Entre voos — foram cinco palestras em cidades diferentes, só nesta semana —, o empresário Pedro Salomão, ou Pedrinho, falou com a coluna parceladamente. “Eu amo o que faço e ainda ganho para fazer um negócio que eu faria de graça”. Sua vida acontece entre assentos de avião e a administração (ao lado dos sócios, os irmãos Rafael e Levy Gasparian) de 30 funcionários da Rádio Ibiza (fundada há 13 anos), da LYdereZ, empresa de palestras, e da Pera Live, de transmissão ao vivo — mas o tempo sempre sobra para dar um “cheiro” nos filhos, Bento, 5 anos, e Maria, 2, em sua casa em Copacabana. “Quando estou com eles, me dou por inteiro; por isso, não sentem muito a minha falta”, diz.
Vez ou outra, ele se entrega aos cariocas, como nesta terça (17/09), no Teatro XP, no Jockey, na Gávea. No palco, vai falar sobre comportamento humano, conceito de felicidade, empreendedorismo, liderança não hierárquica, tolerância, amor e empatia, além de temas sobre seus dois livros, “Empreendendo Felicidade” (2016) e “LYdereZ” (2018), que virou até manual de treinamento de grandes empresas. E o terceiro já está vindo: “Valor Presente: Um dia de cada vez”, com prefácio do professor Leandro Karnal, sobre a importância de recuperarmos a paixão pelo hoje e vencer doenças contemporâneas, como ansiedade, síndrome de Burnout e da psique, com previsão de lançamento em março de 2020.
Mais do que um palestrante, Pedro é administrador, pós-graduado em Sociologia Política e Cultural e influenciador da moda, comportamento e cultura. Em 2012, ganhou o prêmio Jovens Empreendedores, da Conaje; em 2914, Prêmio Empreendedor do ano do G10; em 2015, o Prêmio de Valorização Humana da IBEF e, acima de tudo, o cara mais feliz do mundo.
Como descobriu a oratória?
O Leandro Karnal diz exatamente isso numa palestra: que as pessoas têm mania de se apegar a esses amuletos, que fulano é bom em palestra porque é de Sagitário, ou se uma pessoa entra numa sala e a outra diz que essa pessoa tem energia ruim, mas, não – é porque a pessoa é chata mesmo. Comecei as palestras por causa da Rádio Ibiza, para falar sobre inovação. E quando as pessoas pensam nisso, veem logo novas tecnologias, comportamentos, mas inovar não é só olhar para frente sempre; é, também, para trás, é resgatar um comportamento do passado. Sou o único homem da família no meio de mulheres geniais: uma irmã é médica, a outra é advogada em NY, outra, engenheira, todas com mestrado e doutorado, e eu, o burro da família. Mas isso foi ótimo porque não ter inteligência me deu noção de que eu gostava era de aprender. Eu sempre troquei um livro por uma boa conversa. Comecei a ler há pouco tempo, quando virei autor. Falar em público foi uma resposta a essa audição.
Alguma dica para quem tem pânico de falar em público?
Todas as pessoas sabem falar. Todo mundo fala o tempo todo, posta texto gigante no Facebook, frases no Twitter, opina sobre tudo, manda mensagem de áudio… A gente sabe falar, não tem que fazer curso de oratória, mas de escutatória. Tem que aprender a escutar os nossos filhos, nossos pais, nossos amigos. Estamos numa era em que falta tolerância, paciência e tempo.
Qual a exigência do novo mercado? Qual o futuro das empresas, o seu olhar para o mundo corporativo?
A história da felicidade apareceu de duas formas na minha vida. Primeiro aprendi com a genética, família grande, um apaixonado pelo outro, beijoqueiros, bem-humorados, mas alegria não significa necessariamente felicidade – ela é um dos ingredientes. O segundo ponto foi quando percebi que a liderança poderia ser diferente, tanto que os três valores da Rádio Ibiza são: 1) ser feliz; 2) fazer o outro feliz; 3) nada faz sentido se os anteriores não forem alcançados. Quando montamos a empresa, percebi que a felicidade material não era comprar uma casa, ter um carro, igual no passado, em que as pessoas mal gostavam do que faziam. Jovens não querem mais carros, tanto que a maior empresa do mundo não tem sequer um na garagem. A única exigência desses jovens era se conectar com empresas com propósitos, fazer coisas de que eles gostassem, pintar o cabelo da cor que quisessem, ter a orientação sexual que desejassem; então me aprofundei nessa inflexão de que a felicidade é um grande ativo.
