Creio que muitos leitores já ouviram falar em organizações internacionais que agregam escritores e intelectuais com o objetivo de defender primordialmente a liberdade de expressão, de lutar pela integridade física de seus associados, de exercitar o repúdio à censura do pensamento. Pois bem, eu fui eleito, há algum tempo, para presidir o braço brasileiro da centenária instituição universal que tomou o nome significativo de Pen Clube Internacional, ou seja, o clube dos associados ao ato de escrever. Pen (em inglês) significa a antiga pena que escrevia; depois, a máquina manual ou elétrica; finalmente hoje, o computador. O Pen Clube do Brasil existe desde 1936, fundado por um intelectual e benemérito, o dramaturgo Cláudio de Sousa, também membro da ABL e figura de ativa presença no meio cultural e social carioca dos anos 20 aos 50 do século anterior.
A guerra que se desenvolve com ferocidade no Leste Europeu fez abrir uma exceção naquilo que seria uma exclusividade do Pen Mundial, a defesa individual de escritores perseguidos, presos, ameaçados de censura de pensamento. Agora, a solidariedade é expressa não mais a indivíduos, mas aos países e suas populações que sofrem o horror da pulverização de suas cidades, famílias e mesmo vidas.
A sede do Pen Internacional, portanto, também do Pen Brasil, está em Londres. De lá, recebi um apelo, quase que uma ordem, para que todos os países afiliados nos cinco continentes à organização mundial pudessem somar-se a um ato de repúdio de quem vive para as letras, para a opinião pública, enfim, contra a guerra – a Guerra, compreenda-se, como uma entidade de desarmonia, de desordem, de sofrimentos impostos aos povos em estado de beligerância.
O Pen Clube do Brasil enviou, por certo, sua adesão ao apelo dos escritores/intelectuais do mundo contra esse tipo de ação bárbara, o Estado de Guerra, assim mesmo, com letras maiúsculas, como que a indicar a entidade daninha que uma (ou qualquer) guerra pode representar. Tomo a liberdade de transcrever abaixo o texto da adesão brasileira que imaginei para nossos associados contra a guerra.
“O Pen Club do Brasil se solidariza, de modo enfático e integral, com o PEN Club Internacional, ao se somar a todos os coirmãos dos cinco continentes no sentido de o Brasil e as centenas de seus associados (escritores, jornalistas e intelectuais) emitirem protesto contra atos de guerra no Leste Europeu. Os sofrimentos impostos à população civil carecem de qualquer justificativa moral ou histórica. O país invadido, a Ucrânia, está sofrendo ataques militares pesados e perdas de vidas em quase todas as frentes. O país invasor, a Rússia, começará a prejudicar gravemente a sua população com o fechamento de sua economia em inédito bloqueio mundial. Em resumo, a guerra não acrescentará nenhuma vantagem aos povos atingidos. Ao contrário, contabilizará sofrimentos, perdas humanas e materiais, pobreza e traumas para as populações envolvidas.
Bertrand Russell, um dos patronos do nosso Pen Club Universal, foi profético ao avaliar a guerra como uma maquininha de calcular operando apenas para registrar o negativo, a subtração sempre, e nunca qualquer soma, um acréscimo sequer.
Portanto, o Pen Brasil se une a ação benéfica do Pen Internacional no sentido de agregar seus mais de 200 associados e, quero crer, a quase totalidade dos escritores do Brasil, em repúdio às ações de guerra ou à “Guerra” em seu sentido mais abrangente e universal.
A subtração de vidas bem como a pulverização de bens materiais de um país ferem a dignidade e atentam contra a liberdade. Trata-se de uma trágica censura ao direito de ir, vir e ser feliz, a que qualquer ser humano aspira. Todos devemos exigir isso a qualquer país, em especial aos que comandam o Planeta.”
Ricardo Cravo Albin é jornalista, historiador, pesquisador musical e criador do Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira, que tem mais de sete mil verbetes e referência na área musical. Acaba de lançar o livro “Pandemia e Pandemônio” (Editora Batel).