Mulheres conversam aos jorros. Não escondem os sentimentos, revelam-se, desvelam. Choram, riem. Trocam, divergem, convergem. Contudo, na verdade, todas as Penélopes são tecedeiras confessionais. É, na capacidade de se expor, de se mostrar, que vem essa capacidade de amar, de se comprometer. A partir de um fato real, é que três mulheres constroem uma dramaturgia em “A Partida”.
A peça tem todos os ingredientes do que convencionamos chamar de teatro. Com idealização de Denise Stutz, a peça tem dramaturgia de Inez Viana e direção de Débora Lamm. Juntas em cena, Denise e Inez – amigas e parceiras de muitos projetos teatrais – vivem artistas que vão criar uma peça, inspiradas em uma carta nunca enviada: a mãe de uma delas, após assistir a ”O Partido”, resolve romper com o par 30 anos mais novo.
Na versão online, as atrizes, sentadas em uma plateia, com foco apenas nas atrizes em plano total, começam a falar de como será a peça que estão montando. Metalinguagem baseada em inversão, atrizes ocupando o lugar dos espectadores vão desfiando o que vai acontecer, funcionando como as notas rubricas que acompanham os textos para orientar direção e atores. Na versão presencial, projetam e vão conversando e estimulando a plateia. O recurso torna a metalinguagem ainda mais interessante.
Joga-se com um possível realismo que está na interpretação, pois conversam com toda naturalidade e intimidade — clima que é reforçado pelo figurino totalmente despojado e cotidiano. E falam da carta, de como serão as cenas, apontam sentimentos, descrevem o que vai ser com o poder da voz e do texto para desenhar um real que está ausente. Como ausente, estão todos, e só as duas estão presentes, preenchendo os espaços de um teatro: plateia e palco ao mesmo tempo.
Aos poucos, percebe-se que não se fala de um texto específico. Há o debruçar sobre os fatos de 99, o último ano de um século trepidante, no qual vida e morte foram absolutos como condutores dos extremos das vidas. Um futuro que não se sabe do qual se imagina que nem acontecerá. É o limiar do que vai acontecer, de se acabar uma relação, da mudança de milênio e de uma peça a ser criada/montada que se faz “A Partida”, tal qual acontece conosco todas as manhãs. Partiu geral.
Serviço:
Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto (Rua Humaitá, 163)
De sexta a domingo, às 19h.