As pessoas estão preparadas para essa liberdade?
Acredito que os jovens líderes quiseram muito a liderança, mas tentam arrumar o mundo sem conseguir organizar seus quartos. Um pai nasce junto com o filho, aprende fazendo; é assim que é com a liderança. Da mesma maneira que os mais velhos não estão acostumados, os jovens não estão preparados para liderar num mundo diverso. E minha proposta é que a gente construa junto esse novo olhar para a liderança, pegando com cada um o que eles têm pra dar.
Mas o que fazer para virar essa chavinha nas pessoas?
A gente vive a era do pensamento positivo, mas, na maioria das vezes, esse pensamento positivo gera inércia. Temos que tomar cuidado para que essa inércia do pensamento positivo não seja confundida com a força avassaladora da atitude positiva. Essa sim, tem um impacto filha da puta onde você estiver. Um carinho, um afeto, uma forma de como você escuta as coisas. Temos que sair do pensamento para a atitude positiva e, como eu falo isso o tempo inteiro, eu recebo uma resposta bacana.
Você é feliz o tempo todo? Nada te abala?
Quando perguntam isso pra minha mulher, ela diz que é um saco viver do meu lado. Paga os pecados dela comigo — essa se ferrou mesmo. Eu costumo dizer que, se você pratica o mau humor, você se torna um expert nessa porra. Se você é um cara ranzinza no exercício da liderança, isso vai virar um DNA seu; a gente fica bom no que pratica. Se praticarmos o amor, a felicidade, vamos ficar bons nisso. Poucas coisas me tiram do sério, como avanço de sinal: tenho vontade de tacar uma pedra do carro de quem faz isso.
Como ser um entusiasta do Rio com tanta merda acontecendo?
O Rio já esteve muito pior na história. Eu acho que tudo é uma questão de comparação. Somos comparados o tempo inteiro — o melhor da turma tem que ser o melhor na entrevista de emprego; mas o grande objetivo da vida deveria sermos as melhores versões de nós mesmos. Tem uma coisa que o Eduardo Paes (ex-prefeito do Rio) falava e eu gostava muito que era ‘por favor, não compare o Rio com Londres, compare o Rio com o Rio, vamos olhar para a história’. Estamos num momento difícil, só que já esteve muito pior. Pessoas que falam sobre violência se esquecem de que, há 50 anos, se matava por terra; a Igreja matava com a justificativa de Deus, mas hoje nunca estivemos num tempo de maior paz da história da humanidade, perto de tudo que o mundo já viveu. Tudo é passageiro. Os pessimistas são pessimistas em qualquer era do Rio. Diziam que as Olimpíadas em 2016 seriam uma merda, mas foi a melhor do mundo, segundo turistas. Mas eu acho importante ter um pessimista no time, mas um só, porque ele não traz solução, só reclama.
Mas não seria uma visão muito utópica? Qual seria a solução?
A única solução para ajudar o Rio é cuidar dele, ver os pontos positivos. Se eu quiser achar um milhão de defeitos no meu filho, eu vou achar. Eu vivo na cidade mais bonita do mundo, num lugar onde as pessoas mais bonitas de alma, de alegria, malemolência vivem. Quando eu olho para os problemas do Rio, eles são, na teoria, mais fáceis de solucionar do que os problemas da Suécia, porque lá é estrutural, comportamental. O caos gerencia nossas emoções. Fico puto quando alguém diz ‘a gente é um país de merda porque tudo acaba em samba’. Caralho, que maravilha, né? Se conseguisse levar isso para o Japão, onde tem gente se matando o tempo inteiro, seria uma maravilha. O Rio é um lugar onde a cultura da generosidade, da inclusão, acontece todos os dias. O lugar onde rico bate palma para pobre desfilar na avenida.
E na política, está tudo bem pra você?
