Eu gostaria de começar dizendo que o mais importante neste momento é o pós-pandemia. Por quê? Porque o pós-pandemia vai mostrar, espero, um planeta diferente, onde a desigualdade possa diminuir. Em outras palavras, eu acredito na palavra esperança. Esperança que esta pandemia — que aflorou a solidariedade de todo ser humano que tem amor ao próximo —, com o coronavírus, veio para mudar a mentalidade, talvez, dos nossos dirigentes e a nossa sociedade. Durante esse período, evidentemente, sofri muito, pensando naqueles que perderam seus entes queridos. Eles realmente merecem toda a solidariedade, minha e de qualquer ser humano que usa a palavra reflexão durante sua vida.
Nesse período, tive a vantagem, como músico, de poder aprimorar meu ofício, desta vez não tanto na regência, mas, graças a essas luvas extensoras, depois de 22 anos, estou colocando os dez dedos no teclado. Não estou dizendo que vou ser o pianista de antigamente, mas o simples prazer de estar ao lado do meu velho companheiro, podendo tocar algumas peças que realmente enchem o meu coração e a minha alma, está fazendo com que, durante este isolamento, os dias não sejam longos, mas sim curtos, porque fico debruçado cerca de sete horas no teclado do piano aqui de casa.
Quando qualquer pessoa olhar para o celular que eu uso vai imediatamente perceber que eu não tenho nada a ver com tecnologia. E essa é a razão de, depois de tanto tempo, o ator Alexandre Nero, depois do filme “João, o Maestro”, ter-me dito: “João, eu vejo suas mensagens no Insta e são ridículas”. Eu falei “mas o eu quer dizer Insta?”. Ele: “Instagram”. E eu, novamente: “o que quer dizer Instagram?”. Ele explicou que era a rede social. “Começa a colocar, a cada três dias, um vídeo de algum lugar no mundo onde você tocou e, certamente, você poderá fazer com que pessoas jovens tenham conhecimento do que significou a sua carreira como pianista no passado”, sugeriu. E eu, finalmente, caí na rede.
Sinto um prazer enorme de rever coisas minhas em vários países e, ao mesmo tempo, procurar, através do Instagram, ajudar a democratizar a música clássica, com informações. Não tem nada eu falando; é sempre através de música e texto, mas é uma oportunidade que eu encontrei perto dos 80 anos. Como sempre dizia o Gilberto Dimenstein, “o contrário da vida não é a morte, é a repetição, o importante é a inovação”. Não sou eu que manipulo, evidentemente, pois não tenho conhecimento, mas quem diria que este velho maestro agora tem um prazer enorme com a oportunidade de divulgar o que fez no passado e o que pretende no futuro, através da música.
Finalmente, como eu acredito na trajetória da esperança, completo 80 anos no dia 25 de junho e, nesta data, pretendo anunciar os meus planos para os próximos 20 anos; ou seja, como eu sempre digo, a música venceu! E eu não perco jamais a esperança, que era a esperança de Villa-Lobos, de fechar o Brasil em forma de coração através da música. Quem sou eu perto dele; só que na época de Villa-Lobos não tinha nem Internet, nem tevê. Então, pela exposição na mídia, estou levando este meu projeto há alguns anos, e já está tendo um resultado incrível. É um projeto muito mais baseado em idealismo do que em qualquer tipo de interesse financeiro, e está ganhando estado por estado, desde o Rio Grande do Sul até Roraima. E agora chegou a hora. Minha carreira como pianista foi muito gratificante e, como maestro, continua sendo maravilhosa, mas chegou a hora de tentar deixar um legado. Se vou conseguir, não sei, mas que vou tentar, vou. Essa é minha visão para os próximos anos.
João Carlos Martins é maestro (e, novamente, pianista) reconhecido e admirado no mundo inteiro. Vai comemorar seu aniversário de 80 anos no dia 25 de junho, em uma live em seus canais na Internet. Para a nossa sorte, está sempre aqui na coluna. (Foto: Alê Catan)