Quando, em 2005, comecei a sonhar com a possibilidade de o Rio de Janeiro ter um aquário de nível internacional, de grandes dimensões, como há muito merecia, inevitavelmente eu me questionava se não seria muita loucura da minha parte, muita pretensão para um biólogo marinho sem acesso aos recursos necessários.
Claro que eu sabia que não seria nada fácil realizar esse sonho. Sonhos não saem do papel sem grande esforço e muita determinação. Confesso, porém, que eu jamais imaginei que seriam 11 anos de muita luta e incansável trabalho, sem nunca desistir diante dos obstáculos, resistências, incertezas, idas e vindas. E as chances para concretizar esse sonho sempre estiveram todas contra mim.
Venho de uma família de classe média da Zona Sul carioca, que, como tantas outras, somente atinge suas aspirações com muito estudo, trabalho e suor. Se consegui realizar o sonho de construir o maior aquário marinho da América do Sul é porque tive preciosos estímulos.
Nas décadas de 1960 e 70, programas de TV, como o “Mundo Animal” e as “Aventuras de Flipper” povoaram a mente e conectaram gerações de crianças e adolescentes com a natureza selvagem. Muitas foram motivadas a sonhar com um futuro trabalho com animais. Eu fui uma delas. Nasci e fui criado em Copacabana. Peguei muito jacaré com prancha de isopor naquelas ondas. Desde garoto, meu pai me levava para pescar nos fins de semana, na Urca, no Recreio e no píer de Ipanema.
Como eu, muitos jovens tiveram, nessas atividades, as primeiras experiências com o ambiente marinho. Mas foi aos 11 anos de idade que me iniciei no verdadeiro universo dos peixes, através da pesca submarina. É curioso lembrar que, nessa época, o conhecimento prático dos pescadores submarinos mais experientes, no reconhecimento dos peixes, já me impressionava e instigava minha curiosidade. Será que um dia eu também conseguiria identificar de “bate-pronto” os badejos, garoupas, sargos e xereletes que passassem na minha frente?
Apesar desse retrospecto, se alguém perguntar qual foi o “click” que me despertou o interesse pela biologia marinha, respondo, sem titubear, que foi o filme “007 — O espião que me amava” (1977), mais especificamente, Bond, James Bond. Disfarçado de biólogo marinho, o charmoso detetive secreto confronta o vilão do filme em seu laboratório submarino no Indo-Pacífico. Na tentativa de desmascará-lo, o vilão testa seus conhecimentos, perguntando o nome de alguns peixes multicoloridos que passam pelo grande visor. E não é que James Bond responde e acerta todos, na lata? E com o nome científico? Fiquei absolutamente fascinado.
Naquela época, já reconhecia bem os peixes por seus nomes vulgares, porém aquela conciliação da prática com a ciência me captou aos 16 anos de idade. Fui “abduzido”. Era aquilo que eu queria fazer: olhar um peixe e saber reconhecê-lo por seu nome científico. Não foi por outra razão que, depois de formado em Biologia Marinha pela UFRJ, escrevi e publiquei cinco livros de identificação de peixes, tubarões e outros seres marinhos.
Sempre disse às minhas duas filhas, Eduarda e Gabriela, quando o tema é a escolha da carreira profissional para seguir na vida, que o importante é fazer algo com paixão, algo. que realmente lhes dê prazer, que as faça acordar na segunda-feira loucas pra trabalhar e dar mais um passo rumo à busca por realizações.
Imbuído dessa essência, costumo dar um (bom) conselho aos jovens com os quais tenho contato nas muitas palestras que ministro: encontrem um nicho a ser explorado e façam dele seu foco profissional, sua paixão. A partir daí, o que vai fazer toda a diferença para atingir os resultados de suas aspirações é o grau de investimento em esforço e dedicação, sem nunca desistir diante das dificuldades, que, sem dúvida, serão muitas. O sucesso profissional e financeiro será consequência dessa persistência e de um trabalho bem feito que pode levar muitos anos, sem garantias.
Em novembro de 2016, presenteamos o Rio e os cariocas com um mega-aquário de nível internacional, 100% privado, focado em Educação, Pesquisa e Conservação que em nada deve aos melhores aquários americanos e europeus e que logo se tornou uma das mais comentadas e visitadas atrações turísticas do Rio: 2.500.000 de visitantes encantados com a vida marinha em dois anos de operação.
Seguramente, o AquaRio possui a extraordinária capacidade de reproduzir ecossistemas marinhos para que os visitantes possam se encantar, conhecer, desmitificar, respeitar, se envolver e querer preservar seus seres. Um provérbio chinês resume muito bem esse sentimento: “Diga-me, e eu esquecerei. Mostre-me, e talvez eu me lembre. Envolva-me, e eu entenderei”.
Tudo isso, somado, carrega um componente excepcional e intangível do qual muito me orgulho como idealizador do AquaRio: o poder da transformação, o poder da descoberta, do click. No momento da visita ao AquaRio, no ambiente mágico de encantamento dos grandes aquários, a vocação dos jovens para a ciência poderá ser despertada com um novo “click”. Nesse instante, algumas crianças e adolescentes serão captados para a biologia marinha, como eu fui. E o ciclo se renovará e continuará pelas próximas gerações.
Essas e muitas outras histórias, que narram a minha trajetória de luta e persistência para viabilizar e concretizar a construção do AquaRio, estão no livro “AquaRio — A história de superação para realizar um sonho”, que terá lançamento e noite de autógrafos no dia 31 de agosto, a partir das 18h, no lobby do AquaRio.
Foto: Stefano Martini
Marcelo Szpilman é biólogo marinho, diretor do AquaRio, integrante do Conselho da Cidade do Rio para o Meio Ambiente e Sustentabilidade, colunista do site Green Nation e tantos outros títulos. Ou seja, é o nome quando o assunto é o mar e seus mistérios, um apaixonado pelos oceanos. É escritor também – seus livros estão disponíveis na Biblioteca do Congresso dos EUA e são usados como referência para as traduções dos programas do “Discovery Channel” e “Animal Planet”.