Acredito que o discurso está velho. Em pleno 2019, não deveríamos falar sobre ditadura, racismo, homofobia. Pela primeira vez, eu anulei meu voto e me senti muito mal por isso. Não votei no Jair Bolsonaro — ele é até parecido com muita gente que eu conheço e que eu gosto, que tenho carinho, que aceito por ser diferente de mim, de gente que não conseguiu entender tanto a igualdade de gêneros, está tudo certo — porque eu moro num prédio que tem 13 pessoas. Se ele fosse candidato a síndico, eu não votaria nele. Não sinto nenhum preparo para nada, família, discurso, porra nenhuma; do outro lado, até gosto do Fernando Haddad, ele seria meu amigo, mas está inserido, na minha opinião, num grupo terrorista, que agiu de forma como o estado islâmico age, com lavagem cerebral. Não tive como votar em nenhum deles. Eu sou o cara que mais teria críticas ao Marcelo Crivella ou ao Wilson Witzel, mas em que o cara está acertando? Em que ele está errando? Estamos vivendo num mundo em que nenhum dos lados está a fim de dialogar com afeto. O grande problema não é a ideologia do Crivella, do Bolsonaro, mas a abertura para o diálogo, não só aqui, mas no mundo, que está polarizado. Se você não for a favor, você é contra. E se você quiser ser o meio- termo, é condenado por um dos dois lados.
O que fazer?
Precisamos restabelecer o diálogo. Não vamos construir um Rio melhor se fizermos baderna e anarquia contra a prefeitura. O que temos que fazer é chamar para o diálogo com afeto e, dentro desse afeto, tentar discutir os diferentes pontos de vista. Essa questão do gibi censurado na Bienal do Livro, escutei muita gente coerente dizendo que o problema foi não ter avisado sobre o conteúdo, mas entendo os dois lados, que é contra a censura, assim como eu, mas também alguém preocupado com o desconhecido. O problema é que a gente está querendo impor nosso ponto de vista, como verdade absoluta, goela abaixo das pessoas. Não existe cena mais grotesca, mais absurda do que o filho do Bolsonaro (Eduardo) visitando o pai com uma arma na cintura no hospital. Mas eu preciso praticar a empatia de que isso é uma bandeira; no exercício da democracia, preciso entender o cara. Mas dói abrir mão de convicções. O que faço é convidar para refletir, porque estamos entrando na era das paixões, da intolerância; as pessoas estão confundindo preferência com preconceito. E estamos criando pessoas sem o direito de ter preferências. Eu tenho uma preferência desde moleque, que são mulheres negras como perfil estético e, se eu postar no Insta falando que são mulheres lindas e tal, ok, mas se falar que prefiro louras, eu sou preconceituoso. Outro exemplo: um amigo meu maconheiraço estava reclamando da violência, do tiroteio perto da casa dele; daí mandei uma mensagem privada: ‘ Meu amigo, você é o responsável direto por isso – compra do tráfico, pode reclamar de tudo, menos da violência que ele financia.
O politicamente correto nunca esteve tão chato?
Puta que o pariu… Está chato, lento, tudo você tem que tomar um cuidado danado. Não podemos falar mais nada. Mudar determinados comportamentos é um exercício de aprendizado. A gente está pegando as instituições e customizando tudo, até a fé, quando diz que é católico, mas acredita em reencarnação, isso não existe. Jesus, por exemplo, é a pessoa mais moderna, mais avant gard que eu conheço. Voltando dois mil anos, Jesus nasceu de uma mãe solteira, que engravidou aos 15 anos, quando namorava José, falando que o filho era do Espírito Santo, ou seja, José levou fama como o primeiro corno da rede social da história. Só aos 12 anos, Jesus começa a fazer alguns milagres e, quando mais velho, a primeira coisa que ele fez foi valorizar a festa e transformar água em vinho. Caralho, em meio a milhares de milagres, ele faz isso! Enfim, depois ele salvou uma prostituta, Maria Madalena, do apedrejamento e ainda ficou amigo. Há dois mil anos, ele discutiu feminismo, lutou pela igualdade de gênero e foi o cara mais de direitos humanos na vida, falando com pobres, leprosos, excluídos etc.
Foto: Ari Kaye