Foram tempos difíceis, final de uma grande guerra, com outro se anunciando: falta de empregos, de comida, sobretudo, falta de esperança. Esses foram os loucos anos 20, os anos da crise. Esse universo de mudanças em guerra total com um passado tradicional é o que a peça Gertrude Stein, Alice Toklas e Pablo Picasso, texto inédito no Rio escrito por de Alcides Nogueira, retrata com a mesma força com que Picasso retratou Gertrude.
O fio narrativo é a vida da escritora norte-americana Gertrude Stein em Paris, nos anos que antecedem e incluem a 1ª Guerra Mundial. Casada com outra mulher, Alice Toklas, e convivendo com o pintor espanhol Pablo Picasso, Gertrude transforma sua casa num local onde se reúnem grandes nomes das artes, como Matisse, Hemingway, Apollinaire e Cocteau. Apesar de retratar o início do século XX, o objetivo da peça é o discurso da modernidade.
Barbara Bruno é Gertrude, Sabrina Faerstein, sua amante Alice e Giuseppe Oristânio, Picasso. Os três, sem nenhuma intenção de imitar vozes ou trejeitos da época, revivem, quase que como num ballet, os impasses, as diferenças, as angústias que levam as pessoas a se isolar, a se exilar, procurando, internamente, respostas a perguntas que são apenas interrogações.
“Gertrude, não somente nos livros, mas em seu salão parisiense, semeou muito do que viria a ser apreendido pelos artistas que o frequentavam. Artistas que revolucionaram as artes. Esta peça é um fruto das ideias de Gertrude Stein. O meu teatro sempre foi fortemente influenciado por ela e por autores que se alinhavam a essa desconstrução. Até pouco tempo, nós chamávamos de pós-moderno. Na verdade, acho que é pós tudo!”, diz Alcides Nogueira.
Um texto que nos movimenta, nos instiga. Alcides utiliza um recurso fascinante de misturar nas citações personagens atuais, com observações muito próprias da personalidade de cada um. É assim que vamos vendo o quadro se compor como o retrato deformado, mas forte, real, de uma lembrança que só nós podemos ter, como é a obra de um grande artista. Como Picasso. Como Alcides.