O pior dos vilões de Shakespeare, no campo de batalha, é um guerreiro brutal, com certeza; esse é o trabalho dele. Fora isso, ele é um amor, decente, engraçado, humilde, um cara papo reto, amado por seu rei e companheiros. A opção de Xando Graça, ao fazer do drama uma apresentação condensada, não é levar ao palco os melhores momentos. De forma competente, a sua seleção recai sobre os episódios que apontam e reforçam o caráter dúbio do herói. Mais do que isso, de uma forma que Macbeth se divide entre o nobre e seu melhor alterego, a malévola Lady Macbeth.
“Macbeth”, a excelente performance no Castelinho do Flamengo, dirigida por Adriana Maia, é a perfeita e acabada anatomia da corrupção, inscrevendo o caminho do poder predito ao poder apreendido e ao poder a todo o custo. A utilização bem acabada de recursos cênicos, como música ao vivo, inserções sonoras, fragmentos narrativos, e a atuação dos atores aprofundam e atualizam as questões do enorme embate que se constitui o drama.
O espetáculo conta com um elenco de 14 atrizes e atores que conduzem o público desde a rua, numa bem engendrada cena na qual eles anunciam o que vem em seguida, até uma apropriação adequada dos espaços e uma cena em que três diferentes Macbeths se apresentam de forma simultânea em três salas. Esse aproveitamento de cada canto, de cada sala, faz com que aumente ainda mais a exposição da cupidez do herói e de sua mulher.
Além de se concretizarem interna e externamente os pontos da trajetória de Macbeth, os figurinos, que misturam peças atuais com roupas que lembram o medieval, época da ação, demonstram a alternância de poder e, sobretudo, a variação de caráter. É raro poder presenciar uma adaptação tão bem executada que conserva a força do texto — as rimas são mantidas — sem que se perca o sentido que continua absolutamente atual.
Serviço:
455 Macbeth
Castelinho do Flamengo (Centro Cultural Municipal Oduvaldo Vianna Filho)
Informações: (21) 2205.0655 / (21) 2205.0276