Andar pelas ruas cariocas, com medo de tudo e de todos, parece já ter virado rotina. Eis que você pode ouvir uma doce voz por aí: “Quantos abraços você recebeu hoje?” Essa é a clássica pergunta que os atores da companhia “Eu Amo Teatro” fazem diariamente nas performances urbanas. Desenvolvido por mim com Allan Marinho – meu parceiro na vida e na arte —, esse projeto é para desarmar o medo hoje instaurado nos corações de uma geração que precisou combater a doença na pandemia e depois deslocou essa prevenção do contato físico também para o contato emocional.
Na era do individualismo, do amor líquido e do materialismo, só mesmo a arte para quebrar os paradigmas, unindo os corações através do afeto, ao distribuir abraços grátis pela cidade. Região dos Lagos, Centro, Zona Norte, Zona Oeste, Zona Sul. Além de oferecer um abraço, os artistas estimulam o protagonismo cívico e buscam extrair algum momento de expressão artística de cada um que é envolvido nessa atmosfera.
Cuidado! Quando estiver caminhando, olhe para os dois lados! Você pode ser surpreendido ao sair do trabalho, ir buscar seu filho no colégio ou mesmo numa ida descompromissada ao supermercado: eles estão por toda a parte; o próximo abraço pode ser seu! A premissa básica do nosso projeto é combater a violência que muitas vezes ofusca os encantos da Cidade Maravilhosa. Numa década de muita polêmica sobre o armamento da população brasileira, busco distribuir munições de arte e afeto a todos que cruzam meu caminho. Aliás, nesse quesito de reformular o sentido das coisas, há quem diga que me tornei perita: amante inveterada da poesia e das paisagens do Rio, produzo vídeos com letras de grandes sucessos da música popular brasileira, unindo essas duas paixões. Os hits tão conhecidos tomam corpo de cena, desvelando outros ritmos e sentidos além daqueles já contidos no nosso imaginário.
Para realizar esse trabalho, já roubei canções — no mais sublime sentido — de Marina Lima, Djavan, Zeca Baleiro, Cazuza, Clara Nunes, Herbert Vianna, Gonzaguinha, Alceu Valença, Tiago Iorc, entre outros. Nessa vertente, podemos nos remeter mais ao arroubo do que ao roubo propriamente dito — todos os amantes das palavras vão compreender bem esse detalhe de denominação. O acervo dos videopoemas é extenso; só no Instagram, são mais de 30, além do YouTube e outros inéditos. Recentemente, fiz uma interpretação da canção “Virgem” — de Marina Lima e Antônio Cícero — alcançando muitas visualizações nas redes sociais, através da poesia contida dentro da musicalidade da composição. “As luzes brilham no Vidigal”, “Os inocentes do Leblon”, “Acima do medo, somente o amor”.
Nas areias da praia de Ipanema, algumas pessoas pegam sol, uns jogam futevôlei, outros mergulham, e há quem espere um bom momento sem nenhum trombadinha passando para gravar um videopoema sem correr o risco de perder o celular. Esta sou eu: uma típica carioca com ascendência alemã, cujo maior objetivo de vida é mergulhar no mar todos os dias que puder e colecionar o maior número de aplausos ao pôr do sol na Pedra do Arpoador. Sou carioca da gema e atriz desde que “me entendo por gente”. Fiquei conhecida do público ao interpretar Xuxa na infância no clássico campeão de bilheteria do cinema “Lua De Cristal”. Em seguida, tive a boa sorte de atuar em novelas de grande repercussão da Rede Globo, como “Laços de Família” e “O Clone”.
Apaixonadíssima por esse ofício, gosto de pensar sempre no que está oculto no texto, o significado mais profundo contido naquelas determinadas palavras que o autor (ou o compositor) elencou para estarem ali. Assim surgiu a ideia de realizar os videopoemas, para ampliar nossas percepções e refrescar nosso olhar sobre terrenos já percorridos. Como já dizia o grande filósofo Heráclito, “nenhum homem pode banhar-se duas vezes no mesmo rio, pois, na segunda vez, o rio já não é o mesmo, tampouco o homem!”
Adressa Koetz é atriz e diretora, formada em Artes Cênicas pela UNIRIO, professora de teatro e autora de peças, crônicas e poesias.