Hoje, em Nova York, 20% dos pacientes internados são médicos, enfermeiros ou pessoal atendente dos hospitais. Cada componente da equipe que cuida de pacientes com o coronavírus é autorizado a trabalhar semanas alternadas, para que o contato com o vírus seja reduzido. É a quantidade de vírus que importa mais do que a idade; por isso, todas as faixas etárias são vítimas. Não são somente os idosos com doenças crônicas e debilitantes; jovens que também estão expostos ao vírus, diuturnamente, acabam por não resistir e sucumbem com pulmões exaustos e invadidos pela quantidade monstruosa do vírus.
Esses dias, perdi dois pacientes, sendo um médico de 37 anos e dois outros, de 53 anos e 59 anos, os três entubados e com respirador, além de uma paciente que estava no Rio e acabou morrendo semana passada, aos 71 anos. A situação nos hospitais é calamitosa. A pandemia está causando um pandemônio no sistema hospitalar. Faltam respiradores, máscaras e luvas, faltam camas nos hospitais e especialmente nos centros de tratamento intensivo. Quem precisa de respirador está com dificuldade respiratória aguda, com a sensação de se afogar, precisando ser entubado de urgência.
O médico tem um minuto ou dois para entubar, sedar e instalar o respirador, aparelho milagroso que está começando a faltar nos nossos hospitais. A cidade de Nova York está montando três a quatro hospitais de campanha. O gigante Jacob Javits Center está se preparando para receber centenas de pacientes, mas, para isso, são necessárias equipes médicas treinadas e com toda a parafernália técnica, que já está em falta nos Estados Unidos e, particularmente, aqui. Isso porque, hoje, o número de pessoas infectadas é um dos maiores do mundo.
O despreparo para uma pandemia, neste país tão avançado em tudo, chocou a todos. No Central Park, são vistas algumas pessoas andando ou correndo, mantendo 2 metros de distância uns dos outros, com olhar suspeito, como se o outro fosse pestilento ou leproso. Não se pode chegar perto. Hoje de manhã, alguém sugeriu sorrir, ao cruzar com qualquer pessoa, em vez de olhar com pavor. A vida de todos os milhões de novaiorquinos está em suspenso. Nova York está no centro da tormenta nos Estados Unidos — cada um presta atenção à sua própria respiração, atento ao mínimo sintoma que possa ser o sinal de alarme do contágio: um pânico!
Do meu lado pessoal, na semana passada, fechei meu consultório, na Park Avenue, em Manhattan. Estou em casa, trabalhando com meus pacientes por telemedicina. Também me alistei como voluntário no que puder ajudar. Mais de 30 mil pessoas de saúde se alistaram, inclusive de outros estados. O nível de solidariedade é exemplar, raramente visto e vivido, especialmente em Nova York, cidade conhecida como mais dura. A vida mudou para todos.
A telemedicina serve para acalmar as pessoas, ouvir suas angústias, ensinar a lidar com o quotidiano e para orientar os pacientes se precisam fazer o teste, se precisam de raios X ou tomografia dos pulmões, se têm de ir ao hospital de ambulância ou não. Isso, além de cuidar de quem continua a ter os problemas habituais e que não mudaram por causa do vírus. Enfim, todos, com exceção do pessoal hospitalar e dos serviços de apoio civil e policial, precisamos ficar na mais rígida quarentena para que, em 10 ou 12 semanas, quem sabe, a epidemia estará controlada, e a economia voltará a vibrar.
Melhor prevenir milhões de mortes agora e perder bilhões de dólares do que prolongar a epidemia e mergulhar a economia num desastre ainda maior. A vacina está sendo desenvolvida em muitos centros no mundo, assim como remédios para prevenção e cura. A pandemia pode ser controlada com a ajuda de cada um de nós. Se não for um desses heróis da saúde, da polícia ou do Corpo de Bombeiros que estão na frente dessa batalha contra um inimigo invisível e mortal, fique em casa. Essa será sua maior ajuda nestas próximas semanas.
Albert Levy é médico, formado na UFRJ. Emigrou para Nova York, onde completou pós-graduações. Hoje tem consultório na Park Avenue, em Manhattan; além disso, é professor na Faculdade de Medicina do Mount Sinai Medical Center.