Sílvia Buarque é a única italiana da família. Seus pais, Marieta Severo e Chico Buarque, tiveram a primeira filha quando moravam em Roma. Para completar suas raízes globalizadas, a atriz está casada há 12 anos com o ator mexicano Chico Díaz, e, não à toa, se considera precoce (pelo menos para os padrões da época): aos 15, já saía de casa sem hora para voltar e, aos 20, foi morar com seu primeiro marido, o diretor José Henrique Fonseca.
Além de decidida, Silvia tem outra grande qualidade: está sempre incentivando os amigos, como no caso de Adriana Falcão, que voltou a escrever para o teatro, com a peça “Ideia Fixa”, em cartaz no Teatro Poeira. Foi ela quem estimulou a roteirista, que se separou recentemente, a escrever sobre o tema, e daí surgiu a história de duas mulheres abandonadas pelo mesmo amor – Sílvia interpreta justamente uma dessas mulheres em cena.
Mesmo se considerando muito diferente dos pais, não nega os gens: seu amor ao teatro, ao qual resolveu se dedicar profissionalmente por um acaso do destino – foi convidada para participar do elenco da peça “Os Doze Trabalhos de Hércules” numa noite no Baixo Gávea, em 1985 – já a levou a ser dirigida por nomes como Naum Alves de Souza, Moacyr Góes, Bia Lessa, Gabriel Villela, Marco Riccca e Aderbal Freire-Filho. Da parte do pai, herdou um pensamento político à esquerda, e se tornou integrante do Movimento Humanos Direitos.
Sílvia tem uma carreira contínua em novelas, iniciada em 1986, na extinta “Manchete”, em “Dona Beija”, até “Caminho das Índias”, na Globo – agora em reprise à tarde, na emissora. No cinema, também participou de muitas produções e está com dois filmes prestes a estrear: “Reza a Lenda”, um faroeste contemporâneo, de Homero Olivetto, e “Montanha Russa”, de Vinicius Reis. Ela é curiosa, principalmente intelectual. Seu padrinho de batismo, Vinicius de Moraes, certamente aprovaria a carreira da afilhada de cabelos cacheados!
“Representar, pra vc, sempre foi uma ideia fixa? Sua mãe a influenciou muito nessa escolha?”
“Comecei a fazer teatro na adolescência, por farra, sem intenção de seguir carreira. As coisas foram aparecendo. Eu era uma menina animada e fui me envolvendo com a profissão. Mas até meus 17,18 anos, meu sonho era trabalhar com algo relacionado a Ciências Sociais. Neguei durante muito tempo a influência da minha mãe, mas acho impossível que alguém que segue a profissão de um dos pais não tenha sido diretamente influenciado. Fui sim, com certeza. ”.
A peça da Adriana Falcão fala sobre a necessidade da pessoa de se reinventar quando um relacionamento termina. Mas um relacionamento longo como o seu e do Chico Diaz também passa por fases. Vc se questiona muito sobre a relação do casal?
“Concordo, temos de nos reinventar todo o tempo no casamento. E mais: acho que a grande questão da peça é tentar amar de um modo saudável, sem tantas cobranças, sem tanta dependência – meio “missão impossível. Kkkkkkkk”.”.
Vc acha que ainda tem muita mulher atrás do Príncipe Encantado?
“Acho que, pelo menos na minha geração, as mulheres, e me incluí nisso, sonham com O CARA, O GRANDE AMOR, uma relação pra sempre. Mesmo o mundo tendo mudado muito nessa questão nos últimos 50 anos, a gente ainda se pega, eu acho, desejando esse amor idílico. ”
“Seu pai agora está voltado mais à literatura do que à música. Na sua infância, ele tinha o cuidado de apresentar você para os bons autores e músicos? Você sempre curtiu MPB?”
“Tive contato com gente da pesada desde cedo – nossa casa era muito animada. Tom, Vinicius, além de meu pai, sim, me levar a shows também. Mas o conhecendo, acho que isso foi mais uma coisa natural, pai jovem, anos 70, do que uma coisa calculada. Mas, sim, gosto desde sempre de MPB. ”
Você nasceu na Itália, seu marido é mexicano. Já imaginou morar fora do País?
“Acho que me adaptaria a outro país, sim. Não para sempre; por um período. Mas minha profissão é dura nesse aspecto: a questão da língua. E, apesar dos pesares, acho o Brasil um bom lugar pra criar minha filha. Minha vida é no Rio de Janeiro, a princípio”.
Politicamente falando, como você vê o Brasil atualmente?
” Acho bem complicado falar de política neste momento. Confundem muito a minha posição com a do meu pai (Chico Buraque), e com razão. Mas às vezes levo umas porradas desproporcionais; afinal não sou nenhuma ativista. Sou muito interessada por política e me considero de esquerda; estudei numa escola que me levou a isso também. O momento atual não é bom. Tenho críticas ao governo e mais ainda à oposição. E sobretudo estou assustada com o grau de intolerância geral. E ando muito ligada em nomes novos como Jean Wyllys e o Haddad, que eu acho que estão fazendo bonito.”
Como é sua participação no Movimento Humanos Direitos?
“Como disse, não sou ativista; minha participação no MHUD é bem preguiçosa. Mas temos uma história bonita, um grupo que se juntou pensando em dar luz à questão do trabalho escravo. Mas faço quase nada lá; tenho colegas queridas bem mais atuantes. ”.
Conte alguma coisa divertida do seu lado mais “mulherzinha”.
“Ah, eu sou toda mulherzinha! Eu cuido da casa, compro flores, encho o saco do Chico porque quero declarações de amor diárias. Não estou me vangloriando, não, mas vivo cercada de mulheres: uma filha, duas irmãs, seis sobrinhas e dezenas de amigas”.
Dois filmes em que você trabalhou recentemente estão para ser lançados. “Reza a Lenda”, de Homero Olivetto, é quase um faroeste nordestino; “Montanha Russa”, de Vinicius Reis, um drama sobre as privatizações no País e suas consequências. O que a atrai mais, como atriz, no cinema?
“O “Montanha Russa”, na verdade, ainda não foi filmado – é um projeto (houve uma falha de comunicação aí…). O “Reza a Lenda” é um filme lindo. Faço uma participação pequena, mas gosto muito. Sou a mulher de um coronel, que só quer saber de fazer uma festa junina linda enquanto o mundo explode em torno dela. Exemplo de mulher fútil. O cinema me atrai demais – acho que é por ser uma apaixonada por cinema como espectadora. Sou dessas que vão à tarde sozinha. Prezo demais cada convite que recebo. E vem mais coisa por aí.” ”.