Foi na convivência com minha mãe que me dei conta de que nunca iria entender as mulheres.
Meu pai fazia o possível para agradá-la — sempre em vão.
Uma situação clássica acontecia, ano após ano, no Dia das Mães.
Ele aparecia na cozinha com um sorrisão largo e algum embrulho enorme. Ela se mantinha focada na pia cheia de louça, no frango no forno, nas claras batidas em neve com dois garfos entrelaçados.
— Para você, Maricota!
Acho que minha mãe não gostava de apelidos carinhosos, como Maricota. Limpava as mãos no pano de prato e recebia o pacote, a contragosto.
— E o meu abraço, Maricota?
Maricota — quer dizer, minha mãe — o abraçava sem jeito, talvez para não sujar a impecável camisa do meu pai (passada e engomada por ela) com respingos de gordura, flocos de clara em neve, ou espuma de detergente.
Eu aguardava o momento, expectante. O que haveria no imenso pacote? Para criança, tamanho é documento, e todo presente grande é um presentaço.
Minha mãe desembrulhava com cuidado, agradecia sem gratidão alguma e colocava em cima da bancada o lindo conjunto de baldes de plástico, um de cada cor.
Era triste ver a frustração no olhar do meu pai. Três baldes, tinindo de novos — um grande, azul, para lavar roupa; um médio, vermelho, para lavar banheiro; um pequeno, verde, para, sei lá, limpar vidraça, jogar água nas plantas. Que mãe não consegue não se derreter por um presente desses no seu dia?
Minha mãe não se derretia. Como não se derretera no ano anterior ao ganhar uma moderníssima panela de pressão. Ou não se derreteria, no ano seguinte, com um cobertor de poliéster — ou uma toalha de mesa, um conjunto de rodo / vassoura / pá de recolher lixo. Não se derreteu nem mesmo quando ganhou o sonho de consumo de toda mulher: uma máquina de lavar. Podia não ser nenhuma Brastemp, mas minha mãe não precisaria mais esfregar, no tanque, à mão, toda a roupa de sete pessoas. Como não ficava eternamente agradecida?
Eu sofria com o previsível olhar de decepção do meu pai, mais que com o de inexplicável desalento da minha mãe.
Era assim não só no Dia das Mães, mas também no Natal e no aniversário. Um jogo de latas para mantimentos (ainda existem latas para mantimentos? Ou desapareceram junto com a palavra “mantimentos”?). E minha mãe sem um pingo de emoção naqueles belos (e insensíveis) olhos verdes. Uma toalha de banho, uma de rosto, uma de piso, um forrinho para a tampa do vaso — e nenhum sorriso naqueles lábios que só vez por outra ganhavam o brilho de um batom. Cortinas novas de plástico para o banheiro, com peixinhos e borbulhas — recebidas por mãos frias, um pouco maltratadas pelo sabão, pelo desinfetante, pela água sanitária.
Minha mãe não demonstrou júbilo quando, num segundo domingo de maio, ganhou uma batedeira — e nunca mais precisou juntar dois garfos para bater claras em neve, até lhe doerem os braços. Tampouco quando recebeu o jogo de malas — que incluía o suprassumo da sofisticação, que era uma frasqueira (ainda existem frasqueiras? Eram umas malinhas atrofiadas, onde minha mãe levava talco, escova de cabelo, remédios. Pelo nome, suponho que se destinasse também a frascos — mas quais? Minha mãe tinha apenas um, de “Maderas de Oriente”, certamente comprado por ela mesma).
“O que quer uma mulher?”, se perguntava (retoricamente) Sigmund Freud. Meu pai tentou, a vida inteira, responder. Deu baldes, vassouras, roupa de cama e de banho, latas para feijão, arroz, farinha. Debalde. Deu máquina de lavar, máquina de bater claras em neve; deu até ferro de passar, com seletor para algodão e tecidos sintéticos! Deu enceradeira e liquidificador (nunca mais escovão, nunca mais alho socado no pilão!). Deu fogão elétrico, deu geladeira, deu mala, deu frasqueira.
Tudo para ela, a rainha do lar.
Neste Dia das Mães — o primeiro Dia das Mães sem ela, o oitavo sem ele —, o presente talvez pudesse ser, finalmente, pequeno. Um pacotinho de nada.
Meu pai a encontraria, não na cozinha, mas na sala. Ela abriria, sem rasgar o papel, como sempre fazia. Dentro, junto com um bilhete (“Para você, Potó”), finalmente, um frasco de “Maderas de Oriente”.