Há muitas profissões que exigem de seus praticantes uma disciplina intelectual constante, que atenda a ideais libertários e humanitários. Nesse rol, estão os médicos, os psicólogos, os psicanalistas, os cientistas em geral, os professores, e também aqueles que vivem da escrita, tal como os escritores e jornalistas.
Entretanto, para muitos, pode ser que a disciplina exija — real ou simbolicamente — mais do que podem corresponder, gerando o que ficou popularmente conhecido como “estresse do trabalho”. O estresse nada mais é do que ansiedade crônica pelas contradições e descaminhos entre as tentativas de equilíbrio, entre dois princípios: o do prazer e o da realidade. Ambos lutam pela busca de significado dos ideais no trabalho.
Além disso, cabe observar que sempre existe um ponto em que a ansiedade crônica pode se tornar mais incontrolável e se transformar em angústia e medos diversos, o chamado pânico, palavra que caiu na linguagem popular. No entanto, o pânico, como diagnóstico, ajuda muito a indústria farmacêutica e pouco ou quase nada ao indivíduo — muitas pessoas hoje em dia sofrem do medo de ter “pânico”.
Como psicanalista, entendo que o surgimento da angústia é um ponto de mutação da ansiedade crônica causado pelo aparecimento de pensamentos destrutivos, sufocantes, aprisionantes e sobre morte. Eles são parte da história inconsciente de cada um e precisam ser examinados caso a caso. Em geral, porém, são pensamentos que podem suscitar muita confusão psíquica, comprometendo a lucidez de quem os tem.
Penso que a psicanálise tem dado uma efetiva resposta prática para esses problemas. Posso resumi-los a partir de uma questão do filósofo Spinoza: “O homem livre não pensa na morte, e sua sabedoria é sempre sobre a vida.”
Ao detectar como uma pessoa angustiada tornou-se uma prisioneira desses pensamentos e, ao expandir os pensamentos sobre essa vivência, ajudamos a descobrir a busca da liberdade. Questões adicionais podem ser feitas nessa investigação: desde quando essa busca existe? Onde está o objeto que aprisiona? Quais as razões para se libertar?
O trabalho é artesanal e singular, e não existem comparações. Não se trata de uma fórmula de autoajuda, apenas de uma direção. A psicanálise tem também mostrado que o aprisionamento pode ser causado por teorias sedutoras ligadas, direta ou indiretamente, à religião.
Existem teologias disfarçadas de todas as atividades humanas. Elas fornecem a ilusão de que a falta de liberdade pode ser resolvida adotando-se alguns slogans e chavões pseudopoéticos. Infelizmente, muitas igrejas e partidos políticos se organizam com essa ilusão fundamental. Falam de liberdade, enquanto praticam a tirania.
Contudo, além de denunciar esses chavões simplistas, é preciso também mostrar que, na história, foram sempre o extremismo e o fanatismo que geraram esses pensamentos sufocantes. No plano social-histórico, eles inspiram a guerra e os conflitos sociais. Também é o extremismo e o fanatismo que sempre apoiaram alguma forma de corrupção.
O sociólogo Sigmund Bauman mostrou que, quando o pêndulo da liberdade democrática se desvia para o ângulo da libertinagem, e se veste de corrupção política, causando uma enorme incerteza, ele não deixa alternativa a não ser voltar correndo para o lado da segurança, que gera, mais cedo ou mais tarde, a opressão. Assistimos a esse fenômeno descrito pelo sociólogo em vários locais do mundo.
No Brasil, a oscilação do pêndulo para a segurança ainda não caiu em uma total opressão – que seria a contrapartida da libertinagem, mas ela vem existindo aqui e ali. Censuras e críticas com viés religioso e político-partidário substituem o debate realístico que poderia combater o impedimento do progresso do país. Não vou falar hoje do narcisismo dos políticos que promovem essa obstrução nem da falta total de crítica sobre erros cometidos por quem aparentemente estava no período do pêndulo libertário.
Vou apenas ressaltar que, em algum grau, vamos sempre lamentar que a experiência passada não serviu de aprendizado. A natureza humana, infortunadamente, carece da atividade do pensar; por isso, ficamos nesse movimento pendular.