Moro em Paris desde 2007, quando vim para um estágio em uma revista de moda. Acabei ficando, me apaixonando e construindo minha vida nesta cidade onde também me formei em Fashion Business pelo Istituto Marangoni. Hoje tenho duas filhas franco-brasileiras (Gala, de 13 anos, e Rubi, de 8, do relacionamento com o diretor de cinema francês Phillippe Chalen).
Trabalho como relações-públicas e na organização de experiências de moda e luxo na cidade. Aqui, eu estudo muito, sendo bombardeada diariamente por moda e cultura, informações que eu compartilho e uso como material para os meus cursos de moda e cool hunting (profissionais que fazem observações e previsões com base em mudanças de modismos e tendências culturais) na agência de consultoria Made in Future.
Amar Paris tem a ver com amar o Rio de Janeiro — aquele amor bandido, sempre acompanhado de polêmicas, estar o tempo todo nas mídias, por uma greve, um protesto, um escândalo. Parece que está tudo acontecendo aqui. E está mesmo. Entre uma cidade que vive do seu glamour, da moda, do savoir faire, de uma certa excelência do bom gosto.
Demorei um tempo para conhecer e entender os parisienses, as nuances da comunicação e aquele não dito que você só percebe quando fala a língua e convive muito com os locais. Imigrar tem disto: você tem que se deixar levar e absorver pela cultura local. Paris é uma cidade multicultural e inclusiva; acho bacana a forma como eles contaram a História da França nesses Jogos Olímpicos
Agora, durante os Jogos Olímpicos, a vida ficou complicada para quem mora em Paris — tem controle policial em todas as entradas de metrô, várias barricadas em lugares turísticos e espaços urbanos fechados, como a Ponte Alexandre III, que atravessa o rio Sena, conectando o 7º e o 8º arrondissement e ligando os arredores do Pequeno Palácio (Petit Palais) e do Grande Palácio (Grand Palais), a Praça da Concórdia e tantos outros. Existem dois tipos de clima, uma felicidade geral das torcidas empolgadas e o medo de terrorismo – até com a pane no cabeamento dos trens, afetando o acesso, especialmente nas linhas de metrô que conectam Paris ao leste e norte do país. Mas são mais ou menos 50 mil agentes de segurança, incluindo soldados do exército. Uma loucura!
Inicialmente, os parisienses não receberam muito bem os jogos porque ninguém aguenta tanto turista; vários aproveitaram para tirar férias nesta época e deixaram a cidade com medo do caos que se esperava, mas só tem gente bacana e está um ambiente bom. É uma Olimpíada elitista, com ingressos a 300/400 euros, tapete vermelho, gente famosa circulando, tudo muito bonito, toda a parte externa e também dentro de monumentos históricos. É uma Olimpíada que vai render para cartão-postal.
Pela primeira vez na vida, estou numa cidade em que acontecem os Jogos Olímpicos. É uma situação emocionante, mesmo para quem não acompanha tanto esporte como eu. Sou mais da moda. Na cerimônia de abertura, teve muito do que é o espírito francês: igualdade, fraternidade e liberdade.
Todo mundo falou mal do uniforme dos atletas brasileiros, mas o barco passou muito bem na entrada e não ficou pobre em relação aos outros países, porque, no geral, eram uniformes simples, com exceção da Mongólia. E foi uma loucura porque não dava pra ver tudo com as coisas acontecendo em vários pedaços do Sena. Quem ficou na chuva viu pouco, foi melhor pra quem viu na TV ou nos telões. E teve desfile de moda porque a França é um país que sempre está ligado à moda; ao mesmo tempo, eles trouxeram um clima “Drag Race” (reality liderado pela drag queen RuPaul). A abertura foi, de certa maneira, um tapa na cara da sociedade, para mostrar que aqui é um lugar de diversidade, que aceita os imigrantes, mas também para limpar a sombra da extrema-direita que não ganhou, mas a cada eleição eles se aproximam mais.
Dez estátuas douradas de mulheres surgiram do Sena, uma instalação simbólica para corrigir a disparidade histórica entre estátuas de homens e mulheres na cidade, com figuras de mulheres notáveis que, em diferentes áreas da cultura francesa, como Simone Veil, figura central na legalização do aborto; Simone de Beauvoir, ícone do feminismo; Alice Guy, a primeira mulher a dirigir um filme e pioneira na indústria cinematográfica; Paulette Nardal, nome forte do movimento feminista e na promoção da literatura negra e assim vai.
Mas Paris é Paris, e sempre faz tudo virar muito glamuroso: as festas e eventos, celebridades, parecendo uma nova semana de moda. E marcas de luxo, em que a França é líder, muito envolvida em patrocínios.
A ideia de fazer a maioria das provas ao ar livre, conectando o esporte com os monumentos históricos e emblemáticos, vai realçar ainda mais a beleza desta cidade que, apesar de caótica, é e será sempre apaixonante. Eu, especialmente, adorei terem incluído o breakdancing como esporte e darem muito mais espaço para as provas femininas – essa é a mais igualitária da história. Acho que o governo francês fez um ótimo trabalho. Para os moradores que ficaram na cidade, o cotidiano ficou bem mais complicado, mas vai ser lindo. Estou superanimada e feliz de estar aqui.
Paula Rita Saady é carioca, formada em Fashion Business pelo Istituto Marangoni, criadora do blog Paris Me Chama (@parismechama), em que mostra o seu ponto de vista sobre a moda e cultura, além do estúdio cultural Made in Future (@madeinfuturebr), e do Paris Fashion Experience (@parisfashionexperience), em que oferece experiências de moda na cidade, com a próxima data em 24 de setembro.