De um lado, os que defendem que com religião não se brinca; do outro, os que são a favor da liberdade de expressão. O debate foi quente para um auditório lotado na Escola da Magistratura do Estado do Rio, nessa segunda (10/02).
Pode-se fazer humor com religião? E quando a liberdade de expressão vai de encontro ao sentimento religioso? Há limite entre liberdade e respeito? Durante o evento, os palestrantes se dedicaram ao debate jurídico da questão com embate de ideia entre os estudiosos. O filme “A Primeira Tentação de Cristo”, do grupo Porta dos Fundos, do ano passado, foi o caso mais citado pelos juristas.
O juiz federal William Douglas, por exemplo, disse que o Código Penal considera crime a ofensa religiosa. “Precisamos saber em que sociedade queremos viver. O problema é que estamos vivendo numa sociedade em que pessoas, por questões ideológicas, mera antipatia ou preconceito estão se sentindo no direito de desrespeitar a lei. O artigo 208 está lá, a Lei Caó (Lei 7.716/89) está lá. Temos que respeitar o que está no papel. Se está errado, vamos ao Congresso para mudar, mas enquanto isso temos que respeitar as pessoas”.
Mas, entre os mais aplaudidos, os que defenderam a liberdade de expressão: Daniel Sarmento, professor de Direito Constitucional da UERJ: “Eu acredito que deva prevalecer a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão. A religião não é um tabu na ordem jurídica brasileira. As pessoas têm o direito de criticar as religiões. Esse caso concreto (o filme do Porta dos Fundos) não envolveu nenhum tipo de lesão à liberdade religiosa; ninguém foi impedido de praticar a sua religião ou de ter a sua crença. E o humor está plenamente contemplado dentro da liberdade de expressão. O uso do humor é uma forma muitas vezes de discutir o exercício do poder. E nós sabemos que existe poder religioso, inclusive, que, frequentemente, oprime minorias sexuais”.
O professor e vice-presidente do Fórum Permanente de Mídia e Liberdade de Expressão, Gustavo Binembojm, assim opinou: “Anular de alguma forma a expressão das pessoas na sua singularidade, na sua identidade, ainda que essa expressão nos seja equivocada, ainda que expresse ideias com as quais não concordemos e ainda que possamos criticar essas ideias, é condição de respeito à humanidade de cada pessoa, que é um valor em si, independentemente de seu credo e de sua convicção filosófica. Cada pessoa tem direito a ser o que é, do jeito que quiser ser. As religiões têm o direito de ter os seus fiéis e propagar a sua fé, mas não é possível o Estado ser uma espécie de domesticador do que as pessoas pensam”.