O que significa produzir uma peça? Levantar dinheiro ou, como no meu caso em “A menina escorrendo dos olhos da mãe”, investir seu próprio dinheiro? Isso é o básico. O que leva uma atriz a isso? A possibilidade de escolher. Eu sempre tive muita sorte como atriz convidada, currículo recheado de bons diretores, bons textos, boas personagens. Mas dessa vez eu quis imprimir meu jeito, meu jeito low profile, meu (modéstia passou longe aqui) bom gosto, minhas escolhas.
O texto da Daniela Pereira de Carvalho merecia o melhor, o meu melhor. Escolhi junto com ela os profissionais mais afinados com o projeto — todos toparam. Todos são, de uma certa forma, coprodutores, porque se empenharam e porque aceitaram receber abaixo da média. Meu diretor de produção facilita a minha vida. Sem o Celso Lemos, nada disso seria possível. Mas vamos lá: produzir é escolher a cara do espetáculo, a marca dele, se preocupar com o lanche, fazer escolhas egoístas, como não comprar banana (que eu odeio até o cheiro) e outras generosas, como aumentar alguns cachês previstos, se preocupar com a saúde dos colegas, decidir horários e até mesmo o valor do ingresso. Não é pouca coisa, não. Eu agradeço aos meus parceiros por isso e aos meus incentivadores.
Ouvi tanto “você tem que se produzir” de grandes atores e produtores… Marieta Severo, Renata Sorrah, Marco Nanini, Dira Paes, Ana Beatriz Nogueira, Bianca Byington… Termino com um agradecimento especial a quem produziu peças e filmes e séries em que trabalhei. Realmente não é mole, e nosso trabalho é invisível. Mas eu produzi essa peça para mim. No fundo é isso.
O meu amor pelo teatro começou em 1986, quando quatro meninas de 17 anos decidiram atuar e produzir uma peça. A peça se chamava justamente “Quatro meninas”, eu era uma delas e foi um tremendo sucesso. Quase 40 anos depois, a Dani (Pereira de Carvalho) me entrega uma peça de tanto valor… Era a hora. Segui o conselho de alguns amigos (eles sabem quem são) e, inspirada nessa gente, minha gente, decidi produzir essa peça que fala de ruptura, silêncio, ausência, buracos. A mim e à Dani se juntaram as pessoas mais incrivelmente criativas, potentes, amorosas, num encontro muito feliz. Deram corpo às personagens. Antonia. Helena. Duas filhas, duas mães. Dedico esse trabalho à minha mãe (Marieta Severo) e à minha filha (Irene Díaz).
Fotos: Nil Caniné
Silvia Buarque é atriz, convive com a arte desde o útero materno: é filha da também atriz Marieta Severo com o compositor Chico Buarque. A estreia de “A menina escorrendo dos olhos da mãe” é nesta sexta (06/01), no Teatro Poeirinha (Rua São João Batista, 104), em Botafogo. Quinta a sábado, às 20h, e domingo, às 19h.