E no Dia de Reis, 6 de janeiro, eles chegavam, perguntando se os fazendeiros queriam a apresentação – pelo lado paterno era não, pelo lado materno, era sim. Meu pai liberava o show para nos agradar. Começavam o canto e a dança, com os chapéus bordados de espelhinhos, fitas, flores de plástico, tiras coloridas. Não podíamos entrar na roda, apesar de a proibição não ser verbalizada; nem balançar o corpo; mesmo assim, adorávamos. A quem eles colocassem o chapéu (suado) na cabeça, esse só podia tirar ao fim do espetáculo e devolver com dinheiro. Minha mãe não só dava dinheiro na frente do meu pai, como depois, pelas costas. Quando iam embora, meu pai sempre falava: “São desocupados querendo ganhar a vida sem trabalhar”. Um dia, quando minha vó estava lá, completou: “E fedorentos”. E minha mãe respondeu: “É o cheiro do humano. De perfume bom vocês entendem: o fedor da bosta de gado”. Meu pai respondeu: “O melhor cheiro do mundo, ainda vão descobrir o poder do estrume”. Minha mãe dizia que mesmo a contragosto do meu pai, não tinha dinheiro que pagasse os reizeiros, que faziam a gente esquecer da vida.