A Dias Ferreira, no Leblon, é uma rua cheia de possibilidades: comprar livros ou discos para todos os gostos, num cenário muito agradável; consumir marcas chiques e conhecidas, da calcinha ao sapato; comer em bons restaurantes, dos mais variados gostos e preços.
Nesse mesmo pedaço do Rio, tão famoso, tão badalado, tão disputado, tem-se, também, outras tantas possibilidades: como a de ser assaltado à luz do sol, ver descarregamento de caminhões nos mais variados horários, ou ficar numa fila de carros que bloqueiam o tráfego a qualquer hora do dia, como se nada estivesse acontecendo.
Bicicletas e triciclos andando nas calçadas é coisa habitual. Perguntado a uma criatura que passava a toda quase atropelando todo mundo (sob gritos de “Por favor, pare, por favor, pare”), ele, diz: “Melhor transferir o meu risco de andar na rua (já que ninguém respeita ciclistas) para os pedestres do que me ferrar”. Dispensa comentário!
Calçadas invadidas por donos de restaurantes? Normalíssimo. Fotógrafo local comenta, sutilmente: “Aqui existe quem tenha prestígio inabalável junto ao poder público” – e não há por que duvidar.
Na Dias Ferreira é possível, também, assistir aos flanelinhas reclamarem das senhoras que deixam os motoristas esperando, atrapalhando o tráfego Ou o inverso – dos motoristas reclamarem dos flanelinhas que formam filas esperando pelas senhoras – ou seja, um delinquente se queixa do outro.
Luís Oliveira, organizador de filas duplas e triplas de carros, acha o máximo que as malhadoras da academia (tem isso também) entreguem as chaves em suas mãos, num gesto de confiança: “Vou fazer o quê, vou dizer que não recebo os carros”?, responde ao ser perguntado se fila tripla pela manhã já não é um pouco demais.
Todos parecem acostumados a essa rotina, sem constrangimentos. E como parecem se entender! Um taxista local tenta resumir: “Aqui todo mundo tem razão e todo mundo tá errado”.
Se ali não impera a lei, pouco adiante há quem crie a sua. Foi o caso de Joana Pereira, maranhense, dona da banca de revista na esquina com Ataulfo de Paiva: decidiu que só vende papel seda para enrolar cigarros, digamos, mais rústicos, para maiores de idade. “Se tiver cara de criança e não tiver documento, não leva a seda”, diz ela,
Por essas e outras razões a Dias Ferreira foi escolhida, entre as primeiras ruas da Zona Sul, para receber uma Unidade da Ordem Pública. Como ali todos se habituaram a conviver com pequenos delitos e ilegalidades, há quem veja o risco de a UOP acabar, literalmente, desorganizando a vida de quem mora, trabalha e frequenta aquele trecho da cidade.