Um problema tem me tirado o sono: a insônia.
A coisa vem de longe, desde muito antes de eu morar na região mais barulhenta da Via Láctea, que é a Barra da Tijuca.
Quando criança, o terror noturno não era provocado por nenhum bicho papão embaixo da cama, mas pelo silêncio que se instalava na casa quando todos adormeciam e eu permanecia de olhos arregalados, inventando fantasmas nas sombras, perscrutando passos no assoalho que rangia.
Pré-adolescente, vinha junto com a música de abertura da novela das 10 — e depois a do encerramento, anunciando a chegada daquela noite de mil horas, que é a que se passa sem dormir.
A noite em claro, os pesadelos, os microdespertares, a sensação de acordar moído, sempre fez parte da minha rotina. Mas como não há nada que não possa piorar, piorou depois da Covid.
Já fiz todos os exames, tomei todas as medicações — e nada.
Aí caí na asneira de postar, no FB, um pedido de indicação de clínica ou profissional de ioga, porque já estou partindo para soluções místicas, esotéricas, alternativas. Quem sabe um relaxamento suave, sem química (que não a secretada pelo próprio organismo) pudesse ajudar.
Para quê…
Você já pediu ajuda na internet? É mais ou menos assim:
Pedido: Preciso da indicação de um estofador no Rio de Janeiro.
Respostas:
— “Se o sofá está desconfortável, o problema pode ser a sua coluna. Procure um ortopedista.”
— “Será que sua televisão não é muito pequena ou está muito longe do sofá? Isso faz com que você fique numa posição para frente, o que estraga a espuma. Tente uma TV de 87”. Tenho uma e nunca precisei trocar o estofamento.”
— “Você deve ser desses que colocam o pé em cima do sofá, e aí não tem estofador que dê jeito. Nojo de cheiro de chulé. Um pouco de higiene vai bem, more. De que adianta criticar o português dos outros e ser uma pessoa sem modos? “
— “Tenho um ótimo, o Zeca, em Macapá. Preço muito bom. Pode falar que fui eu que indiquei. Só não sei se ele faz estofamento, mas conserta móvel sim.”
Pois eu pedi ajuda para encontrar um profissional de ioga. E a ajuda veio.
Me indicaram uma novena, uma simpatia, uma droga ilícita. Parar de trabalhar, fazer sexo disruptivo. Me informaram que insônia é falta de Deus. Que o que eu preciso é mudar de casa, de vida, de profissão, de dieta. Fazer um ritual de desobsessão. E, lógico, aproveitar as noites em claro para ler a pilha de livros que se acumula na cabeceira, maratonar séries, organizar o armário, botar o trabalho em dia.
Só os não insones, os que não sabem o pesadelo que é a insônia, hão de ver vantagens nessas horas adicionais de vigília.
São horas mortas, inúteis, inservíveis. Horas de pensamentos invasivos, de angústias regurgitadas, de não haver posição para o corpo na cama, para a mente no corpo, para a paz na mente. E há o dia seguinte… Ah, o dia seguinte, em que a insônia mostra seu avesso: depois da noite não-dormida, o dia não-acordado, dias e noites zumbis.
Vou tentar acupuntura, shiatsu, johrei, descarrego, chamego, travesseiro da Nasa, absinto. Só não vou mais é pedir ajuda em rede social. Porque aí é que perco o sono de vez.