e as múltiplas polaridades que se criaram em torno de questões sanitárias, que deveriam ser conduzidas pela ciência, as pessoas ficaram muito confusas. Por isso, um texto objetivo e simples, passando pelas questões que mais as afligem, fez tanto sucesso. Eu, claro, fiquei muito feliz em poder ser útil. Aqui, na íntegra:
Preciso passar algumas orientações gerais para vocês. A Ômicron chegou, e os casos estão explodindo – vocês já devem ter percebido. Como andam dizendo, ‘se você não tem um amigo com covid neste momento, você não tem amigos’.
A onda será fortíssima, com muitos e muitos casos, mas a grande maioria, com pouca gravidade — ao menos para os vacinados. Isso se confirma a cada dia, pois a variante invade menos os pulmões.
Todo dia, chegam dezenas de mensagens idênticas no WhatsApp; daqui a pouco, não vou dar conta de responder a todos, é humanamente impossível. As dúvidas são muito parecidas. Vou passar orientações gerais (se quiserem, distribuam pelos grupos de escola etc.) para que saibam como agir. Estou disponível para casos específicos ou mais sérios, claro. Contudo, acho que, com o que vou escrever, a maioria das dúvidas será sanada.
Para qualquer pessoa — criança ou adulto — com quadro febril, gripal (incluindo dor de garganta e cefaleia) ou gastrointestinal (vômitos, diarréia), é preciso ficar em casa e testar: pode ser PCR ou antígeno, já no 2º dia de sintomas. Se um adulto sintomático testar positivo e houver crianças com sintomas em casa, elas podem ser consideradas positivas por suposição.
Os protocolos estão mudando: para pessoas com testes positivos, esperem 7 dias em casa a partir do 1º sintoma, e podem sair se totalmente assintomáticos, com uso estrito de máscara pff2 por mais 3 dias.
Para contactantes (quem teve contato com alguém que testou positivo), esperar 5 dias a partir do último contato, testar e, se negativo, sair de casa no 7º dia, de preferência, sempre com máscara. Se positivo, segue o protocolo acima.
Máscaras pff2 em lugares fechados são muito importantes neste momento de altíssima transmissão.
Para crianças, vale o mesmo; dificilmente alguma fará um caso mais grave. Crianças de menos de 1 ano merecem observação mais atenta. O critério principal segue sendo o estado geral: se está comendo, brincando, sorrindo, quando sem febre, podem seguir tratando em casa.
O tratamento, a maioria de vocês já conhece bem: podem usar aquelas gotinhas fitoterápicas, muito soro nasal em spray, lavagem nasal com soro morno se a secreção ficar mais espessa ou nariz entupido, nebulização com soro, muito líquido (importantíssimo), frutas, comer o que conseguir, evitar biscoitos e outros ultraprocessados. Só precisa tratar a febre se acima de 38.5, se a criança estiver caída, incomodada, chorosa, com alguma dor. Usem Paracetamol ou Dipirona de preferência. Atenção: a dose não é uma gota por kg, especialmente nos mais velhos. Novalgina dose de 6 a 8 gotas por kg, dose máxima de 20-25 gotas. Tylenol 8 gotas por kg. Banho morno ajuda a abaixar a febre e se sentir melhor. Nunca gelado.
Os quadros gripais devem ser leves a moderados e melhorar com 3 a 5 dias. Se a febre persistir ao 4º/5º dia e o estado geral for ruim, se houver piora progressiva ou alterações respiratórias, ou qualquer sinal mais alarmante, a criança deve ser examinada. Entrem em contato comigo ou levem à emergência. Melhores na Zona Sul: Pró Criança e Copa D’Or. Barra: Vitória e Barra D’Or. Tijuca e Zona Norte: Quinta D’Or.
Vacinem seus filhos. Os antivacinas estão ferozes e espalhando muitas mentiras, é impressionante. Não existe segurança absoluta em nenhum produto, mas o risco das vacinas é muito menor que o da doença. A ciência é assertiva em demonstrar isso.
Por favor, não me peçam para fazer “fact checking” de vídeos e “fake news” – cada um pode fazer o seu. Não é possível sobreviver a centenas de demandas individuais desse tipo. De novo: estou disponível sempre que houver preocupação e angústia. Na dúvida, façam contato.
Cuidem-se, tomem a dose de reforço, usem boas máscaras. Pode ser nossa última onda. Assim espero.”
Daniel Becker é pediatra formado e com residência pela UFRJ, mestre em saúde coletiva pela ENSP-FIOCRUZ. Tem grande experiência no Brasil e no exterior como colaborador da OMS e diversas fundações e empresas. Foi pediatra da organização Médicos Sem Fronteira em campos de refugiados na Ásia. Trabalhou por 20 anos com saúde em comunidades populares com o Centro de Promoção da Saúde (Cedaps). É membro do Comitê de Especialistas para Enfrentamento da Covid da Prefeitura do Rio e do Departamento de Pediatria Ambulatorial da SOPERJ. Escreve no perfil: pediatriaintegralbr