Duas mulheres velhas, totalmente solitárias, fechadas em um quarto e em seus próprios segredos. Esse é o eixo da peça À Beira do Abismo me Cresceram Asas, de Maitê Proença (baseado em pesquisa e ideia de Fernando Duarte), dirigido por Clarice Niskier e Maitê Proença, com supervisão de Amir Haddad. As histórias apresentadas, os conflitos, os casos, as piadas, as tristezas e as alegrias baseiam-se em histórias reais recolhidas em diferentes asilos do Brasil.
Terezinha (Maitê Proença) e Valdina (em magnífico desempenho de Clarisse Derzié Luz) vivem num limbo da velhice. Saudáveis, lúcidas, veem o tempo escorrer, passar, e nada conseguem pegar. Falam de suas memórias, traçam planos para os eventos mais banais que acontecem no asilo, como o Baile anual. Nada do que é o sentido da vida lhes escapa. Apenas, a vida já se foi…
O conflito básico – duas mulheres abandonadas (Terezinha, porque a família não a visita, e Valdina, porque perdeu filhos e maridos) – poderia ser a receita de um espetáculo trágico ou piegas. No entanto, o que acontece é justamente o contrário. Existe humor, leveza, ironia. Nada se esconde do que é a velhice solitária; mas o jogo dos personagens – Valdina, um furacão de vitalidade, força e esperança, e Terezinha, mais comedida, porém igualmente forte – leva a plateia a momentos de forte emoção.
“Nossas velhas são tão crianças, tão jovens e tão maduras quanto tantas outras sólidas senhoras que vemos pelas ruas. São mulheres tão intrigantes quanto ‘As Meninas’, que, também pelas mãos de Maitê, deram passagem a elas”, observa Clarisse.
À Beira do Abismo me Cresceram Asas tem cenário e figurinos que transparecem o tom da peça: são coloridos, sem ser exuberantes; são estilizados, mas lembram uma realidade; são como se fizéssemos em nossas cabeças um ambiente de sonho e fantasia. Flores nas roupas, nos cabelos, nos ambientes transmitem sinais de uma beleza natural, mas que tem data para acabar. E essa é a melhor metáfora da vida.
O que a peça mostra, com os diálogos marcados pela cumplicidade e solidariedade, é viver e gostar, apreciar, compartilhar. Isso é a amizade sincera, companheira e presente. Assim é a relação de Terezinha e Valdina. Marcante e emblemática do significado da peça é a cena do aniversário de Terezinha, ao qual seu filho, mais uma vez, não comparece. Cai uma chuva de luzes e papéis prateados e dourados. Essa luz, essa comemoração, essa força vital nos convence, ao final da peça, que viver e ser feliz é preciso.
Serviço:
Teatro Fashion Mall (São Conrado)
Sexta e sábado, às 21h
Domingo, às 20h