Se o tema é cultura, pode falar com Leo Feijó. Em alguém eclético? Pode falar com Leo. Quer saber da noite? Leo também pode ajudar. Apaixonado pelo mercado cultural e criador de mais de 10 espaços da noite carioca — incluindo a Casa da Matriz, Teatro Odisseia, Cinematheque e Choperia Brazooka, além de coordenar a rede Palcos do Rio, com 20 casas de shows e ter sido subsecretário-adjunto de Cultura do Rio entre 2016 e 2018 —, o jornalista e produtor cultural retoma o Odisseia, na Lapa, comemorando 15 anos, com uma série de eventos, a partir deste sábado (15/06) até agosto.
“Quero ampliar o público e mostrar que estamos abertos a todos os gêneros”, diz Leo, que reassumiu a curadoria do teatro. Com o modelo de casa de shows enfrentando turbulência nos últimos anos, o Odisseia encontrou três caminhos: tornou-se a principal casa de heavy metal do Rio, continuou trazendo novos artistas brasileiros e entrou na dinâmica das festas, hoje terceirizadas.
No entanto, a escolha da abertura, o gaúcho Wander Wildner, tem uma razão: “Um dos principais nomes do rock gaúcho desde os anos 1980, Wander esteve presente conosco todos esses anos e simboliza a nossa trajetória”, diz Léo. No mais, vai ter Matanza Inc., Face to Face (EUA), Thiago Amud, Moyseis Marques, Gabz, Bloco 7, Sinara, Dudu Oliveira, Camerata Laranjeiras, No Trauma, Brasov, João Ribeiro, Rita Beneditto, Zeca Baleiro etc.
A estreia do Teatro Odisseia com show do Los Hermanos, em 2004, teve enorme repercussão. Qual o tamanho do impacto que você espera nessa nova retomada?
O Teatro Odisseia é procurado por bandas de todo o Brasil. É um palco conhecido por sua trajetória de apoio aos músicos, ao intercâmbio e por sua capacidade de formar público para esses artistas. A casa ocupa um nicho de mercado importante no segmento de shows, pela capacidade de 500 lugares. Conseguimos lançar novos artistas e, ao mesmo tempo, receber outros com trajetória já consolidada. Eu espero que o teatro inicie uma nova caminhada para outros 15 anos, mas, sem patrocínio e diante da crise econômica e de ataque ao setor cultural, está difícil planejar. É um espaço de resistência, e eu espero que encontremos novos modelos de negócios e tenhamos apoio dos cariocas nessa luta.
Qual foi o critério de escolha para as atrações?
O Odisseia sempre foi um espaço de diversidade musical. Convivem bem gêneros musicais tão distintos, como o choro, o samba e a música instrumental como o heavy metal, o rock, o rap e a MPB. Prova disso é que a casa já recebeu shows de Miúcha, Walter Alfaiate e Teresa Cristina, assim como Jello Biafra (Dead Kennedys), Marky Ramone, Autoramas e Replicantes. A programação dos 15 anos mantém essa dinâmica, com festas de funk e k-pop convivendo com shows da Camerata Laranjeiras, Zeca Baleiro e Reckoning Hour. As festas são importantes para o equilíbrio financeiro e, além disso, levam um público jovem que se renova a cada ano.
Existe uma carência de eventos na cidade?
Existe uma tendência de valorização de grandes eventos e de eventos gratuitos no Rio. Os grandes eventos conseguem patrocínio e oferecem a lógica da “experiência”. Os eventos gratuitos atraem quem está com orçamento apertado. No meio dessa concorrência, ficam os espaços privados de cultura, que obviamente não têm poder para investimento pesado em mídia paga nem podem oferecer shows gratuitos o tempo todo; ou seja, há uma mudança nos hábitos de consumo. A maioria das pessoas que compra um tíquete para o Rock in Rio, por exemplo, não compra um ingresso para shows ao longo do ano. A perspectiva é de uma cidade com menor oferta de casas de shows de médio e pequeno porte, o que tem impacto urbano, econômico e cultural muito negativo para o Rio.
O que está acontecendo com a cultura carioca?
Faltam políticas culturais que aproximem as marcas dos espaços culturais de médio e pequeno porte. Isso gera uma dificuldade imensa. É uma questão estratégica, e penso que a Prefeitura e o Governo do Estado deveriam criar ou retomar programas de apoio a esses espaços. Estou falando de casas de shows e também de teatros, museus e outros espaços culturais. O Rio enfrenta uma situação de alto índice de desemprego e saída de grandes empresas rumo a São Paulo. Quando unimos crise econômica, violência e tendência de valorização de grandes eventos, geramos uma situação insustentável para o setor cultural que tem impacto positivo na rotina da cidade.
Como subsecretário-adjunto de Cultura e coordenador de música na Secretaria de Estado de Cultura do Rio, quais foram seus maiores desafios e por que ficou apenas dois anos?
O desafio maior é o orçamento para as pastas da Cultura. Em cidades que promoveram o desenvolvimento social e econômico, a Cultura tem papel fundamental, e o orçamento chega a 5%; para a Educação, passa dos 30%. No Estado do Rio, o orçamento para a cultura é um dos menores entre as secretarias. Ainda assim, o Estado tem uma função de articulação e equilíbrio do mercado, que é fundamental.
Tem algum projeto em andamento?
Coordeno o programa “Música & Negócios: Empreendedorismo e Inovação”, na PUC-Rio, há sete anos. São mais de 500 alunos certificados. O Instituto Gênesis, da PUC-Rio, é referência em Economia Criativa e formação de empreendedores. Quero ampliar essa atividade e levar conhecimento a um público ainda maior. A indústria da música e do entretenimento é muito dinâmica por conta do impacto tecnológico, e devemos oferecer informação e oportunidades a todos dessa cadeia produtiva. Quero publicar um livro sobre a relevância dos palcos para a economia da música no mundo. Sem esses palcos, não haveria cultura pop como a conhecemos.