Ele nasceu no Rio Grande do Sul, morou em Brasília, mas foi no Rio que sua vida – profissional e amorosa – aconteceu. O arquiteto André Piva é um dos nomes mais fortes da arquitetura carioca, com um trabalho autoral e reconhecido. Piva está comemorando 20 anos do seu escritório com o livro “André Piva Arquitetura”, o lançamento é no próximo dia 7, na Lagoa. “Cada projeto é único, e tenho orgulho de todos eles. Foi difícil escolher. A minha arquitetura não ficou defasada”, diz. A lista de clientes é grande: Miguel Falabella, Edson Celulari, Boni e Lou de Oliveira, Boninho e Ana Furtado, além de políticos e empresários. Atualmente está tocando a decoração da casa de Tatá Werneck, no Itanhangá, e o novo Cine Leblon. Sem falar em sua própria casa, criada do zero, uma atração em si, com vista para a Lagoa, Morro Dois Irmãos e Cristo Redentor.
A fidelidade vai além do profissional. O mesmo tempo de profissão ele tem de casamento com o estilista Carlos Tufvesson, desde 1995. O casal levou 16 anos na Justiça pelo direito ao casamento oficial, o que aconteceu com grande festa no MAM, em 2013, um dos lugares adorados pelo arquiteto. “Meu prédio preferido. Não canso de olhar, frequentar, admirar”. Talvez a admiração seja tão grande quanto a dos amigos pelo seu humor infalível: aquele talento baixado do céu (se é que vocês me entendem).
Foi difícil decidir o que colocar nas páginas?
Gosto de todos os projetos que estão no livro, que representam bem nosso estilo e mostram a coerência de conceitos ao longo desses anos. É um livro de arte, sem pretensão de ser didático, para amantes de arquitetura, de interiores e do nosso trabalho.
Quais suas maiores referências?
Uma referência forte, porém muito subjetiva, foi Oscar Niemeyer pelo fato de eu ter morado em Brasília e começado a faculdade lá. Ao mesmo tempo, admirava e admiro ainda o trabalho de Mies Van Der Rohe, que acho um gênio na profissão. Richard Meyer também é uma grande influência com suas casas brancas. Minha casa é em homenagem a ele.
Qual o maior prazer que a arquitetura lhe deu?
Essa profissão é quase tão boa quanto sexo; só que dá dinheiro. Não que sexo não possa dar dinheiro, mas não é o meu caso. São tantos projetos que fica difícil o de maior prazer.
Quais são seus lugares prediletos no Rio?
Adoro andar pela Lopes Quintas e ver as lojinhas e restaurantes, nosso pequeno Soho. Amo a Lagoa , o Porto Maravilha revitalizado, a Praça Mauá. Incrível, eles também são a cara do novo Rio, que temos que acreditar que voltará! O Palácio Gustavo Capanema, início do Modernismo brasileiro e seus pilotis abertos, os jardins do Burle Max e azulejos do Portinari. O calçadão de Copacabana e seu mosaico de pedras portuguesas são um grande quadro a céu aberto. Mas 80% dos prédios do Rio são horríveis, e a qualidade das obras são ruins por culpa do custo imobiliário. Na parte de construção de casas, somos muito bons, reconhecidos mundialmente; mas não é por ser barato que tem de ser feio. Tudo é muito caro no Brasil, mas é o mesmo preço tanto para fazer o feio quanto o bonito. Você pode encher a casa de mármore de Carrara, e ficar cafona…
A crise afetou sua profissão?
A crise atingiu todo mundo, e quem disser o contrário está mentindo. O Rio estava um paraíso, porém num momento fora da realidade, e depois caímos na real e veio a crise. Agora estamos voltando, mas não para aquele Rio supérfluo. As pessoas estão tendo mais noção do valor do dinheiro, e está tudo mais enxuto, mais comedido. Quem gastava mais dinheiro está preso: os nossos políticos da Lava-Jato. Vou dar a ideia para as “Patricias” (Mayer e Quentel, do Casa Cor) e fazer o “Bangu Cor”, uma cela temática homenageando o ‘”Lavajateado”.
Qual o futuro da arquitetura em projetos ecológicos e sustentáveis?
O problema do sustentável é o mesmo do orgânico: caro demais. Falta um olhar do governo para incentivar esses usos, com incentivos e subsídios. Mas parece que acontece ao contrário. Sempre que possível, inserimos em nossos projetos. Com certeza, em breve isso será default!
Como lida com a “arquitetada” carioca?
Não gosto de andar com arquitetos, e sim com grupos misturados, que tenham filósofos, escritores, músicos… Eu frequento todos os grupos e não tenho fidelidade a nenhum.
Clientes mudando de opinião são um porre?
Alguns mudam a toda hora, é um inferno. Graças a Deus, existe a tecnologia, que nos permite mudar tudo facilmente no computador. No começo, até é bom mudar, gosto dessa criação em conjunto com o cliente, mas chega uma hora que passa do ponto, que nem peixe, apodrece.
Um pesadelo na profissão?
Teve uma vez que uma pessoa do marketing de uma empresa famosa começou a mostrar um monte de imagens de Pinterest e Instagram como referência; daí eu disse para ele fazer e larguei. Isso é um inferno. Hoje nosso maior problema são os blogs de decoração e Pinterest. Todo mundo virou arquiteto – uma loucura! A vida inteira foi assim, mas existe uma parte técnica; não estudei cinco anos para nada. A pessoa tem que ter noção de proporção e conhecimento senão vai ficar uma merda. Se você for muito feio, não terá maquiagem que resolva. E me irrita também tudo o que está na moda. Um exemplo? Cobre é “novo dourado”. Teve uma cliente que me contratou por eu ser mais “clean”. Ela queria tudo branco, mas pediu uns diamantes em losango no piso. Perguntei se ela conhecia meu trabalho… Infelizmente tive que abandonar o projeto.
Tem casos curiosos com clientes?
Tem um cliente que começou casado com uma mulher e terminou a obra com outra, e eu fiquei amigo das duas. Aliás, fico amigo de todo mundo, levo os clientes para conhecer a casa dos outros… A Bethy (Lagardère), eu e Carlos viajamos para a Grécia, ela estava em Paris e chamou a gente. Mudei a passagem para visitá-la. Quando chegamos à França, ela já tinha alugado uma casa para nos receber em Mykonos. Resultado: ficamos no apartamento dela em Paris, e ela pegou uma pneumonia com a ventania da Grécia. Claro, nos desencontramos.
Não podemos deixar de comentar sobre a militância do casal Piva-Tufvesson. Acredita que o País encaretou?
O problema é que a Internet é um espelho da alma, mas também uma janela para o mundo. As pessoas acham que podem falar o que quiser, pois estão sozinhas no quarto, mas estão colocando a bunda na janela! A Internet consegue ser, ao mesmo tempo, um fator de união global da pior voz das pessoas. Sou um desencantado das redes sociais. O mundo encaretou, o politicamente correto está se transformando em censura. Não existe mais dialogo, só imposições. E o resultado é este: mais violência, mais impunidade, e um prefeito evangélico! Nada contra, se mantiver suas crenças na sua igreja e não regulasse a cidade pelas suas convicções. Se ao menos trabalhasse… Mas é bastante incompetente.