“O preconceito contra o gordo é um dos mais assustadores que existem. Realmente, não é brincadeira; é muito pesado, bem mais pesado do que o peso do gordo em si. Muita gente gorda sabe que é gorda e é feliz sendo gorda, mas não adianta: são olhadas de tal forma como se comer o que quiser e fazer o que está a fim fossem, na verdade, “Meu Deus! O que você está fazendo com você?” – já ouvi muito isso. Esse “Meu Deus!”, lá no fundo, é a voz do preconceito. Comparo com o preconceito contra o gay, contra o transexual, por exemplo.
Mas aí é que precisa ligar o “foda-se”, para os olhares de canto de olho, que já demonstram reprovação e normalmente julgam que temos baixa autoestima, o que é um verdadeiro absurdo. O gordo é sempre o alegre, é aquele que está sempre brincando consigo mesmo; sem falar nos que sentem medo, um medo real, sem ser preconceituoso (ou talvez um pouco de cada coisa?). Percebo bem isso quando abro a porta do elevador e já tem gente dentro. Esse é sempre um momento de muita tensão no ar – as pessoas já te olham assustadas. E há quem já tenha virado pra mim com cara de desespero e perguntado: “Você acha que vai dar?” ou “Não vai ficar muito pesado?” É assim a minha vida.
Por outro lado, vida de alguém feliz com sua imagem, comendo todo salmão que quer, toda batata frita que dá nada cabeça e todas as pizzas que deseja. Essa sou eu, e pude comprovar o que digo desde que tive de fazer a bariátrica, por questão de saúde e por imposição do meu joelho (o sobrepeso, uma hora, passa a machucar as articulações, e os ossos começam a sofrer). Sim, é fato: o peso cria dificuldades. Mas, sendo muito sincera, depois da cirurgia, eu comecei a emagrecer e a não gostar de mim. Como todo “bariatricado”, fui me olhando no espelho e não me achava nada bem, me achava feia; na verdade, comecei a achar que aquela não era eu. E me perguntava: “Quem é essa pessoa estranha e esquisita?” – me via como uma pelanca que anda, enquanto dos outros eu ouvia: “Você tá ótima: perdeu 30 quilos!” Daí, voltei a engordar de novo, por querer. Fui engordando e me achando mais bonita. E o engraçado é que eu era magra e não me sentia assim. Sei que deveria ter parado num certo patamar e ter começado a pensar nisso quando comecei a engordar e logo passei a tomar remédios para emagrecer, depois de ir a vários médicos.
Tudo no controle, até quando a minha mãe (Madeleine Archer) sofreu um acidente e ficou toda queimada. Foi aí que eu ouvi os médicos comentarem, na clínica do Pitanguy, que ela só sobreviveu pelo fato de ter um organismo limpo. Minha mãe não tomava remédio e passou por todas as infecções. Diante disso, resolvi parar de tomar também, o que me fez engordar muito; suspendi aquelas composições loucas. Desde então, comecei a ir me sentindo bem comigo mesma sendo gorda, deixando a estranheza para os outros, percebendo que eles é que se incomodam de olhar pra mim.
Dessa liberdade de me sentir feliz gorda, não abro mão. A sociedade não entende e não admite a minha gordura. Agora, vou mudar algumas coisas na minha alimentação, e também comecei a fazer Ioga e academia, mas por saber que não faz bem estar tão acima do peso – e não pelo jeito que olham pra mim.
Estabeleceu-se que ser magro é obrigação. Não, obrigação é respeitar o desejo e a liberdade das pessoas. Não me pergunte com quantos quilos estou porque não sei. Só sei que sou feliz assim e tenho consciência de que faço um movimento contrário, mas posso afirmar que importa mais o que você vê no espelho do que os outros veem em você. Tem algo de errado em ser gordo e se achar bonito?”
Alexa Archer é empresária.