O mercado da arte está sendo tão afetado pela pandemia? A experiência física está suspensa por enquanto; para muitos, esse consumo está vinculado à vivência — consideram a visão, o olfato, a audição e, por vezes, o tato. Resumindo, trata-se de uma experiência particular, anulada com a quarentena, que fechou museus e galerias. Já outros, adoram essas atividades virtuais, o que algumas galerias já vinham fazendo e só aceleraram o processo com a chegada da Covid-19. Não só esses espaços tiveram que mudar o olhar, como também os consumidores. Apesar de não substituírem a experiência da visitação física, as alternativas online têm, sim, diversas vantagens, como uma maior democratização das mostras. Perguntamos a cinco galeristas a quantas anda esse mercado e para onde a arte está indo na pós-pandemia.
Anita Schwartz, da galeria com seu nome, na Gávea, no mercado há 22 anos: “Não acho que a pandemia tenha afetado tanto o mercado. O que está mudando é o meio de chegar ao cliente. Num primeiro momento, foi um choque brutal; agora, estamos nos adaptando, reaprendendo novas fórmulas, nos reorganizando. Sei que, quando eu reabrir a porta, não vai ser um grande ‘uau’, porque tudo é fruto da economia. Mas, sabendo que, neste momento, não existe algo assim com rendimentos tão interessantes, é preciso considerar que uma obra de arte é um valor adquirido. É uma possibilidade de investimento: quem tem dinheiro vai negociar obras. A arte é um bem, vai voltar, se Deus quiser, de outra forma, mas vai, e eu estou tentando aprender”.
Ludwig Danielian, da Galeria Danielian, na Gávea (inaugurada por ele e o irmão, Luiz Danielian, em setembro do ano passado): “Acho que a pandemia foi um período para todos repensarmos – as relações, as direções e os objetivos. Acho que a arte também vai passar por isso, questionar-se e encontrar novos meios. Sempre que tivemos grandes incidentes mundiais, tivemos também grandes mudanças nas artes; vimos isso com movimentos vanguardistas dos pós-guerras. Prever o que pode acontecer é totalmente leviano. O que podemos esperar é que esse tempo possa ser também refletido nas artes plásticas, talvez com o surgimento de novos artistas, o uso de mídias alternativas e a democratização da arte com o uso de ferramentas para exposições em realidade aumentada e 3D”.
Marcia Barrozo do Amaral, da galeria homônima, no Cassino Atlântico, em Copa, com 44 anos de mercado: “Detesto a expressão ‘vamos ter que nos reinventar’, mas acho que terei que usá-la. Em vez de o artista mostrar sua arte numa galeria, feliz em ser reconhecido e estar rodeado de amigos, tem que mostrá-lo num arquivo em jpg. Triste! Compras online, que coisa mais fria! Sou das antigas: gosto de ter gente na galeria, curtindo os trabalhos expostos, perguntando detalhes técnicos e, por que não, barganhando o preço das obras. Se eu tiver que me reinventar, vou sentir falta de tudo isso”.
Ricardo Rego, da Lurixs: Arte Contemporânea, no Leblon, há 14 anos no mercado: “A pandemia afetou o mercado de arte, claro; as feiras, por exemplo, foram canceladas. Mas, com as pessoas mais em casa, as que têm uma situação mais confortável começaram a pesquisar, querer comprar – olha aqui, olha ali, descobre a necessidade de uma escultura. Para o pós, eu estou positivo. Acho que a recuperação econômica já está acontecendo; a bolsa, por exemplo, voltou antes do que se imaginava e já percebo até um clima de otimismo, de alívio. Acho também que, passado isso tudo, as pessoas vão voltar mais para dentro de casa, as viagens desenfreadas devem diminuir, muita gente deve ficar mais por perto. E isso pode significar querer uma obra de arte numa casa de fim de semana. Em momentos como este, o mercado de arte é um porto seguro. Pode até, momentaneamente, sofrer uma falta de liquidez, mas está ali na parede, tem uma representatividade, é uma reserva de valor, está ao alcance do olho. Perceber o crescimento do artista é muito sedutor – tem esse plus como um ativo financeiro”.
Simone Cadinelli, da Simone Cadinelli Arte Contemporânea, fundada em 2018, em Ipanema: “Quando a pandemia começou, interrompemos a exposição ‘A vulnerabilidade da solidez’, da artista Isabela Sá Roriz, e todos foram afetados. A palavra surpreendidos passou a fazer parte do cotidiano. Decidimos continuar aproximando o público dos artistas, usando as redes sociais, e convidamos artistas, curadores e amigos para darem dicas culturais e de arte. Durante a pandemia, lançamos três edições de uma ‘Seleção especial de obras de arte’, e os artistas estão produzindo vídeos para a série ‘Por Dentro do Ateliê’, no YouTube. Isso supriu, de certa forma, o cronograma das exposições, como no caso da mostra de Jeane Terra, prevista para março, com curadoria de Agnaldo Farias, adiada para 2021. Espero que o sistema de arte intensifique o mercado online, pois as experiências coletivas estão canceladas, e os meios digitais são um novo portal de sobrevivência, tanto para a relação com o tempo quanto para a possibilidade de se conectar próximo do outro. Estamos nos adaptando e planejando novos formatos de exposições e suportes artísticos. Em breve, vamos lançar, num espaço na galeria física e no site, um novo projeto com mais ou menos de 30 artistas de diversos estados do Brasil”.