Ao se ler rapidamente a expressão “a cerca”, pode-se pensar que estamos falando sobre um assunto. Isso seria ótimo. Porém, quando vemos que se trata do substantivo, estamos vendo outras possibilidades. Pular a cerca é falar de traição. Estar ombreando a cerca, pode-se pensar em alguém que vai conseguir sair. A peça “A Cerca” fala de todos esses significados. E vai além: fala da dor do confinamento, da repressão.
De forma alegórica, vemos um casal, com figurinos e adereços de Flávio Souza e Derô Martin, que já indicam, de forma poética, a condição apátrida e atemporal dos personagens. Graft (Vania Santos) e Karls (Marcelo Viégas) estão felizes, ganharam um espaço, conseguiram ver coroados os seus esforços. Mas coloca-se uma cerca, sem explicação e sem diálogo — com isso, perdem o jardim onde iam exercer a felicidade.
O cenário de Derô Martin ganha força na bela projeção e luz do videomaker Paulo China e na luz de Paulo Cesar Medeiros, ao mostra o conflito principal com imagens. O belo jardim é o sonho, o objetivo, o que se quer conquistar. A parede é a tristeza, o impedimento, a perda. Nesse ritmo, também está a interpretação de Vânia e Marcelo, cuja direção de Lino Rocca, também autor, mostra como os sentimentos do homem e da mulher comuns acabam por ser abafados por forças que os reprimem, mas não explicam. Não há excesso de dramaticidade, exageros, o que é um acerto.
Vânia e Marcelo mostram o dia a dia de um casal que passa por todas as perdas. De forma sutil, mas ao mesmo tempo brutal, vai vivendo a sua história. A cada ganho, a cerca o faz perder tudo aquilo que conquistam. Não perdem a dignidade nem a força de viver. No cenário, as duas malas antigas são armários, bancos. Mas as malas são limites, objetos no qual se colocam prioridades, mas que também impedem de se levar tudo o que se quer, assim como uma cerca. Chegam com as malas e os sonhos. Partem com as malas repletas de coragem e da força dos vitoriosos.
Fotos: Guga Melgar
Serviço:
Teatro Gláucio Gil (Praça Cardeal Arcoverde, s/n, Copacabana)
Sexta, sábado e domingo, às 18h.
Informações no (21) 2332-7904.